No século IX, emissários do Príncipe Vladimir da Rus foram ver qual era a verdadeira fé. Quando entraram na Igreja de Hagia Sophia, não sabiam se estavam no céu ou na terra, pois na terra não há tal esplendor; disseram ainda que a sua cerimônia era mais bela. Deus vivia ali. A religião escolhida pelo Príncipe Vladimir foi justamente aquela que era celebrada na Igreja Hagia Sophia, a cristã ortodoxa.
SONHO DOS RELIGIOSOS RUSSOS: VER CONSTANTINOPLA CAPITAL DA RÚSSIA:
Religiosos russos sonhavam com a conquista de Constantinopla, que iria se tornar a capital da Rússia - TSARGRAD. Seria a capital de um império ortodoxo que iria se estender da Sibéria à Terra Santa.
CERNE DA GUERRA DA CRIMEIA:
Proteger os cristãos ortodoxos e fazer de Constantinopla capital russa e caminho para Jerusalém.
IMPÉRIO OTOMANO:
No início do século XIX, havia 35 milhões de habitantes: 60% de muçulmanos e 10 milhões de turcos. Nos territórios europeus do Império Otomano havia uma maioria de cristãos ortodoxos.O Império Otomano era multinacional, com presença nos Balcãs (Europa), África, Aden e Golfo Pérsico. As origens do Império Otomano estão na Dinastia de Osman, no século XIV e ele extraía a sua legitimidade na expansão do islã.
TRATAMENTO DADO AOS CRISTÃOS ORTODOXOS PELO IMPÉRIO OTOMANO:
"Cobravam impostos extras dos não muçulmanos, os desprezavam como animais inferiores (rayah) e os tratavam desigualmente de muitas formas humilhantes (em Damasco, por exemplo, os cristãos eram proibidos de montar em animais de qualquer tipo). Mas permitiam que mantivessem sua religião, em geral não os perseguiam nem tentavam convertê-los, e por intermédio do sistema de segregação religiosa conhecido como MILLET, que dava poder aos líderes da Igreja em suas 'nações' ou millets distintas baseadas na fé, até mesmo permitiam aos não muçulmanos algum grau de autonomia."
(página 52)
"O sistema de millet havia sido desenvolvido como um meio de a dinastia Osman usar as elites religiosas como intermediárias nos territórios recém-conquistados. Desde que se submetessem à autoridade otomana, líderes eclesiásticos podiam exercer um controle limitado de educação, ordem pública e justiça, recolhimento de impostos, caridade e questões da Igreja, condicionados à aprovação dos funcionários muçulmanos do sultão (mesmo para questões, como, por exemplo, o conserto de um teto de igreja). Nesse sentido, o sistema de millet servia não apenas para reforçar a hierarquia étnica e religiosa de império otomano - com muçulmanos no alto e todas as outras millets (ortodoxos, gregorianos, armênios, católicos e judeus) abaixo - que estimulava o preconceito muçulmano contra cristãos e judeus; também estimulava essas minorias a expressar suas queixas e a organizar sua luta contra o governo muçulmano por intermédio de suas Igrejas nacionais, o que era uma grande fonte de instabilidade no império."
(páginas 52/53)
A maior Millet era a dos cristãos ortodoxos, com 10 milhões de membros. O Patriarca de Constantinopla era a maior autoridade desse Millet, falando pelos outros patriarcas localizados em Antioquia, Jerusalém e Alexandria.
"Em um grande leque de questões seculares ele (Patriarca de Constantinopla) era o verdadeiro governante dos 'gregos' (significando todos aqueles que seguiam o rito ortodoxo, incluindo eslavos, albaneses, moldavos e valáquios), e representava seus interesses contra muçulmanos e católicos."
(página 53)
O Patriarcado de Constantinopla era controlado por famílias de mercadores gregos. Eram os fanariotas. Os fanariotas se viam como herdeiros do Império Bizantino e sonhavam recriá-lo com ajuda russa , todavia eram hostis à influência da Igreja Russa.
Esse domínio grego nas questões ortodoxas era inaceitável para muitos eslavos que procuravam cada vez mais suas igrejas nacionais. O nacionalismo era uma força poderosa entre os cristãos dos balcãs (sérvios, montenegrinos, búlgaros, moldavos, valáquios, gregos), que se uniram com base na religião, cultura e língua comuns contra o domínio Otomano.
A primeira conquista nesse sentido surgiu com a Sérvia, que conseguiu fazer com que os Otomanos aceitaram um Principado da Sérvia, sob o comando da dinastia Obrenovic (1804-1817)
FRAQUEZA DO IMPÉRIO OTOMANO:
"A Turquia não se sustenta, está se desfazendo.", disse um príncipe Sérvio ao cônsul britânico
(página 54)
O domínio do clero muçulmano (mufti, ulema) era um obstáculo à modernização do país.
" 'Não mexa nas coisas estabelecidas, não pegue nada emprestado dos infiéis, pois a lei proíbe', era o lema da Instituição Muçulmana, que garantia que as leis do Sultão se adequassem ao Corão."
(página 54)
A tecnologia do Ocidente não entrava no Império. O comércio era feito por cristãos e judeus.
"A estagnação da economia andava de mãos juntas com a proliferação de uma burocracia corrupta."
(página 54)
O Estado Otomano vendia cargos que davam ao seu comprador o direito de cobrar impostos. Paxás e Governantes Militares governavam regiões que lhe eram atribuídas como se fossem seus feudos pessoais, arrecadando para si a maior quantidade possível de impostos.
"Desde que repassassem uma parcela do faturamento à Porta (ao Sultão) e remunerassem seus próprios financiadores, ninguém questionava ou se importava muito com a violência arbitrária que empregavam."
(página 54)
A maior parte dos impostos recaíam sobre os cristãos, que não tinham para quem recorrer.
O poder militar do Império Otomano também estava enfraquecido. Ele era tecnicamente inferior aos exércitos da Europa Ocidental.
1821, LEVANTE GREGO:
O levante grego começou de verdade na Rússia. Havia um lobby a favor da independência grega na capital russa. O levante foi liderado por Alexander Ypsilantis, oficial da cavalaria russa e era filho de um fanariota da Moldávia. Ele esperava que, conseguindo criar um levante na Moldávia e na Valáquia, iria obter o apoio automático da Rússia. Mas ele estava errado. O levante aconteceu mas não contou com o apoio russo, que estava preso pelos termos acordados na Santa Aliança, que impedia movimentos revolucionários na Europa. Ypsilantis refugia-se na Áustria. Otomanos agem com extrema severidade. Patriarca de Constantinopla é enforcado. Há represálias às populações cristãs da Moldávia e da Valáquia.
De qualquer forma, o plano de Ypsilantes funcionou, pois os gregos se levantaram no Peloponeso.
Os russos, como protetores dos cristãos ortodoxos, em razão do acordo de paz de Kuchok Kainarji, pediram moderação aos Otomanos, que não ouviram, e seguiram na repressão à rebelião. O tratado de Kuchok Kainarji estabelecia que os russos tinham o direito de intervir em assuntos relacionados aos cristãos ortodoxos que residiam no Império Otomano.
MASSACRE NA ILHA DE QUIOS - 1822. INTERVENÇÃO MILITAR RUSSA POR MOTIVO RELIGIOSO, PARA DRIBLAR AS REGRAS DA SANTA ALIANÇA:
Cristãos são massacrados pelos Otomanos. Vinte mil ilhéus enforcados e quase setenta mil deportados como escravos. O massacre vira tema até de um quadro, 'O Massacre de Quios', pintado pelo francês Eugène Delacroix. Essa sequência de violências dos Otomanos contra os cristãos ortodoxos forçava a Rússia a intervir, pois era uma questão religiosa que deveria estar acima de questões sobre a soberania otomana.
"No Ministério de Relações Exteriores da Rússia, Kapodistrias e Sturdza defenderam a intervenção militar por justificativa religiosa. Em um ensaio dos argumentos que seriam usados em 1853 para a invasão dos principados (Moldávia e Valáquia) pela Rússia, eles justificaram que a defesa dos cristãos contra a violência muçulmana deveria superar qualquer consideração sobre a soberania do Império otomano. Apoiar revoltas, digamos, em Espanha ou Áustria, sustentaram, seria trair os princípios da Sacra Aliança, pois esses dois países eram governados por legítimos soberanos cristãos, mas nenhum poder muçulmano podia ser reconhecido como legal ou legítimo, de modo que os mesmos princípios não se aplicavam ao levante grego contra os otomanos."
(página 59)
Essa ideia, defender os cristãos contra os muçulmanos, seria também usada em 1853, véspera a Guerra da Crimeia. Mas Alexandre, o Czar da Rússia, estava vinculado demais à Santa Aliança para agir unilateralmente contra o Império Otomano. Assim, nenhuma potência apoiava os gregos. A Áustria temia que o exemplo grego se espalhasse; britânicos temiam que a Rússia, sob o pretexto de ajudar os cristãos ortodoxos, expandisse ainda mais seu poder. Os russos não queriam antagonizar os Austríacos e o czar Alexandre estava preso ao Pacto da Santa Aliança. Se essa revolução estivesse acontecendo num país cristão, com uma tentativa de derrubada de um regime monárquico, daí a intervenção seria aceitável segundo as previsões do pacto da Santa Aliança.
"Alexandre (Czar da Rússia) estava comprometido demais com o Concerto da Europa para considerar seriamente a ideia de uma intervenção russa unilateral para libertar os gregos. Ele defendia com firmeza o Sistema de Congresso criado em Viena, pelo qual as grandes potências haviam concordado em solucionar grandes crises por intermédio de negociação internacional, e tinha noção de que provavelmente haveria oposição a qualquer ação na crise grega."
(páginas 59/60)
NENHUMA POTÊNCIA SOCORRIA A GRÉCIA. MAIS DOIS ACONTECIMENTOS MUDARIAM TUDO:
Em primeiro lugar, em 1825, Sultão Otomano pede que seu vassalo no Egito, Mehmet Ali, esmagasse de vez os gregos. Mehmet Ali o fez com com atrocidade, criando ainda mais uma onda favorável aos gregos.
Em segundo lugar, Alexandre, czar da Rússia, morreu nesse mesmo ano.
"O novo Tsar (Czar) - o homem que mais que qualquer outro foi responsável pela Guerra da Crimeia - tinha 29 anos de idade quando sucedeu seu irmão no trono russo."
(página 60)
"Nicolau I era em todos sentidos um homem militar. Desde jovem ele desenvolvera um interesse obsessivo por assuntos militares"
(página 60)
"Mais que Alexandre, Nicolau colocou a defesa da Ortodoxia no centro da política externa. Durante todo seu reinado, ele foi governado por uma convicção absoluta em sua missão divina de salvar a Europa ortodoxa das heresias ocidentais do liberalismo, do racionalismo e da revolução. Em seus últimos anos esse impulso o levou a sonhos fantásticos de uma guerra religiosa contra os turcos para libertar os cristãos balcânicos e uni-los à Rússia em um Império Ortodoxo cujos centros espirituais seriam Constantinopla e Jerusalém."
(página 61)
MEHMET ALI E O EGITO:
▶1825: Sultão Otomano convoca seu poderoso vassalo egípcio, Mehmet Ali, para esmagar de vez a revolta grega.
▶1827: Batalha de Navarino: A Força Naval conjunta de França, Grã-Bretanha e Rússia esmaga a força naval conjunta de Otomanos e Egípcios.
▶1833: Mehmet Ali volta à carga. Agora ele desafiou o poder do Sultão Otomano. Mehmet Ali queria o título hereditário no Egito e na Síria. Soldados egípcios marcham para Palestina, Sírio e Líbano. Essa expansão egípcia era resultado do renascimento religioso e da necessidade de conseguir mais terras para cultivar e exportar produtos agrícolas.
▶Otomanos pedem ajuda: Com a proximidade das forças Mehmet Ali, os Otomanos pediram ajuda aos ingleses e aos franceses. Sem sucesso. Então os Otomanos pediram ajuda aos russos, que prontamente vieram em seu socorro.
▶Franceses e Ingleses preocupados com a ajuda russa: Ao saberem da intervenção russa, ingleses e franceses mandam navios para a Turquia.
▶1833: Acordo de Paz: Egípcios abandonam a Anatólia, mas ganham a ilha de Creta e o Hijaz. Mehmet não se torna líder hereditário do Egito, mas seu filho torna-se líder hereditário da Síria. Os russos recuaram também, mas antes conseguiram tirar outras vantagens do sultão otomano: os russos protegeriam os otomanos, e em troca os estreitos seriam fechados para os navios de guerra de outros países. Os estreitos eram a chave da Casa da Rússia.
▶1839: Franceses instigaram os egípcios a empreendem um novo ataque ao Império Otomano. Mais uma vez os egípcios estavam a caminho de Constantinopla (Istambul). O sultão otomano Abdulmecid era fraco e não resistiria a essa investida egípcia. Russos e Ingleses vieram a seu auxílio.
▶1840 - Convenção de Londres: Mehmet Ali ganha a sua dinastia hereditária no Egito.
▶França (I): Franceses instigaram Mehmet mas não o ajudaram na guerra, que teve que sair da Síria, acatando a Convenção de Londres. Mehmet teve que aceitar a soberania do Sultão no resto do Império.
▶França (II): A França tinha interesses no Egito. Tinha investido ali. O Egito era um exportador de algodão. A França tinha ajudado a treinar os exércitos de Mehmet Ali. A Grã-Bretanha não via com bons olhos essa aproximação entre o Egito e a França.
IMPÉRIO OTOMANO TERÁ QUE SER DETIDO EM SUA AÇÃO NA GRÉCIA:
Rússia, França e Grã-Bretanha criam uma mediação para resolver a guerra na Grécia. Haveria uma Grécia autônoma sob a soberania otomana. Uma solução que poderia agradar a todos. Mas os Otomanos não queriam conversa. O resultado foi o envio de uma força naval britânica, que na Batalha de Navarino, em outubro de 1827, destruiu as frotas turca e egípcia.
"Enfurecido com esse ato, o sultão recusou qualquer mediação, declarou um jihad e rejeitou o ultimato russo de retirar suas tropas dos principados do Danúbio."
(página 62)
Com a falta de diálogo por parte dos Otomanos, Nicolau I, Tsar da Rússia, resolve agir sozinho em abril de 1828, enviando um exército composto por 65 mil homens, que cruzaram o Danúbio em direção ao coração do Império Otomano nos Balcãs. Os russos, no início, avançaram rápido, mas depois ficaram atolados em Varna, no delta do Danúbio, uma região pestilenta, causando a morte de vários soldados russos, com metade dos soldados russos morrendo entre 1828/29.
"Essas enormes baixas não eram incomuns no exército do Tsar, onde havia pouca preocupação com o bem-estar dos soldados servos."
(página 63)
Na primavera de 1829 os russos retomaram a iniciativa, avançando na direção de Istambul (Constantinopla/Bizâncio). Capturaram pelo caminho as cidades de Edirne (Adrianópolis). O colapso do Império Otomano estava próximo. Mas Nicolau teve que parar a ofensiva. Uma Turquia doente era melhor do que uma Turquia morta. A Rússia poderia promover seus interesses ali, havendo uma Turquia doente. Seguir agora com a guerra poderia trazer contra si uma aliança europeia e o desmantelamento turco ainda poderia trazer outros países, com cada um deles querendo para si um pedaço do Império Otomano. Então era melhor manter o Império Otomano doente do que matá-lo de vez. Assim, as hostilidades foram encerradas com o Tratado de Adrianópolis.
TRATADO DE ADRIANÓPOLIS - SETEMBRO DE 1829. POSIÇÃO DE FORÇA DA RÚSSIA EM RELAÇÃO AO IMPÉRIO OTOMANO. A GRÃ-BRETANHA TERIA QUE AGIR PARA IMPEDIR QUE O IMPÉRIO OTOMANO FOSSE ENGOLIDO DE VEZ PELOS RUSSOS:
Ficou acordado que:
Os principados danubianos, Valáquia e Moldávia, teriam autonomia e ficariam sob a proteção russa. A Rússia obteve ganhos no Cáucaso, com Erivan e no resto da Geórgia. Turcos reconheciam a autonomia grega e abriam os estreitos a todos os navios mercantes. Perto do que a Rússia poderia ter ganho se levasse a guerra até o fim, aquilo que ela recebeu era pouco. Os ocidentais desconfiavam que havia uma cláusula secreta entre a Rússia e o Império Otomano, que abria para aquela a navegação de navios militares pelos estreitos.
"Wellington (que derrotou Napoleão em Waterloo), à época primeiro-ministro, achava que o tratado transformara o Império Otomano em um protetorado russo - um resultado pior que sua divisão (que pelo menos teria sido feita pro um acordo de potências."
(página 64/65)
"Lorde Heytesbury, o embaixador britânico em São Petersburgo, declarou (sem qualquer ironia intencional) que o sultão logo se tornaria tão submisso às ordens do Tsar quanto qualquer dos príncipes da Índia à da Companhia das Índias Orientais. Os britânicos podiam ter suplantado inteiramento o império mongol na Índia, mas estavam determinados a impedir os russos de fazer o mesmo com os otomanos, se apresentando como os defensores honestos do status quo no Oriente Próximo."
(página 65)
"Temendo a percebida ameaça russa, os britânicos começaram a definir uma política para a Questão Oriental. De modo a impedir a Rússia de ter a iniciativa na Grécia, eles deram seu apoio à independência do novo Estado Grego, em oposição à mera autonomia sob soberania turca (que eles temiam a tornaria dependente da Rússia)"
(página 65)
ESTADO GREGO INDEPENDENTE - 1832:
Na Convenção de Londres de 1832 ficou acertado que a Grécia seria um Estado independente. A Grã-Bretanha ainda escolheu um rei para a Grécia: Otão da Baviera.
POLÍTICA DO VIZINHO FRACO:
O vizinho fraco era o Império Otomano. Quem guiava essa política era o vizinho forte, a Rússia. Essa política evitava um conflito com o resto da Europa. E usava a moeda da religião para ameaçar os Otomanos, aumentando assim a influência dos russos nos territórios cristãos do Sultão.
O ÔNUS DE MANTER O SEU VIZINHO FRACO:
A Rússia teria um ônus por manter o Império Otomano fraco. O desafio veio em 1833, quando Mehmet Ali, líder do Egito, desafia o Império Otomano. Todos queriam se aproveitar da fraqueza do Império Otomano, até os muçulmanos do Egito. Mehmet Ali queria os títulos hereditários do Egito e da Síria. O exército egípcio tinha sido treinado pelos franceses. Seu exército era chamado de Jihadistas. Os egípcios queriam mais terra e uma alternativa muçulmana que fizesse frente ao decadente Império Otomano. A economia egípcia passava por um bom momento, exportando algodão cru para as tecelagens da Grã-Bretanha. O exército de Mehmet ali avançou rapidamente, alcançando Palestina, Síria e Líbano. Istambul estava prestes a cair nas mãos dos Egípcios, uma nova força vinda da África que poderia reenergizar o mundo muçulmano, fortalecendo-o sob um novo comando. A Rússia, obviamente, não iria querer um vizinho reenergizado, aliado da França, na sua fronteira sul.
A Rússia é obrigada a agir para deter o avanço dos egípcios. Ao mesmo tempo, França e Grã-Bretanha, preocupados com a Rússia, mandam uma frota naval para Dardanelos. No fim, um acorod foi assinado, colocando fim ao conflito.
Por fim, os Egípcios saem com poucos ganhos (Creta, Hijaz - oeste da península arábica, etc). Os russos ganharam algo especial: se os russos pedissem, os otomanos teriam que fechar os estreitos para os ingleses. Esse pedido fazia parte de uma cláusula secreta.
Posteriormente, ingleses e franceses ficaram sabendo dessa cláusula. Descobertos, os russos deram a desculpa dizendo que essa cláusula era para manter a sua segurança contra um ataque inglês ou francês.
A descoberta dessa cláusula reforçou a desconfiança de França e Grã-Bretanha em relação à Rússia. Crescia um sentimento, principalmente na Grã-Bretanha, de Russofobia.
MAR NEGRO, UM LAGO RUSSO PROTEGIDO PELA TURQUIA:
Na França, quando a cláusula secreta foi revelado, diziam que o Mar Negro tinha se transformado num lado russo protegido pelo Império Otomano.
ERA PRECISO FORTALECER OS OTOMANOS. O VIZINHO FRACO DOS RUSSOS TINHA QUE FICAR FORTE, PARA PODER CONTÊ-LOS:
Depois de 1833, os britânicos passaram a ter um interesse ativo no Império Otomano. Era preciso fortalecê-lo para contrapô-lo aos russos.
MUDANÇA POLÍTICA NA GRÃ-BRETANHA:
Antes, a política externa da Grã-Bretanha agia para manter o status quo no Império Otomano, para evitar que, na esteira da sua desintegração/dissolução, houvesse uma guerra na Europa, rompendo o equilíbrio europeu, do qual a Grã-Bretanha era a fiadora. Depois de 1833, a Grã-Bretanha foi além, tentando ressuscitar o Império Otomano, por temer que ele caísse de vez como um protetorado russo, ou que viesse a cair nas mãos de Mehmet Ali do Egito.
O COMÉRCIO OPUNHA GRÃ-BRETANHA E RÚSSIA. IMPERIALISMO COMERCIAL. BUSCA DA HEGEMONIA COMERCIAL:
O Império Otomano era fonte de matéria-prima para a Grã-Bretanha e era também um mercado consumidor para os produtos britânicos. A Grã-Bretanha era praticante do Imperialismo Comercial, segundo o qual era preciso abrir o comércio global, criando livres mercados, nem que fosse necessário o uso da força militar. Para a Grã-Bretanha, que tinha liderado a Revolução Industrial, o livre mercado era uma vantagem, pois seus produtos eram os mais competitivos. Na esteira dessa política de hegemonia comercial, a Grã-Bretanha conseguiu arrancar um acordo comercial aos Otomanos. Para conseguir esse acordo, a Grã-Bretanha misturava ameaças militares com promessas de ajuda. Esse acordo praticamente inviabilizada a construção de uma indústria no Império Otomano. Enquanto a Grã-Bretanha exportava produtos manufaturados para a Turquia, esta exportava milho para aquela.
Com o passar do tempo, começaram a surgir rivalidades entre comerciantes ingleses e comerciantes russos. Comerciantes britânicos sempre traziam manufaturas e traziam cereais por meio do Rio Danúbio. Ao mesmo tempo, mercadores russos exportavam o cereal produzido na Ucrânia por portos do Mar Negro.
"A partir desse momento, a exportação de bens manufaturados britânicos para a Turquia aumentou enormemente. Em 1850, o aumento já era de onze vezes, fazendo dela um dos mais valiosos mercados de exportação da Grã-Bretanha (superado apenas pelas cidades da Liga Hanseática e pela Holanda). Após a revogação das Leis Protecionistas do Milho, em 1848, as importações britânicas de cereais da Turquia, principalmente de Moldávia e Valáquia , também aumentaram. O advento dos vapores oceânicos, de barcos fluviais a vapor e de ferrovias pela primeira vez transformou o Danúbio, em uma movimentada via comercial. O comércio no rio era dominado por navios mercantes britânicos exportando grãos para a Europa Ocidental e importando manufaturados da Grã-Bretanha. Os britânicos concorriam diretamente com os comerciantes de Odessa, Taganrog e outros portos do Mar Negro, de onde os grãos das regiões produtoras da Rússia em Ucrânia e sul da Rússia eram exportados para o Ocidente. O mercado de exportação de cereais se tornou cada vez mais importante para a Rússia na medida que o valor do comércio de madeira diminuiu na era do vapor. No final do século XIX, os portos do Mar Negro processavam um terço de todas as exportações russas. Os russos tentaram dar a seus mercadores uma vantagem em relação aos concorrentes britânicos pelo controle do delta do Rio Danúbio após 1829, sujeitando barcos estrangeiros a demorados controles de quarentena e até mesmo permitindo o assoreamento do Danúbio para que ele deixasse de ser navegável."
(página 71)
PORTO OTOMANO DE TREBIZONDA:
"No lado leste do Mar Negro, os interesses comerciais da Grã-Bretanha eram cada vez mais ligados ao porto de Trebizonda, no nordeste da Turquia, de onde mercadores gregos e armênios importavam grandes quantidades de bens manufaturados britânicos para venda no interior da Ásia."
(página 71)
Os Russos, desde 1840, tinham uma presença forte no mercado da Ásia, com suas cordas, têxteis, etc, sendo vendidos em lojas em Bagdá, Basra, etc. E os russos poderiam ir além, para a Índia, pois com os navios a vapor e com a ferrovias, poder-se-ia chegar à Índia de várias formas:
-Pelo Mediterrâneo > Cairo > Suez > Mar Vermelho
-Pelo Mar Negro > Trebizonda > Rio Eufrates > Golfo Pérsico
Os britânicos preferiam a rota pelo Rio Eufrates, que passava pelos domínios do Império Otomano. Para os britânicos, era importante fincar a bandeira nessa região, pois eles temiam que a presença da Rússia nessa área (Iraque, depois Irã e Afeganistão) fosse uma espécie de trampolim para alcançar a Índia britânica.
META SUBJACENTE À GUERRA DA CRIMEIA: DETER O AVANÇO RUSSO À ÍNDIA:
"O perigo que a Rússia representava para a Índia era a bête noire dos russófobos britânicos. Para alguns, isso se tornaria a meta subjacente à Guerra da Crimeia: deter uma potência que pretendia não apenas a conquista da Turquia, mas o domínio de toda Ásia Menor até Afeganistão e Índia. Em sua imaginação alarmada, não havia limites aos desígnios da Rússia, o império de maior crescimento do mundo."
(página 72)
"Na verdade nunca houve qualquer perigo real de os russos alcançarem a Índia nos anos anteriores à Guerra da Crimeia. Ela era longe demais, e seria difícil marchar com um exército até lá - embora o Imperador Russo Paulo I tivesse certa vez acalentado um projeto impetuoso de enviar uma força combinada francesa e russa para lá. A ideia havia sido retomada por Napoleão em suas conversas com o Tsar Alexandre, em 1807. 'Quanto mais irreal é a expedição, mais ela pode ser usada para aterrorizar os ingleses', explicou Napoleão. O governo britânico sempre soube que tal expedição não era factível. (...) Mas embora poucos nos círculos oficiais britânicos pensassem que a Rússia era uma verdadeira ameaça à Índia, isso não impediu a imprensa britânica russofóbica de provocar esse medo, enfatizando o perigo potencial representado pela conquista do Cáucaso pela Rússia e suas atividades enganosas na Pérsia e no Afeganistão."
(páginas 72/73)
Os russos, de fato, tentavam ter influência em lugares como a Pérsia. Agentes russos criavam canais de comunicação com o Xá da Pérsia.
"Em 1837, quando os persas tomaram a cidade afegã de Herat, muitos políticos britânicos não tiveram dúvida de que isso era parte da preparação da Rússia para uma invasão na Índia. Um ex-embaixador britânico em Teerã escreveu: Herat nas mãos da Pérsia nunca poderá ser considerada de outra forma que não um point d'appui (ponto de apoio) avançado para os russos rumo à Índia. A imprensa britânica russofóbica criticou a inatividade dos governos britânicos que não haviam percebido as atividades solertes e nefandas dos russos na Pérsia."
(página 73)
DIANTE DA AMEAÇA (REAL OU IMAGINÁRIA) DE UMA INVASÃO RUSSA À ÍNDIA, A GRÃ-BRETANHA COMEÇOU A AGIR:
A Grã-Bretanha tinha que agir, criando zonas de amortecimento. Em 1838, os ingleses ocuparam o Afeganistão. Criaram ali um governo marionete sob o Emir Shah Shuja. Os britânicos ficaram ali para apoiar seus marionete, mas em 1842 foram expulsos após várias rebeliões tribais. Os britânicos também exerceram pressão sobre a Pérsia, que saiu de Herat e assinou um acordo comercial com a Grã-Bretanha em 1841.
Mas foi na Turquia onde os ingleses tentaram criar seu principal amortecedor para conter o avanço russo. A ideia era curar o homem doente (Império Otomano) para acabar com os problemas no oriente. Os ingleses tentaram plantar na Turquia seus princípios liberais, tolerância religiosa e práticas administrativas britânicas.
1839-1861: Sultão Abdulmecid: novo sultão de 16 anos deu início às reformas:
Mas a oposição às reformas eram grandes
1876: Primeiro Parlamento Otomano
"O grande problema desse país é a religião dominante, fonte de injustiça e de fraqueza."
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