NEGOCIAÇÕES ENTRE A ALEMANHA NAZISTA E A UNIÃO SOVIÉTICA. 12 DE NOVEMBRO DE 1940. MOLOTOV VAI A BERLIM PARA SE ENCONTRAR COM HITLER E RIBBENTROP. NEGOCIAÇÕES PARA A CONTINUIDADE DO ACORDO NAZI-SOVIÉTICO, ASSINADO EM 23 DE AGOSTO DE 1939. DIRETIVA N°21 A DECISÃO DE HITLER DE ATACAR A UNIÃO SOVIÉTICA, DEZEMBRO DE 1940.
MOLOTOV VAI A BERLIM:
Em 12 de novembro de 1940, Molotov, o Ministro das Relações Exteriores da União Soviética, vai a Berlim para negociar a continuidade do Pacto Ribbentrop/Molotov, o acordo Nazi-Soviético assinado em 23 de agosto de 1939.
"O tempo não ofereceu um bom presságio na chegada de Molotov a Berlim. Céus de chumbo e chuva fustigante receberam o Ministro do Exterior soviético na capital de Hitler." (página 224)
Nessa viagem, Molotov se encontrou com Ribbentrop, Ministro das Relações Exteriores da Alemanha Nazista e com o próprio Hitler.
Nesse momento, tanto a Alemanha quanto a União Soviética desejavam manter o acordo. Mas esse era o único ponto em comum entre as duas ditaduras, pois de resto não havia pontos de convergência.
A POSIÇÃO ALEMÃ:
Os alemães estavam desgostosos com o comportamento da União Soviética. A Alemanha se via como a única parte do acordo que tinha se arriscado, entrando em guerra contra a Polônia, a Grã-Bretanha e a França. Enquanto isso, a União Soviética anexou territórios nos países Bálticos (Letônia, Lituânia, Estônia), no leste da Polônia e na Bessárabia e na Bucovina, sem precisar disparar um tiro sequer.
A parte econômica do acordo, consistente no envio de matéria-prima soviética para a indústria alemã, também não estava sendo vantajosa para a Alemanha.
A Alemanha queria que a União Soviética se abstivesse da Europa. A Alemanha não via com bons olhos o desejo da União Soviética de se imiscuir em assuntos europeus. A URSS já tinha anexado os países bálticos, uma parte da Finlândia, o leste da Polônia, a Bessarária e a Bucovina. Para a Alemanha seria melhor que a União Soviética se concentrasse na expansão territorial para o sul, na direção do Golfo Pérsico/Oceano Índico, onde iria se chocar com os interesses da Grã-Bretanha. Esse seria o melhor dos mundos para a Alemanha nazista:
Ver a URSS esquecer a Europa, deixando-a para a Alemanha, expandindo-se para a região do Golfo Pérsico e do Oceano Índico, chocando-se com os interesses do Império Britânico.
"Hitler claramente queria a União Soviética de Stalin fora da Europa, incapaz de intrometer-se em assuntos balcânicos, ou do mar Báltico e do Bósforo. Ao tentar empurrar a URSS para o sul, canalizando suas ambições para o Oceano Índico e o 'falido' Raj britânico, ele não só queria alcançar esse objetivo mas também levar a União Soviética a um conflito com os britânicos, o que desestabilizaria a URSS e impossibilitaria qualquer suposta reaproximação anglo-soviética." (página 242)
Para conseguir convencer a URSS de seu plano, Ribbentrop e Hitler, em novembro de 1940, tentaram convencer Molotov de que a guerra já tinha praticamente acabado, com a Grã-Bretanha em vias de se render, de forma que o Império Britânico poderia então ser dividido entre a Alemanha e a União Soviética. A ironia da história é que, durante a estada de Molotov em Berlim, em meados de novembro de 1940, aviões britânicos bombardearam a cidade, mostrando que a Grã-Bretanha estava longe de uma rendição.
Num desses bombardeios, Molotov e Ribbentrop foram se refugiar num abrigo, num bunker.
"Enquanto Molotov e Ribbentrop discutiam como dividir o mundo fora do bunker, portanto, ouviram sem dúvida a cacofonia do ataque aéreo (britânico), particularmente o gemido ondulante das sirenes e os sustentados disparos das baterias antiaéreas de Berlim. Naquelas circunstâncias, as reiteradas afirmações de Ribbentrop de que os britânicos estavam acabados e a guerra contra a Grã-Bretanha 'ja estava ganha' devem ter soado um pouco prematuras. De acordo com Stalin, Molotov conteve as presunções de Ribbentrop com uma estocada certeira, perguntando 'por que estamos neste abrigo e de quem são essas bombas que caem', se a Grã-Bretanha tinha sito derrotada. Ribbentrop finalmente calou-se, tinha tinha o que responder." (páginas 239/240)
A POSIÇÃO DA UNIÃO SOVIÉTICA:
A União Soviética via-se em ótima situação. Tinha tido ganhos territoriais sem precisar entrar em guerra. Estava em paz, enquanto via Alemanha e Grã-Bretanha brigando entre si. Stálin tinha o desejo de manter o acordo Ribbentrop-Molotov.
"No que dizia respeito a Moscou, as negociações deveriam continuar. As conversações de Berlim tinham sido apenas a abertura do processo." (página 240)
A União Soviética, no encontro de novembro de 1940, deixou claro sua posição:
- A Finlândia deveria fazer parte de sua esfera de influência, não aceitando qualquer ingerência alemã ali
- A União Soviética queria ter alguma forma de controle sobre os estreitos de Dardanelos e Bósforo. A União Soviética queria uma garantia de que suas bases no Mar Negro não seriam atacadas por meio desses estreitos pertencentes à Turquia.
- Queria que a Alemanha explicasse as razões do acordo Tripartite entre esta, a Itália e o Japão.
- A União Soviética tinha interesse na expansão para o sul do Cáucaso, na direção do Golfo Pérsico
- A União Soviética também tinha interesse no status dos estreitos de Kattegat e Skagerrak , que ligam o Mar Báltico ao Mar do Norte, e depois ao Oceano Atlântico.
- A União Soviética queria discutir a neutralidade da Suécia.
- A União Soviética ainda queria discutir assuntos relacionados à Hungria e à Iugoslávia.
Como vemos então, a União Soviética, ao contrário do que desejava a Alemanha, tinha interesses na Europa. Não se contentaria apenas com uma expansão para o sul, em direção ao Golfo Pérsico e Oceano Índico. A União Soviética também tinha interesses na Europa.
A DECISÃO DA ALEMANHA NAZISTA DE ATACAR A UNIÃO SOVIÉTICA - UMA DECISÃO ESTRATÉGICA, NÃO IDEOLÓGICA:
Em novembro de 1940, a Hitler ainda não tinha batido o martelo no sentido de ordenar um ataque à União Soviética. O encontro de novembro de 1940 entre Hitler e Molotov não tinha a intenção de enrolar os soviéticos. Ainda havia, por parte dos nazistas, a intenção de manter o acordo Nazi-Soviético. Os alemães, na realidade, naquela altura dos acontecimentos, mantinham todas as possibilidades em aberto: solução diplomática e solução militar. Uma solução militar contra a URSS já tinha sido aventada por Hitler em julhos de 1940, mas sem maiores consequências.
A decisão concreta de realmente travar uma guerra contra a União Soviética só veio em dezembro de 1940, por meio da Diretiva número 21. O que desencadeou essa decisão extrema foi o comportamento da União Soviética durante a Conferência do Danúbio - Comissão Internacional do Danúbio (outubro/dezembro de 1940).
"A Comissão Internacional do Danúbio pertencia a esse tipo de organização regional cujas atividades raramente afetam os negócios internacionais (...) fazia reuniões periódicas, e em várias iterações, para regulamentar o tráfego no Danúbio e servir de fórum para as potências vizinhas resolverem suas diferenças. Mas, em 1940, aquilo que até então tinha sido uma questão bastante provinciana já se tornara o joguete das ditaduras totalitárias europeias, com a Alemanha e a União Soviética - esta ultima uma 'Potência Danubiana' - disputando a supremacia." (página 244)
Mais uma vez, para desgosto dos alemães, a União Soviética resolver se meter em assuntos europeus, agora sobre a regulação da navegação no Rio Danúbio. Esse comportamento soviético foi a gota d'água que fez o copo alemão transbordar. Estava claro para a Alemanha que a URSS não iria deixar a Europa somente para a Alemanha. Diante disso, Hitler resolveu emitir ordens para o planejamento de um ataque à União Soviética.
Tudo o que acima foi dito comprova que o que levou Hitler a preparar uma guerra contra a URSS foi a questão estratégica, nada tendo a ver com ideologia.
"A maior queixa do Fuhrer contra Moscou, portanto, não era ideológica, mas estratégica. A virada contra a União Soviética costuma ser descrita quase exclusivamente em termos ideológicos, como expressão de um preconceito antibolchevique que vinha de longa data e nunca foi suprimido por completo. Há qualquer coisa de verdade nisso, claro. (...) Mas preocupações estratégicas e geopolíticas ainda tinham mais influência do que a ideologia (...) Consequentemente, só em dezembro, quando Moscou insistiu mais uma vez em seu papel europeu durante a conferência da Comissão Danubiana, quando a resposta soviética às propostas de Ribbentrop em Berlim foram recebidas e as perspectivas de uma solução negociada pareciam esgotadas, é que Hitler tomou a decisão irrevogável de atacar Stalin. Esse nexo fica mais claro quando se leva em conta o momento escolhido. A conferência da Comissão Danubiana finalmente entrou em colapso em 17 de dezembro, com as delegações italiana e soviética trocando socos. Na manhã seguinte, Hitler baixou sua Diretiva número 21, ordenando às forças alemãs que preparassem para 'esmagar a Rússia soviética numa campanha fulminante'. Com isso, a sentença de morte do Pacto Nazi-Soviético foi decretada - e nasceu a Operação Barbarossa." (página 246)
ANOTAÇÕES EXTRAÍDAS DA LEITURA DO LIVRO "O PACTO DO DIABO, A ALIANÇA DE HITLER COM STALIN, 1939-1941", ROGER MOORHOUSE, EDITORA OBJETIVA