PERÍODO:
Séculos VI e XVI
O Rei e seus três momentos de desenvolvimento:
Na época carolíngia, nos séculos IX e X, temos o rei ungido. Entre os séculos XII e XIII, temos um rei administrativo, imerso em três realidades, a Coroa, o território e a lei. Por fim, no final do período, o rei procura absorver o próprio Estado.
ESTRUTURA FUNDAMENTAL DE PODER:
Monarquia inserida numa Cristandade latina medieval, fazendo um contraponto ao Império Romano do Oriente (Império Bizantino), cujo soberano recebia o nome de Basileus, que significa rei e não imperador.
Características do Rei Medieval:
1) Unicidade do poder real:
"Há uma unicidade do poder real no Ocidente Medieval. Os reinos da Idade Média têm à sua frente um rei único e, assim, o único superior. A realeza medieval não se divide, não obstante as esperiências anglo-saxãs de joint-kingship e a partilha do reino merovíngio entre os filhos do rei, cada um criando reinos no interior da ficção de uma monarquia unitária. (página 442, Dicionário Analítico do Ocidente Medieval Jacques Le Goff e Jean Claude Schmitt, volume 2)
FUNDAMENTO IDEOLÓGICO DO REI CRISTÃO:
O rei é a imagem de Deus: rex imago Dei. Para legitimar seu poder, buscará referências nos reis da Bíblia. Carlos Magno, por exemplo, seria uma espécie de Davi.
OBRIGAÇÕES DO REI:
O rei tinha obrigações e limitações. Seu dever funcional o obrigava a ser um defensor da fé e de seu povo. Devia ainda respeito à Igreja, de quem dependia.
HERANÇA GERMÂNICA DO SANGUE:
"A palavra gótica kuni, que significa "raça, família", é aparentada à latina gens e dará às palavras king e Konig. Este e o homem bem nascido, o homem nobre, e o rei medieval recolhe também essa herança germânica do sangue. Ele é definido não somento por uma boa família, mas também em relação à aristocracia e à nobreza. O rei é o rei, de todo o povo, porém permanece sempre especialmente ligado à nobreza e deve respeitar os privilégios dos nobres. A própria realeza afirma-se mais, a partir do século XIV, como uma realeza de sangue, no qual os descendentes diretos dos reis constituem a categoria superior dos príncipes de sangue. Há na aristocracia medieval uma tendência a rebaixar o rei, a reduzi-lo a um PRIMUS INTERPARES (o primeiro entre os iguais). Mas somente o rei tem caráter sagrado." (página 444, Dicionário Analítico do Ocidente Medieval Jacques Le Goff e Jean Claude Schmitt, volume 2)
O REI, O IMPERADOR E O PAPA:
No início, teoricamente o rei estava abaixo do Imperador e do Papa. Com o passar do tempo, a situação foi modificada, em favor do rei. A briga entre os Imperadores do Sacro Império Romano Germânico e os Papas acabou por enfraquecer o poder de ambos. Nesse ínterim, os poderes dos reis da França e da Inglaterra cresciam.
"Para os homens da Idade Média, o modelo encarnado da soberania não é o Imperador (do Sacro Império Romano Germânico), ou o Papa, mas, abstratamente, o rei, e, concretamente, os reis." (página 445, Dicionário Analítico do Ocidente Medieval Jacques Le Goff e Jean Claude Schmitt Volume 2)
Esse poder dos reis consolida-se a partir do século XIII, na França. Assim, o rei da França não conhecia nenhuma poder, no seu reino, que lhe fosse superior. Adotou-se a ideia segundo a qual REX EST IMPERATOR IN REGNO (o rei é o imperador em seu reino).
A LEGITIMIDADE DO REI:
As fontes das quais o rei tirava a sua legitimidade eram variadas. Podia ser uma eleição, como acontecia, por exemplo, com os reis da Polônia e da Alemanha. Quem estava no trono poderia indicar seu sucessor, como Pedro I, o Grande, Imperador da Rússia (1682-1725), fez com a sua esposa, uma mulher de origem humilde, uma lavadeira lituana, com uma vida dissoluta, tendo sido amante de pessoas próximas a Pedro, que foi alçada à posição de Imperatriz com o nome de Catarina I. A legitimidade de um rei ainda podia ser extraída por uma escolha divina, provada por meio de uma vitória militar.
A legitimidade de um rei dependia de fatores simbólicos (ideologia, cerimônias, símbolos) e de fatores de fato, isto é, poder de fato daquele que desejava ser rei.
Quando os carolíngios substituíram os reis merovíngios no século VIII, assim agiram usando a justificativa de que estes eram reis indolentes, que tinham perdido a capacidade para governar. Mas essa justificativa não seria suficiente para legitimar o poder dos Carolíngios. Era necessário uma simbologia, e ela veio com as cerimônias da Igreja Católica. O Papado precisava da proteção dos reis carolíngios e estes precisavam da legitimação que uma unção papal proporcionava. Dessa forma, os reis carolíngios tinham obtido um caráter sagrado. Quando os reis capetíngios sucederam os carolíngios no que hoje é a França, o fizeram com base numa nova realidade de poder. Os carolíngios tinham perdido a força. Quem tinha a força de fato, agora, era a dinastia capetíngia. Mas era necessário passar desse poder de fato para um poder de direito. Isso foi feito quando os capetíngios reivindicaram para si a descendência biológica dos carolíngios, particularmente da linhagem de Carlos Magno. Foi a REDDITUS AD STIRPEM KAROLI (retorno à linhagem de Carlos Magno).
O REI MORREU, VIVA O REI. O REI NÃO MORRE JAMAIS:
O rei está inserido numa linha histórica. Geralmente há uma dinastia, com o rei reverenciando seus antecessores e buscando cuidar de quem irá sucedê-lo, providenciando um casamento que possa lhe proporcionar um herdeiro. Nessa linha histórica, o rei se vê premido entre o momento de sua ascensão ao trono e o momento de sua morte (ou renúncia, destituição por um golpe). Numa sociedade onde o rei é o fiador dos laços entre seu povo e Deus, é de suma importância que não haja um vácuo de poder, que poderia acontecer entre a morte de um rei e a ascensão de um novo soberano. Justamente para evitar esse vácuo, adotou-se o costume de datar os atos do novo rei não da data da sua sagração, mas da morte do seu predecessor.
"Chega-se, assim, ao final da Idade Média à fôrmula "O REI MORREU, VIVA O REI" O que em latim se diz de maneira mais jurídica e mais simbólica: "REX NUNQUAM MORITUR (o rei não morre jamais." (página 451 Dicionário Analítico do Ocidente Medieval Jacques Le Goff e Jean Claude Schmitt, volume 2)
OS LUGARES DO REI:
Geralmente, o lugar do rei era o local de sua coroação. Era o local de inauguração do poder real. Os lugares de residência real também traziam consigo um grande simbolismo. Nesses castelos reais, predominavam duas funções: a de residência e a de defesa.
TIPOS DE REIS:
Havia o rei inútil, uma espécie de rei usurpador, que procurava legitimar-se. Esse usurpador tinha destronado um chefe político legítima. Esse rei inútil (shadow-king) poderia se livrar dessa nomenclatura difamatória se conseguisse legitimar-se. Isso aconteceu com dinastia carolíngia, que tinha usurpado o poder dos merovíngios.
Havia o rei que não tinha interesse pela cultura e pelo saber. Ele era denominado de "REX ILLITTERATUS QUASI ASINUS CORONATUS" (um rei iletrado é apenas um asno coroado).
O ideal era um rei letrado, culto e mesmo erudito, que estivesse à altura de um Estado que se desenvolvia (Estado administrativo, burocrático).
Havia o rex facetus, o rei espirituoso. Essa figura desenvolveu-se no contexto das cortes, onde era necessário que o rei fosse sociável em relação às pessoas que o rodeiam.
Havia os reis frágeis: reis crianças, reis distantes, reis leprosos, reis loucos.
ANOTAÇÕES EXTRAÍDAS DA LEITURA DO LIVRO DICIONÁRIO ANALÍTICO DO OCIDENTE MEDIEVAL, JACQUES LE GOFF E JEAN CLAUDE SCHMITT, VOLUME 2, EDITORA UNESP.
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