quinta-feira, 19 de março de 2020

Mundo Pós-Napoleônico Legados da Revolução Francesa Doutrina Monroe Equilíbrio de Poder Concerto da Europa Diplomacia de Gabinete Natureza da Soberania


DOUTRINA MONROE:

De dezembro de 1823. Essa doutrina nascida nos EUA impedia que países europeus viessem intervir em assuntos relacionados aos países americanos. Impedia, por exemplo, que a Espanha viesse restaurar as suas colônias nas Américas. 
Entre 1812 e 1814, os americanos estavam em guerra contra a Grã-Bretanha, disputando direitos de pesca e a fronteira do Canadá. 

DOMÍNIO BRITÂNICO SOBRE OS OCEANOS:

Em grande parte do século XIX, os britânicos dominavam os Oceanos. Dominavam o comércio/transporte mundial.
Durante o Mercantilismo, um determinado país buscava expulsar um país concorrente da exploração de uma atividade comercial. A Grã-Bretanha do século XIX não agia dessa forma. A Grã-Bretanha tinha vantagens competitivas insuperáveis, de forma que não precisava apelar para o Mercantilismo. A Grã-Bretanha, sabedora de seu desenvolvimento industrial, defendia o Livre Comércio internacional. Ela assim o fazia porque seu desenvolvimento econômico e industrial era tão formidável que conseguiria superar qualquer um que porventura resolvesse desafiá-la. A indústria da Grã-Bretanha não tinha concorrentes e por isso ela defendia o Livre Comércio Mundial. 

GUERRAS, UM MODO DE VIDA NA EUROPA E BUSCA PELO CONCERTO DA EUROPA:

Um breve inventários de algumas Guerras na Europa:

1)Guerra dos 30 anos (1618/1648): Entre outras desgraças, ceifou a vida de 1/3 da população alemã
2)Guerra da Sucessão Espanhola (1701/1714)
3)Guerra da Sucessão Austríaca (1740/1748)
4)Guerra dos Sete Anos (1756/1763)
5)Guerras Revolucionárias e Napoleônicas (1792/1815)
6)Guerra do Norte (1701/1721)

Em contraste, entre 1815 e 1914, houve um número menor de guerras, com duração e impacto relativamente limitados, com poucos Estados envolvidos: 
1)Guerra da Crimeia (1854/56)
2)Guerras da Unificação Alemã (Áustria/Prússia/Dinamarca: 1864; Áustria/Prússia: 1866; Prússia/França: 1871)
3)Guerra da Unificação Italiana ( França/Piemonte Sardenha/Áustria)

Por que houve menos conflitos no século XIX em comparação com os séculos anteriores?

Resposta: Abandonou-se a política do EQUILÍBRIO DE PODER, segundo o qual nenhum Estado poderia tornar-se tão poderoso a ponto de dominar todos os outros Estados. Em seu lugar adotou-se o CONCERTO DA EUROPA, segundo o qual manter-se-ia a paz por meio de instituições colaborativas. Os países europeus agora buscariam entrar em acordo apesar de seus interesses antagônicos. Subjacente a essa ideia colaborativa estava o medo da revolução. Era o medo da revolução em seu próprio país, com o seu povo saindo às ruas para lhe derrubar, que levou Soberanos da Europa a deixar de lado sentimentos antagônicos, entrando em acordo com países que antes eram seus inimigos. Esses soberanos ainda tinham pesadelos com a Revolução Francesa, com um rei e uma rainha sendo guilhotinados. 

RESQUÍCIOS DO EQUILÍBRIO DE PODER E MUDANÇA NA NATUREZA DA SOBERANIA - DAS CASAS DINÁSTICAS PARA A NAÇÃO/ESTADO:

O Equilíbrio de Poder não tinha sido totalmente abandonado. No passado, a França, país que era então o mais rico e populoso da Europa, se candidatou ao posto de liderança. Desde os tempos de Luís XIV que a França flertava com a ideia de ser a líder de uma Monarquia Universal.
Porém, as derrotas de Napoleão no século XIX foram o canto do cisne para o sonho de liderança francês. Nem por isso os outros países europeus ficaram tranquilos. Eles temiam o ressurgimento da França. Não confiavam nela. Sabiam do que a França era capaz.

"No resto do século XIX, houve mais ou menos um equilíbrio de poder entre os principais Estados continentais..."
(página 63)

No Congresso de Viena vigorou aquilo que se denomina de DIPLOMACIA DE GABINETE. Nesse tipo de diplomacia, territórios são repartidos entre países sem se levar em conta os interesses das pessoas que os habitam.

"Passei o dia cortando a Europa como se fosse um queijo" (Matternich, durante o Congresso de Viena, em 1815)
(página 63)

De fato, ninguém perguntava, por exemplo, aos habitantes da Renânia se eles queriam ser governados pela distante Prússia, e nem perguntavam aos italianos do norte se eles queriam ser governados pela ainda mais distante Áustria. Mas era dessa forma que as coisas eram feitas, mas isso iria mudar, porque a Revolução Francesa tinha mudada a natureza da Soberania na Europa.
Nos séculos XVII e XVIII as maiores causas de guerras na Europa tinham a ver com disputas dinásticas, como as guerras das sucessões austríaca e espanhola no século XVIII.
Após 1815, este já não era o caso. A base da Soberania transitou para as nações e os Estados. A Soberania mudou de mãos: das mãos de família dinásticas/indivíduos para as mãos da Nação/Estado.

"Os tratados como os de 1814-15 eram concluídos entre Estados e não entre monarcas individuais e conservavam a validade até que uma das partes o revogasse de forma deliberada. Com efeito, o príncipe ou o governante tornou-se o executor da soberania nacional ou estatal garantida por acordo internacional com a força de lei."
(página 64)

"Antes de 1815, todos os tratados internacionais eram considerados nulos após a morte de um soberano e tinham que ser imediatamente renovados com a assinatura de um novo soberano para não caducarem."
(página 64)


ANOTAÇÕES EXTRAÍDAS DA LEITURA DO LIVRO "A LUTA PELO PODER, EUROPA 1815-1914", RICHARD J. EVANS, EDITORA EDIÇÕES 70.


Mundo Pós-Napoleônico França e Alemanha



MONARQUIA FRANCESA RESTAURADA. ÉPOCA PÓS-NAPOLEÔNICA:

A Revolução Francesa de 1789 causou uma mudança na natureza da relação entre governados e governantes. Isto foi mais evidente na França. 
Mas o rei francês Luís XVIII, que assumiu o poder com a queda de Napoleão Bonaparte, não via dessa maneira. Para Luís XVIII o mundo não tinha mudado. Ele ainda vivia no Ancien Régime (Antigo Regime), aquele que vigorava antes da Revolução Francesa. Tão logo assumiu o poder, Luís XVIII fez uma série de mudanças. Ele queria retroceder o relógio da história para 1788. Começou por aposentar a bandeira tricolor da revolução para ressuscitar a fleur de lys da Monarquia Francesa. 

"Quando um cortesão o informou, em 1814, da abdicação de Napoleão, dizendo-lhe: 'Senhor, sóis o Rei de França', ele (Luís XVIII), respondeu: 'Alguma vez deixei de ser o rei?' "
(página 65)

Luís XVIII também rejeitou a Constituição aprovada pelo último Senado de Napoleão, pois ela dizia que a autoridade real derivava de um contrato implícito entre o rei e o povo. O entendimento de Luís XVIII era que a autoridade real vinha de duas fontes:

1) Direito Divino
2) Declaração de Ouen, que era a base da Constituição da Monarquia Restaurada francesa. Por meio dela, Luís XVIII, pela graça de Deus, rei de França e de Navarra,  concedia os direitos ao povo francês por sua própria vontade. 
Mas Luís XVIII também fazia concessões. A seguir daremos alguns exemplos:

"...(Luís XVIII) concordou em não dar início a qualquer restauração das terras confiscadas durante a revolução francesa à Igreja, à nobreza ou à Coroa. Meio milhão de pessoas haviam comprado as suas propriedades, e era politicamente impraticável obrigá-la, ou às pessoas a quem as tinham vendido, a devolvê-la."
(página 65)

Luís XVIII ainda manteve o Código Napoleônico.
Luís XVIII criou uma Monarquia Absoluta limitada por dispositivos constitucionais, que podia ser anulada a qualquer momento. Estabeleceu uma legislatura bicameral que podia consentir ou não na promulgação de impostos. Mas Luís XVIII podia dissolver essa legislatura, convocando novas eleições em qualquer momento.
A Legislatura Bicameral era composta por uma Câmara Alta, cujos membros eram indicados pelo rei. Para a Câmara dos Deputados vinham representantes eleitos por homens com mais de 40 anos e que pagavam, por ano, 300 francos em impostos. Havia 90 mil eleitores numa população de 28 milhões de habitantes.
Em 13 de fevereiro de 1820, um sobrinho de Luís XVIII, o duque de Berry, foi assassinado por um seleiro descontente com os rumos do país. Em 16 de setembro de 1824 morreu Luís XVIII, vitimado por obesidade mórbida, sendo sucedido por seu irmão, Carlos X.

CARLOS X:

Carlos X, pai do assassinado Duque de Berry, era profundamente conservador. Queria a pena de morte para quem profanasse a hóstia. Queria compensação financeira aos nobres que haviam perdido terras durante a Revolução Francesa. Sob Carlos X, a Igreja Católica assumiu a responsabilidade pela nomeação de todos os professores primários. As atitudes reacionárias de Carlos X recrudesceu o movimento oposicionista francês. Entre esses oposicionistas, havia Benjamin Constant, um liberal moderado, escritor e jornalista. Surgiam sociedades secretas, lojas maçônicas. Elas difundiam-se não só na França, mas por toda a Europa e ainda tinham contatos na América Latina, constituindo uma espécie de Internacional Liberal que transcendia as fronteiras políticas. 

ALEMANHA NO PERÍODO PÓS-NAPOLEÔNICO:

A Alemanha pós-napoleônica organizou-se por meio de uma Confederação Germânica, composta por Estados membros que se reuniam numa Dieta (Dieta da Confederação), por meio de seus representantes.
Na prática, a Confederação Germânica era dominada pela Áustria e pela Prússia (governada por Frederico Guilherme III - 1770/1840).
Havia alemães que defendiam a unificação alemã, entre eles destacava-se Ernst Moritz Arndt (1769/1860). Moritz Arndt defendia que a Alemanha deveria ser unificada sob uma Monarquia Constitucional, com a sua capital em Berlim, eliminando assim todos os estados membros autoritários que compunham a Confederação Germânica. Os alemães que sonhavam com a unificação de seu país tinham como inspiração os alemães que se voluntariaram (movimento Burschenschaft) na guerra contra Napoleão, nos anos de 1812 e 1813. Sua bandeira era a tricolor preta, vermelha e dourado.
Durante a ocupação napoleônica da Alemanha, voluntários alemães queimavam o Código Napoleônico e folhetos que apelavam à colaboração com os franceses. Essa queima de escritos e livros foi criticada pelo poeta Heinrich Heine (1797/1856). Tratava-se realmente de um movimento radical ao ponto de estimular um jovem membro do grupo, um estudante de teologia, Karl Sand, de 25 anos, a assassinar o escritor August Von Kotzebue, por este fazer pouco caso do movimento Burschenschaft e por ser alinhado com as ideias do governante autocrata russo, Alexandre I. August Von Kotzebue defendia ideias conservadoras, mantenedoras do status quo europeu.
As paixões na Alemanha pós-Napoleão estavam afloradas. Depois de matar Kotzebue, Karl Sand gritava: "Viva a Pátria Alemã." Karl Sand foi condenado à decapitação e tornou-se herói do movimento nacionalista alemão.

METTERNICH. REAÇÃO AOS MOVIMENTOS LIBERAIS.

O Chanceler austríaco agiu para diminuir a agitação na Alemanha. Valendo-se da Confederação Germânica, usou a sua Dieta, situada em Frankfurt, para aprovar leis que visavam impedir que os movimentos subversivos da ordem ganhassem força na Alemanha. Exemplos: Jornais ficariam sujeitos à censura, caso estimulassem ideias subversivas que visassem a derrubada da ordem instituída. Membros de organizações nacionalistas eram punidos, com estudantes sendo expulsos de Universidades.
Metternich, enfim, buscava criar uma legislação que obstasse o triunfo de movimentos liberais (constitucionais e de unidade)
Em 1829, a Constituição da Confederação Germânica permitia que um Estado-membro intervisse caso houvesse perturbação da ordem estabelecida em algum outro Estado-membro. Nessa Constituição ainda foi retirada referências à emancipação dos judeus e à tolerância religiosa. Assim como acontecia na França, a Alemanha buscava retroceder o relógio da História para antes da Revolução Francesa.
Na maioria dos Estados-Membros componentes da Confederação Germânica, havia instituições representativas, mas elas estavam cerceadas e limitadas por uma série de regras, desestimulando totalmente qualquer participação mais ampla do público. Essas instituições, na verdade, não eram representativas da vontade da maioria do povo alemão.

"...os Estados alemães eram dirigidos de forma burocrática e não autocrática, e um sistema de administração baseado em regras era geralmente visto como uma limitação mais eficaz do poder arbitrário do soberano do que as assembleias representativas."
(página 73)


ANOTAÇÕES EXTRAÍDAS DO LIVRO "A LUTA PELO PODER, EUROPA 1815-1914", DE RICHARD J. EVANS, EDITORA EDIÇÕES 70

Mundo Pós-Napoleônico Napoleão estava morto mas a Revolução Francesa tinha mudado o mundo para sempre As ideias democráticas da Revolução Francesa sobreviveram a Napoleão Santa Aliança Congresso de Viena



A REVOLUÇÃO FRANCESA TINHA MUDADO O MUNDO:

O domínio dos mares foi a base sobre a qual o poder europeu foi construído. Permitiu a colonização de outras partes do mundo e o domínio do comércio, estrangulando centros de manufaturas fora da Europa. Criou-se a crença de que as ideias europeias eram superiores às ideias da maior parte do resto do mundo.
Mas o mundo mudara. De nada adiantava restaurara Monarquias derrubadas pela Revolução. Não tinha como retroceder o relógio da história para antes de 1789. Impérios caíam (o Império Espanhol nas Américas; a França perdeu o Canadá e a Índia). Portugal perdera o Brasil. A guerra peninsular (1807-1814) tinha exaurido as forças da Espanha. Ela não teve como impedir a queda de seu Império nas Américas. 
Enquanto França, Portugal e Espanha sofriam, a Grã-Bretanha olhava com simpatia a independência de países nas Américas. A Grã-Bretanha queria que o Mercantilismo fosse quebrado e no seu lugar vigorasse o Livre Comércio, que iria favorecê-la, por ela ter vantagem competitiva. Países livres também significavam novos mercados consumidores para os produtos ingleses. Não era por bondade que a Grã-Bretanha aplaudia a independência de países nas Américas. Era por interesse comercial que a Grã-Bretanha atuou para a ajudar a Independência de alguns países nas Américas. Simon Bolívar foi apoiado. A Grã-Bretanha usou sua força naval para ajudar na independência de países nas Américas.

"Resolvi que, se França tinha Espanha, não deveria haver Espanha nas Índias. Fiz nascer o Novo Mundo para restabelecer o equilíbrio do velho" (George Canning, Ministro dos Negócios Estrangeiros da Grã-Bretanha)
(página 50)

É inegável que as ideias da Revolução Francesa impactaram as independências dos países das Américas. Uma dessas ideias atacava o princípio da hereditariedade, minando dessa forma a legitimidade de instituições como a monarquia, a aristocracia. Essa ideias chegaram às Américas, colonizadas por essas Monarquias. Esse impacto fez nascer uma ligação entre os liberais europeus e os liberais latino-americanos. Na Europa pós-Napoleão havia uma disputa entre os defensores de regimes monárquicos reacionários (restaurados pelo Congresso de Viena) contra os liberais revolucionários. E esses liberais tinham conexões nas Américas. Um deles, Giuseppe Garibaldi, participou de revoluções no Brasil.

CONGRESSO DE VIENA:

A liderança das conversações coube a Klemens Von Metternich (conde e depois príncipe), um nobre da região do Reno (Alemanha) que cresceu na carreira de Estado. A Áustria, para quem Metternich trabalhava, queria restaurar o estado de coisas anteriores a 1789. O relógio da história teria que retroceder. 
O Congresso de Viena tinha como objetivo restaurar a legitimidade dos reis que tinham sido destronados por Napoleão. Queria evitar novas guerras, criando relações sólidas entre os países, inclusive amarrando a França por meio de tratados e acordos. Era preciso resolver de uma vez por todas os litígios entre os países, colocando-os no interior formada por uma rede de relações internacionais, amarrando-os uns aos outros. 
Durante as conversações em Viena, capital da Áustria, a França, com sua Monarquia restaurada na figura de Luís XVIII, foi representada por Charles Maurice de Talleyrand Périgord. 
A Rússia tinha Alexandre I, um autocrata, confiante que as instituições russas deveriam servir de modelo para outros países, pois elas se demonstraram vencedoras na guerra, marchando pela Europa, derrotando os exércitos de Napoleão e ocupando Paris. A vitória sobre Napoleão, na cabeça de Alexandre I, justificava as instituições russas, como por exemplo a autocracia (administração e legislação nas mãos do Czar), a servidão, etc.
O Congresso de Viena redesenhou o mapa da Europa. A Áustria perdeu a sua parte (atual Bélgica) nos Países Baixos para a Holanda mas recuperaram todos os seus outros territórios, restabelecendo o controle sobre a Lombardia (atual Itália), o Vêneto (atual Itália) e em boa parte da Dalmácia (atual Croácia).
Foi criada ainda uma nova Confederação Germânica, sob a presidência da Áustria. Suas fronteiras eram quase iguais ao do falecido Sacro Império Romano Germânico, mas agora com 39 Estados e não mais com os mais de um milhar do século XVIII.
A Confederação Germânica não era um Estado nacional. Tanto não era nacional que o Estado de Hanôver, pertencente à Confederação, era governado por um rei inglês. Alguns tinham territórios fora da Confederação, como por exemplo os Habsburgos, soberanos da Áustria, que presidia-a.
A Prússia ganhou terras na Renânia, incluindo o Vale do Ruhr. A entrega do Vale do Ruhr para os Prussianos tinha como objetivo criar um Estado-tampão para conter os franceses. Para contrabalançar o controle russo na Polônia, os Prussianos ganharam o norte da Saxônia, a Pomerânia sueca e a Posnânia (Posen/Poznan) e Gdansk.
A Rússia abocanhou territórios na Bessarábia, na Finlândia e na Polônia. 
A França, outrora poderosa, se viu cercada pela Renânia Prussiana, pelo Reino dos Países Baixos (Holanda + Bélgica), pela Suíça reconstituída e pelo Reino do Piemonte Sardenha.
Com o Congresso de Viena, a Grã-Bretanha consolidou seu Império. Ceilão (Sri Lanka), Cabo da Boa Esperança (África do Sul) e Malta ficaram com os ingleses.
O Congresso de Viena ainda ilegalizou, pelo menos sob o ponto de vista formal, o Tráfico de Escravos nos assuntos relacionados com a Europa. 

SANTA ALIANÇA:

Em 1815,mesmo ano em que foi encerrado o Congresso de Viena (20/11/1815)  foi criada a SANTA ALIANÇA, que reunia Rússia, Áustria e Prússia e outros Estados pequenos. Os signatários desse acordo concordavam em administrar seus países segundo os princípios do evangelho cristão, de maneira que a guerra deveria ser banida da Europa. Os ingleses não botavam fé na sinceridade dos signatários da Santa Aliança, mas mesmo assim Jorge IV a assinou, mas sem se comprometer. Os ingleses também temiam o fantasma da democracia criado pela Revolução Francesa, tanto quanto os prussianos, os russos e os austríacos. 

A SANTA ALIANÇA E A RÚSSIA COMO GUARDIÃ DA ORDEM EUROPEIA:

A Santa Aliança criava a perspectiva da intervenção russa noutras partes da Europa, Exemplo: Em 1848, a Rússia, vindo em auxílio à Áustria, interviu na Hungria, mantendo assim o Império Austro-Húngaro íntegro.

COMO AS PESSOAS VIAM A GUERRA DEPOIS DOS CEM DIAS DE NAPOLEÃO:

A guerra era vista como sendo praticada entre regimes ou entre ideologias antagônicas, não entre nações. No entanto, após os 100 dias de Napoleão no poder, os países da Europa começaram a ver a guerra sob outro prisma: eles se voltaram contra a nação francesa, contra os franceses, que agora tinham que suportar, dentre outras coisas, a presença de quase um milhão de soldados aliados em seu território.


ANOTAÇÕES EXTRAÍDAS DA LEITURA DO LIVRO "A LUTA PELO PODER, EUROPA 1815-1914", DE RICHARD J. EVANS, EDIÇÕES 70.

Depois de Napoleão Bonaparte Mito Bonapartismo Medidas Preventivas contra Revoluções Napoleão estava morto mas as ideias da Revolução Francesa estavam viva



DEPOIS DE NAPOLEÃO. O BONAPARTISMO:

Napoleão foi derrotado definitivamente em 18 de junho de 1815, na Batalha de Waterloo. Napoleão foi exilado na ilha de Santa Helena, onde veio a morrer em 1821.
Nos últimos cem dias (fuga da ilha de Elba até a Batalha de Waterloo) que ficou no poder, Napoleão tentou vestir a roupagem de um liberal. Nesses cem dias, Napoleão prometia paz ao mundo e valores liberais para os franceses. Tinham acabado os tempos de conquistas militares.
O mito do Napoleão Bonaparte liberal cultivado em seus 100 dias de retorno ao poder deu origem ao vocábulo BONAPARTISMO. 
O Bonapartismo se diferenciava do Republicanismo, pois o primeiro tinha ênfase na figura de uma liderança forte e na glória militar, enquanto que o Republicanismo dava ênfase ao sufrágio universal para os homens, para a burocracia estatal eficiente, para a adoção de referendos, plebiscitos e o Estado deveria tratar todas as pessoas de forma igual.

NAPOLEÃO E O USO DE UM GOLPE MILITAR PARA SE ALCANÇAR O PODER POLÍTICO:

A ideia de um golpe militar como forma de se alcançar o poder político transitava normalmente pelas mentes dos franceses. Essa ideia era inspirada pelo Golpe de Estado Militar de Napoleão de 18 de Brumário (9/11/1799), que derrubou o Diretório Revolucionário e elevou Napoleão à posição de 1º Cônsul e o levou depois a estabelecer o 1º Império Francês em 1804. As pessoas, inspiradas pelo golpe dado por Napoleão em 1799, sonhavam que os Regimes da Restauração, que eram repressivos e que queriam voltar para antes de 1789 (Antigo Regime), poderiam ser derrubados por um novo golpe, dando lugar a um regime Liberal. 
Os poloneses e os irlandeses inspiravam-se em Napoleão. Simon Bolívar, na América Latina, via em Napoleão um herói.
Enfim, Napoleão, o golpista, o Imperador, tinha se tornado um Mito, servindo de símbolo para as pessoas que queriam lutar pela derrubada de regimes opressivos, lutando contra a dominação colonial para no fim implantarem um regime liberal e constitucional.


CONSEQUÊNCIAS DAS GUERRAS NAPOLEÔNICAS:

Jakob Walter, um pedreiro alemão, recrutado pelo Estado fantoche francês de Vurtemberga (Wurttemberg) para o exército francês que seguiria para Rússia, foi e conseguiu voltar vivo à sua casa. Jakob foi porque não tinha alternativa, senão obedecer. Jakob era indiferente à política, à França; não odiava os russos; era indiferente ao Estado fantoche francês de Wurttemberg. Jakob Walter também não tinha interesse pelo resultado das guerras napoleônicas.
Quase 1/4 de século de guerras (a partir de 1789) havia deixado a população cansada. Jakob Walter queria apenas sobreviver. Outro compromisso dele era com a Fé Católica, que o sustentava em meio ao sofrimento.
Seiscentos e oitenta e cinco mil soldados (italianos, franceses, alemães e poloneses) invadiram a Rússia em 1812. Menos de 70 mil regressaram. Jakob Walter foi um dos que regressou. Quatrocentos mil foram mortos e 100 mil feitos prisioneiros (número desconhecido de isolados e desertores).
Em 1814 os aliados ocuparam Paris e Napoleão Bonaparte foi exilado na Ilha de Elba.
No período compreendido entre 1789 e 1815 cinco milhões de pessoas morreram. Moscou, a capital da Rússia, foi incendiada, entre 7 mil e 9 mil casas foram destruídas pelo fogo, além de 8 mil lojas e armazéns. Não havia como compensar todas essas perdas.
A Espanha também sofreu sob a ocupação francesa. Houve pilhagens, carnificinas. A Renânia, na Alemanha, sofreu com a requisições do Exército francês. Em Aachen (oeste da Alemanha), habitantes morriam de fome. Exércitos tinham que viver da terra na qual estava estacionados ou passando por ela. Daí as requisições, quando não as pilhagens, os saques. Era preciso alimentar milhares de soldados e os animais, como por exemplo, a cavalaria que puxava as peças de artilharia.

PERÍODO IMEDIATAMENTE POSTERIOR AO ENCERRAMENTO DAS GUERRAS NAPOLEÔNICAS (1815/1820):

Se não bastassem os danos causados pelas guerras napoleônicas, mudanças climáticas causadas pela erupção de vulcões causaram danos à produção agrícola europeia. Havia queda abruptas de temperatura e chuvas intensas. Os preços dos cereais dispararam. Em Paris, em 1817, o preço do pão dobrava de valor. O Bloqueio Britânico e o Contra-bloqueio napoleônico tinham arruinado o comércio, causando desemprego. Havia fome na Europa em localidades como a Renânia, a Croácia, a Hungria, a Lombardia no norte da Itália, etc)
Neste cenário de depressão econômica, os pobres mendigavam ou roubavam ou iam às cidades em busca de alguma comida.

"Tinham, como disse um observador, a palidez da morte nas faces."
(página 39)

As pessoas tentavam sair da Europa. Em 1818, duas mil pessoas de Baden (Alemanha) foram para o Rio de Janeiro. Em 1817, vinte mil alemães e 30 mil franceses foram para os EUA.
Havia um incremento na morte por tifo, varíola, etc. À falta de higiene acrescentavam-se pessoas enfraquecidas pela fome, pedintes perambulando de cidade em cidade em busca de ajuda. A peste bubônica matou 12 mil pessoas nas Ilhas Baleares em 1820.
A partir de 1816, a falta de alimentos provocava revoltas populares. As revoltas eram causadas pela crise de subsistência, pela miséria maciça e pelo desemprego. Houve revoltas na Grã-Bretanha, nos Países Baixos, na França, na Prússia. Os Estados agiram para reprimi-las.
Em 1819, na Grã-Bretanha, 15 ingleses morreram em Saint Peter's Field (Manchester). A polícia inglesa dispersou uma maciça concentração popular a tiros. Esse evento ficou conhecido como PETERLOO, numa alusão jocosa à Batalha de Waterloo, em 1815, quando Napoleão foi definitivamente derrotado. 
Mas só a repressão não funcionava. Os Estados tentaram agir para atenuar a miséria do povo, mas naquele tempo eles não tinham recursos. O que houve então foi uma política para prevenir revoluções, revoltas. O fantasma da Revolução Francesa era onipresente. E além da repressão interna preventiva, externamente havia o temor de que a França viesse a, mais uma vez, criar problemas na Europa.

MEDIDAS PREVENTIVAS CONTRA REVOLUÇÕES:

Grã-Bretanha, Prússia, Rússia e Áustria acordaram entre si que, caso houvesse um evento revolucionário em algum lugar da Europa, agiriam prontamente para debelá-lo. A primeira ação conjunta deles se deu na volta de Napoleão ao poder, durante os cem dias após a sua fuga da ilha de Elba, finalizando com a Batalha de Waterloo. Essa primeira ação conjunta foi de caráter preventivo, que estabeleceu as bases para outras ações desse gênero no futuro. A ideia era que os Estados repressivos da época (Prússia, Áustria e Rússia) tinham que agir para recolocar o gênio da revolução de volta na garrafa da história.
Na década de 90 do Século XVIII a intervenção em assuntos internos de um país soberano (a França revolucionária) ocorreu também em caráter preventivo, ocasionada pelo medo da propagação das ideias democráticas (liberdade, igualdade, fraternidade) nascidas com a Revolução Francesa pelo resto da Europa, e em proteção à Maria Antonieta, irmã do então Imperador Austríaco, e ao Rei Luís XVI. 

NAPOLEÃO ESTAVA MORTO MAS AS IDEIAS DA REVOLUÇÃO FRANCESAS ESTAVAM VIVAS:

O medo de novas revoluções vinha da constatação de que as ideias trazidas pela Revolução Francesa tinham criado raízes em vários locais, principalmente nos países ocupados por Napoleão. As transformações feitas por Napoleão foram profundas. Napoleão causou um terremoto no Antigo Regime.
Exemplos:
1)Napoleão desprezava fronteiras estabelecidas há séculos. Criou um anel em torno de si, formado por Estados-Satélites, incluindo o Grão-Ducado de Varsóvia, o Reino da Itália e o Reino de Vestfália. 
2)Napoleão pôs fim ao Sacro Império Romano Germânico, que tinha sido criado no ano 800 d.C., por Carlos Magno. Extinguindo com o Sacro Império Romano Germânico em 1806, Napoleão mostrava que as fronteiras não eram imutáveis.
3)Napoleão ainda diminuiu o poder da Igreja Católica. Introduziu direitos iguais aos não-cristãos, em particular aos judeus.
4)Tribunais eclesiásticos e senhoriais foram substituídos por um sistema centralizado de uniformidade, administrado por uma burocracia judicial.
5)Pesos e Medidas, até certo ponto, foram padronizadas. E outras restrições ao movimento livre dos trabalhadores foram eliminadas.

"Napoleão levara mudanças a toda parte e, quando partiu para o seu exílio final em Santa Helena, em 1815, era evidente que muitas delas não podiam ser revogadas."
(página 49)



ANOTAÇÕES EXTRAÍDAS DA LEITURA DO LIVRO "A LUTA PELO PODER, EUROPA 1815-1914", DE RICHARD J. EVANS, EDITORA EDIÇÕES 70"



Império Persa Por que nos odeiam? Assírios Medos Ecbátana Estíages Ciro Persas Dario Zoroastro



POR QUE NOS ODEIAM?

O grego Heródoto, na cidade de Helicarnasso, atual Bodrum na Turquia, perguntava: Por que eles (aqueles que vem do leste, os persas) nos odeiam? Teria sido a destruição de Troia, cidade localizada na Ásia Menor, atual Turquia?

"Seu nome era Heródoto. Na condição de um grego natural do que é hoje o resort turco de Bodrum, então conhecido como Halicarnasso, cresceu nas bordas da Ásia. Por que, perguntou-se, as populações do Ocidente e do Oriente têm tanta dificuldade de conviver em paz?"
(página 15)

No momento em que Heródoto se indagava, uma nova ameaça começava a surgir na Ásia, nas planícies do que é o hoje o sul do Irã. Ali uma tribo iria partir para a conquista que iria do Mar Egeu à Índia. 
Em 480 a.C., Xerxes, um dos chefes dessa tribo, era o homem mais poderoso do mundo e a Grécia era apenas o nome de um local geográfico, no qual havia uma série de cidades-estados que não se davam bem umas com as outras. 
Apesar dessa rivalidade, os gregos viam-se como um único povo, compartilhando uma mesma língua, uma mesma cultura.
O Império Persa (já não era apenas uma tribo do sul do atual Irã) já tinha abocanhado cidades gregas naquilo que hoje é a Turquia Ocidental. Mas os Persas queriam mais. Queriam a própria Grécia, que ficava na Europa. Em 480 a.C., os Persas reuniram a maior força expedicionário já reunida e com ela tentaram invadir a Grécia. Mas os gregos resistiram e a repeliram. 
Quarenta anos após essa tentativa Persa de invadir a Grécia, Heródoto, o personagem citado acima, foi buscar razões para toda essa violência. Por que nos odiavam, perguntava Heródoto, a ponto de nos invadir com tantos soldados? 
Na verdade, nas guerras entre Gregos e Persas havia muita coisa em jogo. Exemplo: o desenvolvimento da democracia ateniense não teria ocorrido sob a dominação de um rei estrangeiro. E mais ainda: se a Grécia tivesse sido dominada pelo Império Persa, talvez nem o Ocidente, como o conhecemos, iria existir.
Termópilas, Maratona, Salamina ajudaram na criação do mito-fundador da Civilização Europeia.
O Império Persa, por sua vez, criou um Estado multiétnico, multicultural, que se estendia do Mar Egeu à Índia, dividindo para governar e garantindo a paz e a ordem para quem se deixasse submeter. 
Esse Império Persa foi paradigma para os próximos impérios que viriam a sucedê-lo, inclusive o Islâmico.

ESTRADA KHORASANIANA:

A estrada Khorasaniana transpunha a cadeia de Montanhas denominada ZAGROS. Essa cadeia montanhosa Zagros, por sua vez, separava duas regiões: na parte oeste, ficava a Mesopotâmia (atual Iraque). Na sua parte leste, ficava o Planalto iraniano (atual Irã).
Essa estrada, portanto, ligava a região do Crescente Fértil com o Irã e além dele (Afeganistão, etc)

ASSÍRIOS:

Era um povo guerreiro. Era um império comandado por reis guerreiros. Seus reis tinham que viver lutando, liderando seus homens na busca de novos territórios. A Civilização assíria tinha canais de irrigação, palácios e jardins. Vivia no que é hoje o norte do Iraque. Era uma civilização orgulhosa e sedenta por conquistas. Chegaram ao Egito mas queriam mais. Os assírios deslocavam populações inteiras de um lado para o outro; populações derrotadas que saíam de suas casas e eram realocadas em áreas desabitadas, de onde outras populações, também derrotadas pelos Assírios, já tinham sido realocadas em outra área. Assim, as populações derrotadas perdiam suas raízes. Suas principais cidades eram Nínive, Assur. A Assíria, regularmente, fazia expedições nas Montanhas Zagros para capturar membros de tribos locais, tornando-os escravos. Havia também incursões punitivas, para demover essas tribos que viviam nas Zagros de efetuarem ataques furtivos em cidades Assírias. Essas tribos também eram obrigadas a se submeter ao poder Assírio, pagando tributos na forma de cavalos, que iam para o exército Assírio (século VIII a.C.) Mas essas tribos começaram a se unir como forma de enfrentar os Assírios. As Montanhas Zagros ficaram mais arriscadas para as incursões dos Assírios em busca de escravos, em expedições punitivas ou para cobrar tributos.

ARYA - ARIANOS:

Povos nômades vindos das estepes do leste (Ásia Central). Da Ásia Central foram para as Montanhas Zagros.
Havia nas Montanhas Zagros tribos que se autodenominavam de ARYA (arianos). Arya significa nobre. Eram hábeis domadores de cavalos. Eram originalmente nômades. Com o tempo, tornaram-se sedentários, criando cidades.
Os Medos eram uma confederação de tribos arianas que residiam ao longo da Estrada Khorasaniana. Essa união tribal foi uma necessidade. Era necessária para fazer frente aos ataques assírios. E de uma defesa passou para o ataque. Os Medos passaram a atacar os Assírios. Nínive foi invadida e devastada (615 a.C. 612 a.C. - século VII). Os antigos algozes se tornaram vítimas. 

"um número infinito de mortos - eles avançavam pisando nos corpos."
(página 33)

Em 608 a.C., a grandiosidade da Assíria ficou para trás. No seu lugar entrou os Medos

A MÉDIA (MEDOS):

Essa nova força ficou com grande parte do espólio assírio. Seus reis eram meramente chefetes militares provisórios até alcançarem o status de terem derrotado os assírios. A Média emulou o comportamento dos assírios, passando a invadir áreas contíguas ao seu território. Daqui por diante, a Média iria invadir o norte da Síria e a Lídia (atual Turquia). Em 585 a.C., Astíages, rei dos Medos, fez um acordo com o rei da Lídia, estabelecendo a fronteira oeste de seu império no rio Hális.
A capital do reino Médio ficava em Ecbátana, que se localizava na Estrada Khorasaniana, no final da subida das Montanhas Zagros, antes do Planalto Iraniano. No controle dessa cidade, os Medos controlavam o comércio entre leste e oeste.

PERSAS: 

Os Medos superaram os Assírios. Agora os Persas iriam superar os Medos.
Medos e Persas eram arianos. Os Medos, ao olharem para os Persas, poderiam contemplar o seu próprio passado, formada por uma confederação de Clãs, um povo nômade, que eram excelentes cavaleiros.
Persas: Não se sabe se eram os mesmos, mas de toda forma, uma região que hoje situa-se no sul do Irã (costa do Golfo Pérsico), adotou o nome de Paarsa/Pérsia, a terra dos Persas. Essa nova tribo ariana, instalada na Paarsa, tinha já guerreado com os assírios no ano de 843 a.C..
O reino de Ciro, no início, era apenas um vassalo dos Medos. Na visão de Astíages, a Pérsia era um reino atrasado e que não lhe ameaçava. E foi por pensar assim que Astíages casou sua filha com o príncipe Persa. Astíages casou sua filha, Mandane, com o príncipe de um reino atrasado porque, num sonho, viu sua filha urinando sem parar, até causar a inundação do Reino da Média. O sonho foi interpretado como um alerta ao rei dos Medos, nos seguintes termos: qualquer filho de Mandane colocaria em risco o seu reino. Por esse motivo, Astíages se precaveu, da forma dele, casando sua filha com o príncipe de um reino sem importância.
Mas os sonhos não pararam por aí. Num segundo sonho, Astíages viu uma árvore crescendo por entre as pernas de sua filha. Essa árvore do sonho crescia sem parar, até cobrir toda a Ásia. Aterrorizado com essa visão, Astíages ordenou que o filho de Mandame fosse assassinado. 

"Como invariavelmente acontece nessas histórias, desobedeceram-lhe. Abandonado na encosta de uma montanha, o bebê foi encontrado e criado por um pastor; ou, talvez, dizem alguns, por um bandoleiro, ou quem sabe, até mesmo uma cadela, com as tetas, bem a propósito, transbordando de leite."
(página 34)

Enfim, esse bebê cresceria e tomaria o trono da Persa para si. E o nome desse bebê era Ciro. Independentemente de tais histórias serem verdadeiras ou não, a realidade é que os Persas derrotaram os Medos no campo de batalha.
Na Ásia era normal essa sucessão de reinos e impérios. Era uma selva onde o predador de hoje poderia ser o presa de amanhã. E a presa de ontem poderia se tornar o predador de hoje.

CIRO:

Em 559 a.C., Ciro sobe no Trono Persa. Ciro tornou-se líder dos Persas por ser o chefe da principal tribo, os AQUEMÊNIDAS (cidade de Pasárgada)
Em 550 a.C., Ciro derrota o rei dos Medos, Astíages. A vitória de Ciro contou com a ajuda de Harpago, comandante do exército de Astíages. Harpago traiu seu rei. 
O reino persa de Ciro tinha uma Corte, mas os persas não haviam se assentado completamente. Traziam ainda consigo muito daquilo que caracterizavam seus ancestrais que viveram nas estepes do Leste (cavaleiros em constante movimento em busca das melhores pastagens para os seus rebanhos).
Ciro tratou bem os derrotados Medos. Astíages passou a receber uma pensão. Ecbátana não foi destruída. Esse tipo de comportamento de Ciro trouxe os Medos para o seu lado. A partir de 550 a.C., os Persas mergulharam de cabeça na expansão de seu Império. Ao avançar para o oeste, Ciro derrotou o rei da Lídia, Creso. Ciro então entrou na capital da Lídia, Sardes, que ficava a três dias de jornada do mar Egeu (547 a.C.). Na sequência, Ciro alcançou o litoral do Mar Egeu, na Ásia Menor, atual Turquia. Cidades jônias do litoral foram conquistadas.
Com a Ásia Menor conquistada, Ciro voltou seus olhos para o Leste. Como um ariano, Ciro sabia o perigo representado pelas tribos nômades que viviam no Leste. Era necessário proteger o Planalto Iraniano e ir além, se possível. 

IMPÉRIO PERSA - EXPANSÃO PARA O LESTE:

A expansão para o leste foi exitosa. A Pérsia seria protegida pelas incursões da tribos nômades por meio de um arco que ia do Mar de Aral ao Indocuche (Indo-Kush), abrangendo a região da Sogdiana (atual Usbequistão) e a Bactriana (Gandara, Afeganistão, Paquistão). A expansão de Ciro parou no rio Jaxartes (Syr Daria). 

"Ciro, atravessando a monotonia das estepes, certamente não tinha a intenção de prosseguir até mais longe."
(página 44)

Estabelecida sua fronteira oriental, Ciro voltou seus olhos para o atual sul do Iraque. 

"as ricas terras planas do que é agora o sul do Iraque, indo da Assíria até o Golfo Pérsico, uma região de esplêndidas cidades, desde o alvorecer dos tempos."
(página 44)

O sul do Iraque foi conquistado por Ciro, sem maiores percalços. 
Ciro morreu no ano de 529 a.C..

"Nenhuma Império jamais for erguido em tais bases. Nenhum conquistador jamais praticara tanto e em tal extensão a clemência. Foi essa a genialidade de Ciro."
(página 46)

SUCESSÃO DE CIRO:

Ciro morreu. Quem iria sucedê-lo? Isso era um problema. Ele tinha 3 filhas e dois filhos. As filhas não eram o problema. Os filhos eram o problema: Cambises e Bardiya
Em vida, Ciro fez de Cambises um príncipe e de Bardiya governador da Báctria. Após a morte de Ciro, seus filhos acertaram um pacto entre si. Bardiya ficaria com a província de Báctria, enquanto Cambises seria o rei, sucedendo a seu pai. 
Com tudo acertado entre os irmãos, Cambises deu início à sua série de conquistas. A primeiras delas foi o Egito. Cambises tornou-se Faraó do Egito. Ele procurava mostrar respeito pela religião e pelos costumes egípcios. Com Cambises no Egito, a área central do Império Persa, no atual Irã, ficou acéfala. E quem dominasse a área central da Pérsia, dominaria o Império. Assim, na ausência de Cambises, nobres persas começaram a conspirar contra ele. Queriam fazer de Bardiya o novo Imperador. Esses nobres estavam cansados do jeito de governar de Cambises, que segundo eles era autoritário. Bardiya então deu início ao plano para derrubar o seu irmão (522 a.C.).

MORTE DE CAMBISES. ASCENSÃO DE DARIO:

Ao saber das tramas armadas contra ele, Cambises preparou um exército e deu início à sua marcha para o centro do seu Império, no atual Irã. Mas no caminho Cambises sofreu um acidente e morreu. Com a morte de Cambises, Bardiya tornou-se Imperador do Império Persa por direito e de fato. Mas seu reinado duraria pouco. Bardiya, para arrecadar dinheiro para o Tesouro Persa, confiscou os bens dos nobres que acompanhavam Cambises em sua marcha do Egito para o Irã. Entre os nobres expropriados em seus bens estava um sujeito que atendia pelo nome de DARIO. Dario teve o mérito de reunir em torno de si outros nobres que também tinham sido expropriados por Bardiya. 

"Dario era um primo distante do rei, (...), tinha apenas 28 anos."
(página 52)

"Dario era o carregador de lança de Cambises."
(página 52 )

"Assim, o título do jovem Dario, longe de implicar uma condição servil, era uma honra esplêndida e prestigiosa. O status na corte persa era conferido exclusivamente pela proximidade em relação à pessoa real."
(página 52)

Dario também era do clã Aquemênida, a mesma de Ciro. 
Enfim, Dario assumiria o comando do Regicídio (novembro de 522 a.C.) que acabaria por matar Bardiya e que o colocaria no trono persa.
No período de 1 anos, os dois filhos de Ciro estavam mortos.
Os Regicidas esconderam-se atrás da história dizendo que o verdadeiro Bardiya já estaria morto há muito tempo. Teria sido morto pelo próprio Cambises. O homem que agora estava no trono da Pérsia era um impostor, se fazendo passar pela figura de Bardiya, por meio da magia. Ninguém na Pérsia ousou contraditar essa história, com medo de sofrer represálias.
Com essa história, os conspiradores não seriam vistos como regicidas, mas como aqueles que livraram o trono da Pérsia de um impostor.
E isso não era pouca coisa, pois manter um impostor no Trono da Pérsia colocaria em perigo a própria existência do cosmos, do Universo.

ZOROASTRISMO E A ASCENSÃO DE DARIO AO TRONO PERSA:

Os persas acreditavam que o Deus Ahura Mazda, ao criar o Universo, tinha criado ARTA, a verdade, e Drauga, a mentira. Verdade e Mentira estavam em constante conflito. A Verdade era quem garantia a ordem no funcionamento do Universo, que por sua vez garantia a existência da vida. Já Drauga, representante da Mentira, era o caos, a desordem. 
Os conspiradores então tinham tirado um mentiroso do trono persa, um mago que se fazia passar por Bardiya. Com isso, Dario e seus amigos tinham restaurado a verdade e, por tabela, a ordem no Universo.
Por fim, Dario, como líder da conspiração e na ausência de um outro nome, assumiu o trono persa.

ZOROASTRO:

Zoroastro era o profeta do povo ariano (medos, persas, etc). Via o mundo como um palco no qual as forças do mal e do bem estavam em constante luta. A verdade (bem) e a mentira (mal) estavam em constante luta. 
Essa luta alcançaria um momento final com a vitória da verdade sobre toda a falsidade, sob o olhar do Deus Ahura Mazda, estabelecendo na Terra um reino de Paz. Ainda segundo os ensinamentos de Zoroastro, a VERDADE era representada pelas chamas do fogo, que se fazia acompanhar pela fumaça negra, que representava a mentira (drauga), representando assim a eterna briga entre a verdade e a mentira. 
Dario, buscando unir seu poder à religião (Zoroastrismo), construiu templos consagrados ao fogo. Dario, de fato, sendo um regicida e um golpista, buscou legitimar seu poder com o auxílio da religião. Dario não era filho de Ciro, por isso usava a religião para forçar a ideia de que seria pelo menos o representante na terra do Deus Ahura Mazda. 

ANOTAÇÕES EXTRAÍDAS DO LIVRO "FOGO PERSA", O primeiro Império Mundial e a Batalha pelo Ocidente. Tom Holland, Editora Record, páginas 13/63)


quarta-feira, 18 de março de 2020

A Peste no Século VI d.C. Persas versus Constantinopla Séculos VI e VII Persas e Constantinopla versus Islã



A PESTE BUBÔNICA (SÉCULO VI d.C.):

A desordem precedeu a ascensão do islã. A peste bubônica criou um tumulto na esteira da qual mortes e mais mortes se abateram sobre a região que era então o centro do mundo (Constantinopla, Pérsia, China e Egito). Isso aconteceu no século VI d.C..

"...as portas das casas haviam sido deixadas abertas, sem ninguém para guardar o ouro, a prata e objetos de valor dentro deles." O CORAÇÃO DO MUNDO, Uma nova história universal a partir da Rota da Seda: O encontro do oriente com o ocidente, de Peter Frankopan, Editora Crítica, página 85

"...com 10 mil pessoas sendo mortas por dia em Constantinopla, a certa altura de meados da década 540 d.C."O CORAÇÃO DO MUNDO, Uma nova história universal a partir da Rota da Seda: O encontro do oriente com o ocidente, de Peter Frankopan, Editora Crítica, página 85

A peste impactou negativamente a economia, resultando em menos mão de obra, menos consumidores. A peste também impactou negativamente o Império Bizantino, que durante o século VI ia retomando territórios no norte da África e na Itália. O tesouro bizantino já ia mal (gastos com guerras; comprando boas relações com vizinhos irascíveis, etc) e piorou com a superveniência da peste bubônica. 

RIVALIDADE ENTRE O IMPÉRIO PERSA E CONSTANTINOPLA (SÉCULOS VI E VII d.C.):

Para tumultuar ainda mais o ambiente na Ásia, Constantinopla e Pérsia retomaram as hostilidades entre si durante o século VI d.C.. Com o início do século VII as hostilidades entre Pérsia e Constantinopla não cessam. No ano de 609 os Persas capturaram a cidade de Edessa (atual Turquia). Antioquia (610) e Damasco, na atual Síria, no ano de 613, são outras aquisições Persas. 

PERDA DE JERUSALÉM PARA OS PERSAS E O CERCO DE CONSTANTINOPLA:

No ano de 614 d.C., Constantinopla perde a cidade de Jerusalém para os Persas. A expansão Persa é imparável. No ano de 619, Alexandria, no Egito, é conquistada. No ano de 626, os exércitos do Império Persa podiam avistar de seus acampamentos os Muros que guarneciam a cidade de Constantinopla. 

"O fim estava próximo e parecia absolutamente inevitável."
(página 91)

Nessa altura dos acontecimentos, o Imperador Bizantino era Heráclio. E a sorte sorriu para ele e para seus súditos, pois os Persas e seus aliados avaros ( nômades das estepes, que avançavam do norte, penetrando pelos Balcãs) começaram a perder o ímpeto. A expansão dos Persas tinha exigido recursos demais do Império e por essa razão tiveram que recuar. Constantinopla se salvou.

CONTRA-ATAQUE ROMANO:

Constantinopla contra-atacou. Heráclio usou a religião para estimular seus soldados na reconquista dos territórios perdidos. Em 627, Constantinopla derrotou os Persas em Nínive, no atual norte do Iraque. Em 630 Jerusalém foi reconquistada. Os cristãos orientais residentes em Jerusalém tiveram que jurar fidelidade ao cristianismo ortodoxo de Constantinopla, tendo que abandonar os ensinamentos do cristianismo oriental, que tinham como centro propagador clérigos que viviam na Pérsia. A vitória de Constantinopla no campo de batalha deveria ser a prova irrefutável de que o Cristianismo Ortodoxo era o único avalizado por Deus. Heráclio, tomado pela euforia, sonhava levar o Cristianismo Ortodoxo de Constantinopla para o resto da Ásia. Mas nesse exato momento de glória para Constantinopla, um novo ator surgia, vindo da Península Arábica: o Islã!

O ISLÃ PEDIA PASSAGEM: 

O sudoeste da Península Arábica era um caldeirão onde fermentavam as disputas protagonizadas por Pérsia e Constantinopla. Bizantinos e Persas procuravam cultivar clientes entre as tribos que habitavam a Península Arábica. Bizantinos e Persas tinham se aproveitado da desunião dessas tribos, manipulando-as, jogando-as umas contra as outras, fazendo-as de aliadas contra seu inimigo. Mas com a ascensão de Maomé, a desunião virou união, a fraqueza virou força e os árabes, de joguetes nas mãos de Persas e Bizantinos, passaram a ser eles mesmos os senhores de seu destino.

SÓ HÁ UM DEUS E MAOMÉ TINHA SIDO ESCOLHIDO COMO SEU MENSAGEIRO:

Os povos que habitavam a Península Arábica eram politeístas. Cada tribo árabe tinha seus próprios deuses. Com o tempo o Politeísmo perdeu terreno para o Monoteísmo. Só havia um Deus em torno do qual os árabes, desunidos no passado, se uniram. E o profeta desse único Deus era Maomé. A ideia de que havia um só Deus levou à união daqueles que no passado viviam brigando entre si. A união fez a força dos árabes. E essa força levou à expansão do islamismo, da Espanha aos confins da Ásia. 

MAOMÉ:

Maomé foi o escolhido como o mensageiro de Deus. Maomé recitava as mensagens de Deus, que ficariam registradas no Corão. Maomé surgiu numa época caracterizada por uma depressão econômica, causada pela guerra entre Constantinopla e Pérsia. Essa guerra prejudicou o comércio que era feito na Península Arábica. Os árabes foram prejudicados.

"O confronto e a efetiva militarização de Roma e Pérsia tiveram importante impacto sobre o comércio que se originava no Hijaz ou passava por ele. Com gastos do governo canalizados para o exército e a crônica pressão na economia doméstica para apoiar o esforço de guerra, a demanda por bem de luxo caíra consideravelmente."
(página 95)

Naquele cenário de retração econômica, as palavras de Maomé encontraram um terreno fértil. Maomé prometia o paraíso para quem o seguisse. Naquele mundo conturbado e áspero, deixar-se levar por uma pregação que prometia um outro mundo, muito melhor do que aquele no qual viviam, era tentador, era sedutor. 

"A salvação espiritual traria recompensas econômicas."
(página 96)

"Os árabes estavam sendo apresentados à sua própria religião, que criava uma nova identidade."
(página 97)


EXPANSÃO ISLÂMICA:

A união entre interesses econômicos e religiosos foi a força por trás da qual a expansão islâmica se concretizou. A palavra de Deus era difundida simultaneamente com os saques e as pilhagens. Os infiéis eram expropriados de seus bens, que iam para os fiéis islâmicos. A palavra de Deus era difundida e os guerreiros eram recompensados com os bens conseguidos por meio de saques. Foi inclusive criado um escritório (diwan) para a organização da repartição daquilo que era saqueado dos infiéis.

"Uma fração de 20% era dada ao líder dos fiéis, o Califa, mas a maior parte era distribuída entre seus apoiadores e aqueles que haviam participado dos ataques bem-sucedidos." 
(página 99)

Jerusalém foi conquistada pelos muçulmanos em meados da década de 630. Constantinopla e o Império Persa sofriam derrotas nas mãos dos muçulmanos. A capital Persa, Ctesifonte (atual Iraque), foi tomada pelos árabes, que saquearam seu tesouro. 

CONCÓRDIA ENTRE ISLÃ, CRISTÃOS E JUDEUS:

O Islã se via como um herdeiro da tradição monoteísta inaugurada por judeus e pelos cristãos. Havia apenas um Deus, que de tempos em tempos fazia conhecer as suas palavras. Para tanto, ele se valeu de Moisés, de Jesus e de Maomé. 

"Em outras palavras, os profetas do judaísmo e do cristianismo eram os mesmos do islã"
(página 106)

Os muçulmanos falavam sobre a Umma, uma comunidade de fiéis que deveria unir toda a comunidade. Eventualmente havia dissensões nessa comunidade (Umma), resultando no aparecimento de judeus e cristãos. Mas a ideia do Corão era no sentido de que "não descriminemos nenhum deles." (página 106)

"Na realidade, o islã parecia tão próximo que alguns eruditos cristãos achavam que seus ensinamentos eram não tanto os de uma nova fé como uma interpretação divergente do cristianismo. Para João de Damasco, um dos principais cronistas da época, o islã era uma heresia cristã, mais do que uma religião á parte. Maomé, escreveu ele, tinha surgido com ideias baseadas em sua leitura do Antigo e Novo Testamentos - e com uma conversa com um monge cristão itinerante."
(página 112)

As conquistas árabes não foram brutais. A população cristã continuava com suas igrejas na Síria e na Palestina. A mudança era de senhorio. Agora o imposto deveria ser pago ao Califa e não mais ao Imperador de Constantinopla. 

"A coabitação dessas diferentes formas de fé (cristianismo, zoroastrismo, judaísmo e islamismo) foi uma marca dos primórdios da expansão islâmica - e parte importante de seu sucesso."
(página 109)

A expansão árabe agora seguia para o Egito e para o restante da Pérsia, derrubando a dinastia Sassânida. Na esteira da expansão muçulmana, muitas cidades foram criadas, como Fustat no Egito e Kufa no Eufrates (atual Iraque). Na Europa, a expansão islâmica foi detida por Carlos Martel, entre Poitiers e Tours (320 km de Paris), no ano de 732. A Europa Ocidental poderia ter se tornado muçulmana. O autor deixa subentendido que os muçulmanos não insistiram na conquista da Europa porque ela não era economicamente atraente. Havia troféus mais valiosos na Ásia. Mas de toda forma, a Europa sofreu com a ascensão do Islã. Atenas e Corinto, na atual Grécia, diminuíram de tamanho. O comércio no mediterrâneo contraiu-se drasticamente. O comércio na Europa tornou-se apenas local.

BRIGAS DENTRO DO ISLÃ:

Quem iria suceder Maomé? Qual era com exatidão a mensagem recebida por Maomé? Tudo seria compilado no Corão, no final do século VII. Essa desavenças internas de quem seria o guardião da palavra de Deus respingou naqueles que não eram muçulmanos. Novas regras endureceram a vida dos infiéis. E mais: depois de vencerem no campo de batalha, agora os muçulmanos queriam converter a população local ao islã.

EXPANSÃO DO ISLÃ PARA A ÁSIA CENTRAL:

As cidades iam sendo conquistadas: Samarcanda (atual Usbequistão), Panjikent (atual Tadjiquistão), Balkh (atual Afeganistão). Em 751 um exército árabe derrotou um exército chinês, no rio Talas, na Ásia Central. Com essa derrota, os chineses recuaram para o seu território, abandonando a Ásia Central. Aproveitando-se disso, o povo uigure passou a construir cidades no que hoje é o Quirguistão. 

DIVISÕES DENTRO DO ISLÃ:

No início do século X, havia 3 centros de poder:

a)Córdoba, na atual Espanha
b)Egito
c)Bagdá

BAGDÁ:

"Bagdá iria se tornar a mais rica e populosa do mundo."
(página 115)

O apetite de Bagdá por produtos luxosos era insaciável. Importavam, por exemplo, seda e peças de cerâmica da China; doces do Egito; figos sírios; pistache de Nishapur. No século VIII o papel chegou da China. Havia um tráfego intenso de navios no Golfo Pérsico. Riquezas eram construídas. Bagdá era o centro do mundo (séculos VIII, IX e X). Em Bagdá a cultura era patrocinada por mecenas locais. O estudo era valorizado, buscando-se conhecimento, onde quer que ele se encontrasse (Índia, Constantinopla, etc). 

Havia ainda uma outra divisão, entre Xiitas e Sunitas. Xiitas diziam que apenas os descendentes de Ali (primo e genro de Maomé) podiam ser califas. Já os sunitas defendiam uma interpretação mais ampla, menos radical. 

"Portanto, embora houvesse em tese uma unidade religiosa abrangente que ligava o Indocuche (Indo-Kush - Afeganistão) aos Pireneus (Espanha), passando pela Mesopotâmia (Iraque) e pelo norte da África, encontrar um consenso era outra questão."
(página 122)

RESUMO:

Enquanto os dois grandes impérios dos séculos VI e VII, Persa e Constantinopla, brigavam entre si, 
das profundezas da Península Arábica, a partir do Hejaz (Meca e Medina), uma força se preparava para criar um dos maiores impérios da História, sob a religião islâmica.

Anotações extraídas da leitura do Livro O CORAÇÃO DO MUNDO, Uma nova história universal a partir da Rota da Seda: O encontro do oriente com o ocidente, de Peter Frankopan, Editora Crítica.


A Rota das Peles Vikings Rus Pais da Rússia



RIQUEZA MUÇULMANA. CRIAÇÃO DE NOVAS ROTAS COMERCIAIS:

A riqueza do mundo muçulmano impulsionou a criação de novas rotas comerciais. Havia demanda por novos produtos e havia dinheiro para comprá-los. As novas rotas estavam no norte, nas estepes, habitadas por tribos nômades (pechenegues, ghuzz, etc). Essa tribos possuíam grandes rebanhos, por esse motivo estavam sempre em movimento, estavam sempre em deslocamento, montando e desmontando acampamentos, sempre em busca de melhores pastos para seus animais (cavalos, cabras, etc)
O Império Islâmico adquiria esses novos produtos como o mel, a cera, o âmbar, etc. Mas o principal produto que vinha dessa nova rota comercial do norte era a Pele. Peles de animais (zibelina, vison, raposa, esquilo cinza, etc). Surgiu uma Rota de Peles, ligando as estepes do Norte ao rico mundo muçulmano no sul.
Tínhamos então nômades do norte (norte do Mar Negro, margens do Rio Volga e além) comerciavam produtos diversos com os ricos muçulmanos sedentários do sul.
Cidades mais próximas das estepes se aproveitaram desse comércio e enriqueceram. Exemplos: Merv (Ásia Central), Balkh (Afeganistão). 
Fora do mundo muçulmano acontecia o mesmo. Tribos mais bem localizadas, perto da riqueza do Mundo Muçulmano, enriqueciam. Isso acabou aumentando a rivalidade entre as tribos das estepes, que já competiam normalmente pelos melhores pastos, melhores fontes de água, etc.

"Isso estava fadado a produzir uma de duas reações: ou as tensões ficavam maiores, resultando em uma violenta fragmentação, ou haveria uma consolidação no interior e entre as tribos. A opção era lutar ou cooperar."
(página 131)

A riqueza do mundo muçulmano despertou a cobiça dos povos das estepes. No futuro essa cobiça iria se transformar em invasões, sob Gengis Khan e seus descendentes. A riqueza do mundo muçulmano (Pérsia, Mesopotâmia, Afeganistão, Egito, etc) estimulava a economia além de suas fronteiras, fazendo com que empreendedores fossem, por exemplo, atrás de peles no norte da Eurasia, criando assim novas rotas comerciais, criando riquezas, criando cidades espetaculares, fortalecendo as tribos das estepes mais empreendedoras. O problema é que essa mesma riqueza acabaria atraindo contra si a cobiça dessas mesmos tribos nômades, que com o passar do tempo não iriam se contentar em sua posição de meros intermediários, meros comerciantes de peles ou cavalos para os povos sedentários do mundo muçulmano.

"O surgimento de uma rota de peles nas estepes e nas faixas de florestas ao norte foi resultado direto de um surto de riqueza disponível nos séculos que se seguiram às grandes conquistas islâmicas nos séculos VII e VIII."
(página 130)

DE NÔMADES A SEDENTÁRIOS: OS CAZARES:

De momento, as estepes se acomodaram nessa condição de intermediários. Um exemplo disso era o grupo túrquico chamado Cazares (norte do Mar Negro e do Mar Cáspio). Os Cazares conseguiram unir em torno de si outras tripos, criando assim alguma estabilidade nas estepes.
Os cazares se tornaram importantes porque conseguiram obstar o avanço muçulmano. Esse feito serviu até para atrair a atenção de Constantinopla, que passou a ver nos Cazares uma opção de aliança contra os muçulmanos. Até casamentos foram celebrados entre a elite da casa governante de Cazaria com membros da família imperial bizantina. O crescimento dos Cazares levou a sua estratificação, com a criação de elites e ainda ajudou na atração de outras tribos, que viraram vassalas desse novo poder, pagando tributos à Casa governante de Cazaria. O líder Cazan, o Khagan, tinha 25 esposas, escolhidas cada uma delas de 25 tribos distintas, de forma a criar uma aliança dessas tribos com o Khagan. Antes nômades, os cazares e seus clientes, em razão da estabilidade conquistada e do comércio que exerciam, acabaram se tornando sedentários. Cidades foram construídas, uma delas às margens do Rio Volga, Atil. No início do século X o próprio líder Khagan se estabeleceu em Atil. 
Na sociedade dos Cazares havia muçulmanos, cristãos, pagãos (Deus Tengri) e judeus. Cristãos, judeus e muçulmanos desejavam atrair o povo Cazar para a sua fé. Constantinopla chegou a mandar uma delegação para tentar converter os Cazares para o seu Cristianismo, chefiada por Cirilo, que iria ficar conhecido por ser o criador do alfabeto eponimo (cirílico) para os eslavos.
No final, o líder dos Cazares escolheu o judaísmo para o seu povo.

OS ESCANDINAVOS (RUS) 

Não foi só as peles que vieram do norte. Do norte também vieram os Escandinavos, que eram chamados de "rus", em razão de serem remadores ou por causa da cor de seu cabelo). Os escandinavos ligaram o Mar Báltico, no norte, aos mares Negro e Cáspio, descendo pelos rios Volga, Dnieper, Oder, Neva, etc.

"Eles foram os país da Rússia."
(página 137)

Foi a riqueza muçulmana que atraiu os Vikings. Cidades foram criadas por eles, como por exemplo Novgorod. 

"Foi a atração pelo comércio e riquezas do mundo islâmico que estimulou de início (século IX) os vikings a partirem para a jornada rumo ao sul."
(página 137)

"Os Vikings estavam envolvidos no comércio de cera, âmbar e mel, assim como no de espadas refinadas, muito admiradas no mundo islâmico."
(página 138)

Mas a mais importante mercadoria despachada para o sul era formada por escravos. Para o norte, em forma de pagamento, iam tecidos e moedas de prata.

OBSERVAÇÃO:

As peles eram usadas como moeda de troca nas estepes. Elas eram trocadas por dinheiro ou por algum outro produto. 
"Peles de esquilo de dezoito anos valiam uma moeda de prata, enquanto uma pele inteira tinha o preço de um grande filão de magnífico pão, suficiente para sustentar um homem grande."
(página 130)

"ter um meio de troca era importante para sociedades que interagiam entre si mas não possuíam um tesouro central capaz de supervisionar a cunhagem de moedas em larga escala."
(página 130)

Anotações extraídas da leitura do Livro O CORAÇÃO DO MUNDO, Uma nova história universal a partir da Rota da Seda: O encontro do oriente com o ocidente, de Peter Frankopan, Editora Crítica.

A Rápida Expansão do Islamismo no Século VII d.C. Colaboração de Judeus e Cristãos



FATORES QUE EXPLICAM O RÁPIDO AVANÇO DO ISLÃ:

- Colapso do Império Persa, que estava exaurido pelas guerras contra Constantinopla
- Maomé tinha o apoio das elites de Meca
- A expansão do Islã combinava o ganho material (butim, pilhagens) com o proselitismo religioso
- Num primeiro momento, aceitação por parte dos cristãos e dos judeus que viviam nas áreas conquistadas pelos islãmicos
- Proselitismo: Em Bucara (Buckara), no atual Usbequistão, durante o século VIII, o governante local, objetivando trazer pessoas para o islã, anunciou que todos aqueles que comparecessem à oração de Sexta-Feira receberiam uma soma em dinheiro. Era um incentivo que atraia as pessoas para uma nova religião, o Islã.

O Islã, no início de sua expansão, tinha relações pacíficas com judeus e com cristãos. Nada parecido com o que acontece atualmente. Os islâmicos buscavam estabelecer uma relação de concórdia com os cristãos.

"Os esforços para uma concórdia com os cristãos eram complementados por uma política de proteção e respeito pelos Povos do Livro - ou seja, judeus e cristãos. O Corão deixa claro que os primeiros muçulmanos viam a si mesmos não como rivais daquelas duas fés, mas como herdeiros da mesma tradição: as revelações de Maomé haviam sido previamente reveladas a Abraão e Ismael, a Isaac e Jacó e às tribos. Deus também havia confiado as mesmas mensagens a Moisés e Jesus. 'Não discriminamos nenhum deles', diz o Corão. Em outras palavras, os profetas do judaísmo e do cristianismo eram os mesmos do islã."
("O CORAÇÃO DO MUNDO", Uma Nova História Universal a partir da Rota da Seda: O Encontro do Oriente com o Ocidente, Peter Frankopan, Editora Crítica, página 106)

Os Judeus viam nos árabes muçulmanos uma chance para obter a liberdade do domínio romano (Constantinopla). 

"Na verdade, o relacionamento entre o islã e o judaísmo era ainda mais notável por sua mútua compatibilidade. O apoio dos Judeus no Oriente Médio foi vital para a propagação e a difusão da palavra de Maomé."
("O CORAÇÃO DO MUNDO", Uma Nova História Universal a partir da Rota da Seda: O Encontro do Oriente com o Ocidente, Peter Frankopan, Editora Crítica, página 101)

"Quando Maomé foi encurralado em Yathrib, no sul da Árabia na década de 620, solicitar a ajuda dos judeus foi uma de suas principais estratégias. Era uma cidade - e uma região - impregnada de judaísmo e de história judaica. Apenas um século antes, um judeu fanático, governante de Himyar, havia comandado uma sistemática perseguição à minoria cristã, o que cristalizou um amplo padrão de alianças que ainda resistia firmemente: a Pérsia passara a apoiar os habitantes da cidade contra a aliança de Roma e Etiópia. Maomé estava ansioso pela conciliação com os judeus do sul da Árabia - e começou pelos mais velhos de Yathrib. Judeus importantes da cidade, mais tarde nomeada Medina, comprometeram-se a apoiar Maomé em troca de garantias de defesa mútua. Estas foram registradas num documento formal que declarava que sua fé e suas posses seriam respeitadas agora e no futuro pelos muçulmanos."
("O CORAÇÃO DO MUNDO", Uma Nova História Universal a partir da Rota da Seda: O Encontro do Oriente com o Ocidente, Peter Frankopan, Editora Crítica, página 102)


Os cristãos, por sua vez, sentiam-se incomodados com o Imperador de Constantinopla, Heráclio, que queria impor o cristianismo de Constantinopla a eles. Os cristãos não eram um todo unido. Havia muitas discussões doutrinárias que criavam tipos diferentes de cristianismo. O Cristianismo de Constantinopla era um. O Cristianismo oriental (Palestina, Síria, Pérsia, etc) era outro. Como exemplo podemos citar a celeuma a natureza de Jesus Cristo. Jesus Cristo era somente humano ou era humano e divino? O Islã teve a sorte de pegar uma comunidade cristã desunida.


Anotações extraídas da leitura do Livro "O CORAÇÃO DO MUNDO", Uma Nova História Universal a partir da Rota da Seda: O Encontro do Oriente com o Ocidente, Peter Frankopan, Editora Crítica, páginas 101/123)