Muhammad Ali ou Mehmet Ali
ORIGEM:
Antes de tudo, é preciso esclarecer sobre a grafia do nome de Muhammad Ali. O livro "Os árabes", de Eugene Rogan, grafa o nome como Muhammad Ali. Já o livro "Uma História Concisa do Oriente Média, de Arthur Goldschmidt Júnior e Ibrahim Al-Marashi, grafa o nome como Mehmet Ali.
Muhammad Ali ou Mehmet Ali era de etnia albanesa. Nasceu em 1770, na cidade de Kavala, na Macedônia, que na época fazia parte do Império Otomano. Muhammad Ali era então um comandante a serviço do Império Otomano. Comandava um contingente de 6 mil albaneses.
A modéstia não era uma característica da personalidade de Muhammad Ali, que dizia: nasci no mesmo ano que Napoleão Bonaparte e na terra de Alexandre, o Grande.
Na condição de comandante a serviço do sultão otomano, Muhammad Ali foi escalado para debelar o caos que havia tomado conta do Egito, então uma província otomana, na esteira da saída das tropas napoleônicas em 1801.
Quatro anos depois de chegar ao Egito, com a situação local apaziguada, como recompensa de seu bom trabalho, Muhammad Ali foi alçado pelo sultão otomano para a posição de Paxá, que o credenciava a servir como governador em qualquer província otomana. Num primeiro momento, Muhammad Ali foi nomeado governador na província otomana do Hejaz, na qual se localizava a cidade sagrada de Meca. Mas Muhammad Ali queria mesmo era ser governador do Egito, que tornou-se realidade somente em junho de 1805.
GOVERNADOR DO EGITO:
Muhammad Ali Paxá, na condição de governador da província otomana do Egito, passou a colocar seu plano em marcha, consubstanciado no desejo de fazer do Egito um trampolim a partir do qual buscaria derrubar o sultão otomano, tornando-se então ele próprio o líder do Império Otomano. O Egito, apesar de ser uma província otomano, era dotado de autonomia, cuja obrigação com o Império Otomano consistia no pagamento de um tributo a Istambul. Isso dava a Muhammad Ali, que no papel era somente um vice-rei do sultão otomano, uma grande liberdade de ação, podendo governar o Egito da forma mais independente possível.
"...Muhammad Ali era um otomano e buscava dominar o Império Otomano." (página 101)
Para conseguir dominar o Império Otomano, antes de tudo Muhammad Ali passou a modernizar e a fortalecer o Egito. Muhammad buscou a tecnologia industrial europeia para produzir armas e têxteis para o seu exército. Para pagar por essa tecnologia, o Egito investiu na sua agricultura.
"Mehmet Ali foi ainda o primeiro governante não ocidental a compreender a importância da revolução industrial." (página 185, Uma História Concisa do Oriente Médio).
"O Egito se tornou o primeiro país do Oriente Média a fazer a transição da agricultura de subsistência (na qual os produtores cultivavam o que consumiam, mais o que tinham de pagar em arrendamento e impostos) para o cultivo agrícola comercial (no qual cultivavam produtos para serem vendidos). Tabaco, açúcar, índigo e algodão se tornaram os principais produtos agrícolas. Usando as receitas do que produziam, Mehmet Ali financiava seus esquemas para o desenvolvimento industrial e militar." (página 185 - Uma História Concisa do Oriente Médio).
A autonomia que o Império Otomano concedia à sua província egípcia permitia que Muhammad Ali negociasse diretamente com outros países, como se o Egito fosse um país soberano.
"Ele apreciava ter relações diretas com as grandes potências da Europa, que o tratavam mais como um soberano independente do que como um vice-rei do sultão otomano." (página 101)
CONSOLIDAÇÃO DO PODER NO EGITO:
Muhammad Ali levou 6 anos para consolidar seu poder no Egito. Internamente não enfrentava nenhum desafio.
A primeira campanha militar empreendida pelo Egito de Muhammad Ali foi feita para atender a uma ordem emanada do sultão otomano. A campanha (1812-1818) foi para debelar uma revolta na península arábica, encabeçada pela seita wahabita. O wahabismo foi um movimento que pretendia uma reforma do islamismo, que se opunha ao sultão otomano, por ver no Império Otomano a representação de um islamismo degradado. As forças egípcias, então comandadas por Ibrahim, filho de Muhammad Ali, derrotaram os wahabitas em 1818.
Em reconhecimento aos serviços prestados, o Império Otomano deu a Ibrahim o título de Paxá (governador), nomeando-o governador da província do Hejaz. A província otomana do Hejaz fica no oeste da península arábica, na qual ficam as cidades de Meca, Medina e Jidá (Jedah). Pelo porto de Jidá, milhares de peregrinos chegam, indo depois para a cidade de Meca, na qual realiza-se a peregrinação sagrada que todo muçulmano deve fazer pelo menos uma vez em sua vida (Hajj). Essa peregrinação anual rendia um bom dinheiro para o governador do Hejaz.
Com seu filho no cargo de governador da província Hejaz, na prática Muhammad Ali a adicionou ao seu Egito.
CONQUISTA DO SUDÃO (1820/1824):
Depois da campanha na península arábica, os egípcios sob o comando de Muhammad Ali partiu para o sul, conquistando o Sudão, dominando assim o litoral do Mar Vermelho, conseguindo o monopólio do comércio local, ajudando a enriquecer ainda mais o Egito.
INDEPENDÊNCIA DA GRÉCIA E INTERVENÇÃO EGÍPCIA:
Com a eclosão do movimento de independência na Grécia, o sultão otomano teve que mais uma vez se socorrer do exército de Muhammad Ali.
O exército egípcio de Muhammad Ali foi bem sucedido na contenção da rebelião grega. Como prêmio, a família de Muhammad Ali foi premiado pelo governo otomano com províncias na Grécia e no Mar Egeu.
"Os egípcios estavam conseguindo sufocar rebeliões que haviam resistido aos otomanos e expandindo o território sob controle do Cairo. Se Muhammad Ali se rebelasse, não estava claro se os otomanos seriam capazes de resistir a suas tropas." (página 110)
Resumo da história: O Império Otomano, nos anos 1812/1818, não conseguiu conter a rebelião da seita Wahabita na península arábica. Precisaram então se socorrer do exército egípcio de Muhammad Ali. Na sequência, com a rebelião na Grécia, os otomanos mais uma vez se viram obrigados a se socorrer com o exército de Muhammad Ali. O Império Otomano não conseguia mais resolver os problemas que eclodiam em suas províncias, dependendo cada vez mais do exército egípcio de Muhammad Ali. E a cada serviço prestado ao Império Otomano, a família de Muhammad Ali ganhava mais e mais províncias, aumentando ainda mais o seu poder.
BATALHA DE NAVARINO. INDEPENDÊNCIA GREGA E INSUBORDINAÇÃO DE MUHAMMAD ALI:
Mesmo depois da intervenção egípcia na Grécia, a rebelião não foi totalmente debelada. E para piorar a situação do Império Otomano, as potências ocidentais França e Grã-Bretanha passaram a apoiar a independência da Grécia. Em 1827, na batalha naval de Navarino, França e Grã-Bretanha derrotaram as forças combinadas de egípcios e otomanos. No ano de 1832, um reino independente grego seria estabelecido na Conferência de Londres.
Num ato de insubordinação explícita, Muhammad Ali negociou um tratado em separado com a Grã-Bretanha. Era uma afronta ao sultão otomanos que, um vassalo seu, Muhammad Ali, negociasse com os europeus sem consultá-lo. E o pior de tudo é que o sultão otomano não tinha força militar para obstar a insubordinação de Muhammad Ali.
A CONQUISTA DA SÍRIA:
Muhammad Ali era um insubordinado. Não prestava contas para o sultão otomano, que nominalmente era seu superior. Negociou em separado com os europeus, numa afronta ao sultão otomano. Mas o pior, para o Império Otomano, estava por vir. Muhammad agora visava conquistar militarmente a província otomana da Síria. Agora o exército egípcio estava em guerra contra o Império Otomano. Em 1831, Ibrahim Paxá, o filho de Muhammad Ali, a frente de um exército egípcio bem treinado, nos moldes de um exército europeu, partir para conquistar a Síria.
No caminho para conquistar a Síria, o exército egípcio conquistou a cidade de Acre e a Palestina (1832). Damasco caiu para os egípcios. Agora o exército egípcio partiu para conquistar as cidades de Alepo e Homs. Em outubro de 1832 os egípcios entraram na Anatólia, Na batalha de Konya, em dezembro de 1832, o exército egípcio conseguiu uma grande vitória sobre os otomanos. Os egípcios estavam então a uma distância de 200 quilômetros de Istambul, a capital otomana. O sultão otomano então se viu obrigado a negociar com Muhammad Ali, concedendo a ele as províncias do Hejaz, Creta, Acre, Damasco, Trípoli e Alepo. Muhammad Ali ainda foi reconduzido à posição de Governador do Egito, que tinha perdido quando seu filho Ibrahim Paxá invadiu a Síria (Paz de Kutahya - 1833)
DOMÍNIO EGÍPCIO NA SÍRIA:
O domínio egípcio na Síria causou descontentamento entre a população local. Aumento de impostos e recrutamento para o exército fizeram com que os sírios passassem a odiar a presença egípcia. Rebeliões então eclodiram na Palestina e no Líbano, que faziam parte da Grande Síria (a Grande Síria do século XIX abrangia os atuais Líbano, Síria, Jordânia, Israel, Cisjordânia, Faixa de Gaza).
Muhammad Ali não se deixou amedrontar pela rebelião. Ele estava tão confiante de seu poder que passou a trabalhar pelo desmembramento definitivo da Síria e do Egito do Império Otomano, buscando até uma forma de indenizar o sultão otomano.
O problema para Muhammad Ali era que a França e a Grã-Bretanha não iriam aceitar o desmembramento do Império Otomano. Então, quando tudo parecia perdido para o Império Otomano, ele foi socorrido por uma coalização europeia, constituída por Grã-Bretanha, Áustria, Prússia e Rússia.
Em janeiro de 1841, acossado por rebeliões e pela coalização europeia, os egípcios saíram da Síria.
CAPITULAÇÃO DE MUHAMMAD ALI:
Um acordo intermediado pelos britânicos estabeleceu que Muhammad Ali teria o governo hereditário do Egito e do Sudão. Em troca, Muhammad Ali, além de abandonar a Síria, reconheceu o sultão otomano como seu suserano, concordando ainda a fazer um pagamento anual ao Império Otomano. Enfim, pelo menos nominalmente, o Egito voltava a ser uma província otomana.
"O Egito teria o seu próprio governo e faria suas próprias leis, mas permaneceria vinculado à política externa do Império Otomano." (página 121)
MORTE DE MUHAMMAD ALI:
Muhammad Ali morreu em agosto de 1849. Foi sucedido pelo seu neto Abbas.
A dinastia inaugurada por Muhammad Ali governaria o Egito até que a revolução de 1952 a derrubasse.
ANOTAÇÕES EXTRAÍDAS DAS LEITURAS DOS LIVROS "UMA HISTÓRIA CONCISA DO ORIENTE MÉDIO, DE ARTHUR GOLDSCHMIDT JUNIOR E DE IBRAHIM MARASHI, EDITORA VOZES E "OS ÁRABES", DE EUGENE ROGAN, EDITORA ZAHAR