quinta-feira, 19 de março de 2020

Depois de Napoleão Bonaparte Mito Bonapartismo Medidas Preventivas contra Revoluções Napoleão estava morto mas as ideias da Revolução Francesa estavam viva



DEPOIS DE NAPOLEÃO. O BONAPARTISMO:

Napoleão foi derrotado definitivamente em 18 de junho de 1815, na Batalha de Waterloo. Napoleão foi exilado na ilha de Santa Helena, onde veio a morrer em 1821.
Nos últimos cem dias (fuga da ilha de Elba até a Batalha de Waterloo) que ficou no poder, Napoleão tentou vestir a roupagem de um liberal. Nesses cem dias, Napoleão prometia paz ao mundo e valores liberais para os franceses. Tinham acabado os tempos de conquistas militares.
O mito do Napoleão Bonaparte liberal cultivado em seus 100 dias de retorno ao poder deu origem ao vocábulo BONAPARTISMO. 
O Bonapartismo se diferenciava do Republicanismo, pois o primeiro tinha ênfase na figura de uma liderança forte e na glória militar, enquanto que o Republicanismo dava ênfase ao sufrágio universal para os homens, para a burocracia estatal eficiente, para a adoção de referendos, plebiscitos e o Estado deveria tratar todas as pessoas de forma igual.

NAPOLEÃO E O USO DE UM GOLPE MILITAR PARA SE ALCANÇAR O PODER POLÍTICO:

A ideia de um golpe militar como forma de se alcançar o poder político transitava normalmente pelas mentes dos franceses. Essa ideia era inspirada pelo Golpe de Estado Militar de Napoleão de 18 de Brumário (9/11/1799), que derrubou o Diretório Revolucionário e elevou Napoleão à posição de 1º Cônsul e o levou depois a estabelecer o 1º Império Francês em 1804. As pessoas, inspiradas pelo golpe dado por Napoleão em 1799, sonhavam que os Regimes da Restauração, que eram repressivos e que queriam voltar para antes de 1789 (Antigo Regime), poderiam ser derrubados por um novo golpe, dando lugar a um regime Liberal. 
Os poloneses e os irlandeses inspiravam-se em Napoleão. Simon Bolívar, na América Latina, via em Napoleão um herói.
Enfim, Napoleão, o golpista, o Imperador, tinha se tornado um Mito, servindo de símbolo para as pessoas que queriam lutar pela derrubada de regimes opressivos, lutando contra a dominação colonial para no fim implantarem um regime liberal e constitucional.


CONSEQUÊNCIAS DAS GUERRAS NAPOLEÔNICAS:

Jakob Walter, um pedreiro alemão, recrutado pelo Estado fantoche francês de Vurtemberga (Wurttemberg) para o exército francês que seguiria para Rússia, foi e conseguiu voltar vivo à sua casa. Jakob foi porque não tinha alternativa, senão obedecer. Jakob era indiferente à política, à França; não odiava os russos; era indiferente ao Estado fantoche francês de Wurttemberg. Jakob Walter também não tinha interesse pelo resultado das guerras napoleônicas.
Quase 1/4 de século de guerras (a partir de 1789) havia deixado a população cansada. Jakob Walter queria apenas sobreviver. Outro compromisso dele era com a Fé Católica, que o sustentava em meio ao sofrimento.
Seiscentos e oitenta e cinco mil soldados (italianos, franceses, alemães e poloneses) invadiram a Rússia em 1812. Menos de 70 mil regressaram. Jakob Walter foi um dos que regressou. Quatrocentos mil foram mortos e 100 mil feitos prisioneiros (número desconhecido de isolados e desertores).
Em 1814 os aliados ocuparam Paris e Napoleão Bonaparte foi exilado na Ilha de Elba.
No período compreendido entre 1789 e 1815 cinco milhões de pessoas morreram. Moscou, a capital da Rússia, foi incendiada, entre 7 mil e 9 mil casas foram destruídas pelo fogo, além de 8 mil lojas e armazéns. Não havia como compensar todas essas perdas.
A Espanha também sofreu sob a ocupação francesa. Houve pilhagens, carnificinas. A Renânia, na Alemanha, sofreu com a requisições do Exército francês. Em Aachen (oeste da Alemanha), habitantes morriam de fome. Exércitos tinham que viver da terra na qual estava estacionados ou passando por ela. Daí as requisições, quando não as pilhagens, os saques. Era preciso alimentar milhares de soldados e os animais, como por exemplo, a cavalaria que puxava as peças de artilharia.

PERÍODO IMEDIATAMENTE POSTERIOR AO ENCERRAMENTO DAS GUERRAS NAPOLEÔNICAS (1815/1820):

Se não bastassem os danos causados pelas guerras napoleônicas, mudanças climáticas causadas pela erupção de vulcões causaram danos à produção agrícola europeia. Havia queda abruptas de temperatura e chuvas intensas. Os preços dos cereais dispararam. Em Paris, em 1817, o preço do pão dobrava de valor. O Bloqueio Britânico e o Contra-bloqueio napoleônico tinham arruinado o comércio, causando desemprego. Havia fome na Europa em localidades como a Renânia, a Croácia, a Hungria, a Lombardia no norte da Itália, etc)
Neste cenário de depressão econômica, os pobres mendigavam ou roubavam ou iam às cidades em busca de alguma comida.

"Tinham, como disse um observador, a palidez da morte nas faces."
(página 39)

As pessoas tentavam sair da Europa. Em 1818, duas mil pessoas de Baden (Alemanha) foram para o Rio de Janeiro. Em 1817, vinte mil alemães e 30 mil franceses foram para os EUA.
Havia um incremento na morte por tifo, varíola, etc. À falta de higiene acrescentavam-se pessoas enfraquecidas pela fome, pedintes perambulando de cidade em cidade em busca de ajuda. A peste bubônica matou 12 mil pessoas nas Ilhas Baleares em 1820.
A partir de 1816, a falta de alimentos provocava revoltas populares. As revoltas eram causadas pela crise de subsistência, pela miséria maciça e pelo desemprego. Houve revoltas na Grã-Bretanha, nos Países Baixos, na França, na Prússia. Os Estados agiram para reprimi-las.
Em 1819, na Grã-Bretanha, 15 ingleses morreram em Saint Peter's Field (Manchester). A polícia inglesa dispersou uma maciça concentração popular a tiros. Esse evento ficou conhecido como PETERLOO, numa alusão jocosa à Batalha de Waterloo, em 1815, quando Napoleão foi definitivamente derrotado. 
Mas só a repressão não funcionava. Os Estados tentaram agir para atenuar a miséria do povo, mas naquele tempo eles não tinham recursos. O que houve então foi uma política para prevenir revoluções, revoltas. O fantasma da Revolução Francesa era onipresente. E além da repressão interna preventiva, externamente havia o temor de que a França viesse a, mais uma vez, criar problemas na Europa.

MEDIDAS PREVENTIVAS CONTRA REVOLUÇÕES:

Grã-Bretanha, Prússia, Rússia e Áustria acordaram entre si que, caso houvesse um evento revolucionário em algum lugar da Europa, agiriam prontamente para debelá-lo. A primeira ação conjunta deles se deu na volta de Napoleão ao poder, durante os cem dias após a sua fuga da ilha de Elba, finalizando com a Batalha de Waterloo. Essa primeira ação conjunta foi de caráter preventivo, que estabeleceu as bases para outras ações desse gênero no futuro. A ideia era que os Estados repressivos da época (Prússia, Áustria e Rússia) tinham que agir para recolocar o gênio da revolução de volta na garrafa da história.
Na década de 90 do Século XVIII a intervenção em assuntos internos de um país soberano (a França revolucionária) ocorreu também em caráter preventivo, ocasionada pelo medo da propagação das ideias democráticas (liberdade, igualdade, fraternidade) nascidas com a Revolução Francesa pelo resto da Europa, e em proteção à Maria Antonieta, irmã do então Imperador Austríaco, e ao Rei Luís XVI. 

NAPOLEÃO ESTAVA MORTO MAS AS IDEIAS DA REVOLUÇÃO FRANCESAS ESTAVAM VIVAS:

O medo de novas revoluções vinha da constatação de que as ideias trazidas pela Revolução Francesa tinham criado raízes em vários locais, principalmente nos países ocupados por Napoleão. As transformações feitas por Napoleão foram profundas. Napoleão causou um terremoto no Antigo Regime.
Exemplos:
1)Napoleão desprezava fronteiras estabelecidas há séculos. Criou um anel em torno de si, formado por Estados-Satélites, incluindo o Grão-Ducado de Varsóvia, o Reino da Itália e o Reino de Vestfália. 
2)Napoleão pôs fim ao Sacro Império Romano Germânico, que tinha sido criado no ano 800 d.C., por Carlos Magno. Extinguindo com o Sacro Império Romano Germânico em 1806, Napoleão mostrava que as fronteiras não eram imutáveis.
3)Napoleão ainda diminuiu o poder da Igreja Católica. Introduziu direitos iguais aos não-cristãos, em particular aos judeus.
4)Tribunais eclesiásticos e senhoriais foram substituídos por um sistema centralizado de uniformidade, administrado por uma burocracia judicial.
5)Pesos e Medidas, até certo ponto, foram padronizadas. E outras restrições ao movimento livre dos trabalhadores foram eliminadas.

"Napoleão levara mudanças a toda parte e, quando partiu para o seu exílio final em Santa Helena, em 1815, era evidente que muitas delas não podiam ser revogadas."
(página 49)



ANOTAÇÕES EXTRAÍDAS DA LEITURA DO LIVRO "A LUTA PELO PODER, EUROPA 1815-1914", DE RICHARD J. EVANS, EDITORA EDIÇÕES 70"



Império Persa Por que nos odeiam? Assírios Medos Ecbátana Estíages Ciro Persas Dario Zoroastro



POR QUE NOS ODEIAM?

O grego Heródoto, na cidade de Helicarnasso, atual Bodrum na Turquia, perguntava: Por que eles (aqueles que vem do leste, os persas) nos odeiam? Teria sido a destruição de Troia, cidade localizada na Ásia Menor, atual Turquia?

"Seu nome era Heródoto. Na condição de um grego natural do que é hoje o resort turco de Bodrum, então conhecido como Halicarnasso, cresceu nas bordas da Ásia. Por que, perguntou-se, as populações do Ocidente e do Oriente têm tanta dificuldade de conviver em paz?"
(página 15)

No momento em que Heródoto se indagava, uma nova ameaça começava a surgir na Ásia, nas planícies do que é o hoje o sul do Irã. Ali uma tribo iria partir para a conquista que iria do Mar Egeu à Índia. 
Em 480 a.C., Xerxes, um dos chefes dessa tribo, era o homem mais poderoso do mundo e a Grécia era apenas o nome de um local geográfico, no qual havia uma série de cidades-estados que não se davam bem umas com as outras. 
Apesar dessa rivalidade, os gregos viam-se como um único povo, compartilhando uma mesma língua, uma mesma cultura.
O Império Persa (já não era apenas uma tribo do sul do atual Irã) já tinha abocanhado cidades gregas naquilo que hoje é a Turquia Ocidental. Mas os Persas queriam mais. Queriam a própria Grécia, que ficava na Europa. Em 480 a.C., os Persas reuniram a maior força expedicionário já reunida e com ela tentaram invadir a Grécia. Mas os gregos resistiram e a repeliram. 
Quarenta anos após essa tentativa Persa de invadir a Grécia, Heródoto, o personagem citado acima, foi buscar razões para toda essa violência. Por que nos odiavam, perguntava Heródoto, a ponto de nos invadir com tantos soldados? 
Na verdade, nas guerras entre Gregos e Persas havia muita coisa em jogo. Exemplo: o desenvolvimento da democracia ateniense não teria ocorrido sob a dominação de um rei estrangeiro. E mais ainda: se a Grécia tivesse sido dominada pelo Império Persa, talvez nem o Ocidente, como o conhecemos, iria existir.
Termópilas, Maratona, Salamina ajudaram na criação do mito-fundador da Civilização Europeia.
O Império Persa, por sua vez, criou um Estado multiétnico, multicultural, que se estendia do Mar Egeu à Índia, dividindo para governar e garantindo a paz e a ordem para quem se deixasse submeter. 
Esse Império Persa foi paradigma para os próximos impérios que viriam a sucedê-lo, inclusive o Islâmico.

ESTRADA KHORASANIANA:

A estrada Khorasaniana transpunha a cadeia de Montanhas denominada ZAGROS. Essa cadeia montanhosa Zagros, por sua vez, separava duas regiões: na parte oeste, ficava a Mesopotâmia (atual Iraque). Na sua parte leste, ficava o Planalto iraniano (atual Irã).
Essa estrada, portanto, ligava a região do Crescente Fértil com o Irã e além dele (Afeganistão, etc)

ASSÍRIOS:

Era um povo guerreiro. Era um império comandado por reis guerreiros. Seus reis tinham que viver lutando, liderando seus homens na busca de novos territórios. A Civilização assíria tinha canais de irrigação, palácios e jardins. Vivia no que é hoje o norte do Iraque. Era uma civilização orgulhosa e sedenta por conquistas. Chegaram ao Egito mas queriam mais. Os assírios deslocavam populações inteiras de um lado para o outro; populações derrotadas que saíam de suas casas e eram realocadas em áreas desabitadas, de onde outras populações, também derrotadas pelos Assírios, já tinham sido realocadas em outra área. Assim, as populações derrotadas perdiam suas raízes. Suas principais cidades eram Nínive, Assur. A Assíria, regularmente, fazia expedições nas Montanhas Zagros para capturar membros de tribos locais, tornando-os escravos. Havia também incursões punitivas, para demover essas tribos que viviam nas Zagros de efetuarem ataques furtivos em cidades Assírias. Essas tribos também eram obrigadas a se submeter ao poder Assírio, pagando tributos na forma de cavalos, que iam para o exército Assírio (século VIII a.C.) Mas essas tribos começaram a se unir como forma de enfrentar os Assírios. As Montanhas Zagros ficaram mais arriscadas para as incursões dos Assírios em busca de escravos, em expedições punitivas ou para cobrar tributos.

ARYA - ARIANOS:

Povos nômades vindos das estepes do leste (Ásia Central). Da Ásia Central foram para as Montanhas Zagros.
Havia nas Montanhas Zagros tribos que se autodenominavam de ARYA (arianos). Arya significa nobre. Eram hábeis domadores de cavalos. Eram originalmente nômades. Com o tempo, tornaram-se sedentários, criando cidades.
Os Medos eram uma confederação de tribos arianas que residiam ao longo da Estrada Khorasaniana. Essa união tribal foi uma necessidade. Era necessária para fazer frente aos ataques assírios. E de uma defesa passou para o ataque. Os Medos passaram a atacar os Assírios. Nínive foi invadida e devastada (615 a.C. 612 a.C. - século VII). Os antigos algozes se tornaram vítimas. 

"um número infinito de mortos - eles avançavam pisando nos corpos."
(página 33)

Em 608 a.C., a grandiosidade da Assíria ficou para trás. No seu lugar entrou os Medos

A MÉDIA (MEDOS):

Essa nova força ficou com grande parte do espólio assírio. Seus reis eram meramente chefetes militares provisórios até alcançarem o status de terem derrotado os assírios. A Média emulou o comportamento dos assírios, passando a invadir áreas contíguas ao seu território. Daqui por diante, a Média iria invadir o norte da Síria e a Lídia (atual Turquia). Em 585 a.C., Astíages, rei dos Medos, fez um acordo com o rei da Lídia, estabelecendo a fronteira oeste de seu império no rio Hális.
A capital do reino Médio ficava em Ecbátana, que se localizava na Estrada Khorasaniana, no final da subida das Montanhas Zagros, antes do Planalto Iraniano. No controle dessa cidade, os Medos controlavam o comércio entre leste e oeste.

PERSAS: 

Os Medos superaram os Assírios. Agora os Persas iriam superar os Medos.
Medos e Persas eram arianos. Os Medos, ao olharem para os Persas, poderiam contemplar o seu próprio passado, formada por uma confederação de Clãs, um povo nômade, que eram excelentes cavaleiros.
Persas: Não se sabe se eram os mesmos, mas de toda forma, uma região que hoje situa-se no sul do Irã (costa do Golfo Pérsico), adotou o nome de Paarsa/Pérsia, a terra dos Persas. Essa nova tribo ariana, instalada na Paarsa, tinha já guerreado com os assírios no ano de 843 a.C..
O reino de Ciro, no início, era apenas um vassalo dos Medos. Na visão de Astíages, a Pérsia era um reino atrasado e que não lhe ameaçava. E foi por pensar assim que Astíages casou sua filha com o príncipe Persa. Astíages casou sua filha, Mandane, com o príncipe de um reino atrasado porque, num sonho, viu sua filha urinando sem parar, até causar a inundação do Reino da Média. O sonho foi interpretado como um alerta ao rei dos Medos, nos seguintes termos: qualquer filho de Mandane colocaria em risco o seu reino. Por esse motivo, Astíages se precaveu, da forma dele, casando sua filha com o príncipe de um reino sem importância.
Mas os sonhos não pararam por aí. Num segundo sonho, Astíages viu uma árvore crescendo por entre as pernas de sua filha. Essa árvore do sonho crescia sem parar, até cobrir toda a Ásia. Aterrorizado com essa visão, Astíages ordenou que o filho de Mandame fosse assassinado. 

"Como invariavelmente acontece nessas histórias, desobedeceram-lhe. Abandonado na encosta de uma montanha, o bebê foi encontrado e criado por um pastor; ou, talvez, dizem alguns, por um bandoleiro, ou quem sabe, até mesmo uma cadela, com as tetas, bem a propósito, transbordando de leite."
(página 34)

Enfim, esse bebê cresceria e tomaria o trono da Persa para si. E o nome desse bebê era Ciro. Independentemente de tais histórias serem verdadeiras ou não, a realidade é que os Persas derrotaram os Medos no campo de batalha.
Na Ásia era normal essa sucessão de reinos e impérios. Era uma selva onde o predador de hoje poderia ser o presa de amanhã. E a presa de ontem poderia se tornar o predador de hoje.

CIRO:

Em 559 a.C., Ciro sobe no Trono Persa. Ciro tornou-se líder dos Persas por ser o chefe da principal tribo, os AQUEMÊNIDAS (cidade de Pasárgada)
Em 550 a.C., Ciro derrota o rei dos Medos, Astíages. A vitória de Ciro contou com a ajuda de Harpago, comandante do exército de Astíages. Harpago traiu seu rei. 
O reino persa de Ciro tinha uma Corte, mas os persas não haviam se assentado completamente. Traziam ainda consigo muito daquilo que caracterizavam seus ancestrais que viveram nas estepes do Leste (cavaleiros em constante movimento em busca das melhores pastagens para os seus rebanhos).
Ciro tratou bem os derrotados Medos. Astíages passou a receber uma pensão. Ecbátana não foi destruída. Esse tipo de comportamento de Ciro trouxe os Medos para o seu lado. A partir de 550 a.C., os Persas mergulharam de cabeça na expansão de seu Império. Ao avançar para o oeste, Ciro derrotou o rei da Lídia, Creso. Ciro então entrou na capital da Lídia, Sardes, que ficava a três dias de jornada do mar Egeu (547 a.C.). Na sequência, Ciro alcançou o litoral do Mar Egeu, na Ásia Menor, atual Turquia. Cidades jônias do litoral foram conquistadas.
Com a Ásia Menor conquistada, Ciro voltou seus olhos para o Leste. Como um ariano, Ciro sabia o perigo representado pelas tribos nômades que viviam no Leste. Era necessário proteger o Planalto Iraniano e ir além, se possível. 

IMPÉRIO PERSA - EXPANSÃO PARA O LESTE:

A expansão para o leste foi exitosa. A Pérsia seria protegida pelas incursões da tribos nômades por meio de um arco que ia do Mar de Aral ao Indocuche (Indo-Kush), abrangendo a região da Sogdiana (atual Usbequistão) e a Bactriana (Gandara, Afeganistão, Paquistão). A expansão de Ciro parou no rio Jaxartes (Syr Daria). 

"Ciro, atravessando a monotonia das estepes, certamente não tinha a intenção de prosseguir até mais longe."
(página 44)

Estabelecida sua fronteira oriental, Ciro voltou seus olhos para o atual sul do Iraque. 

"as ricas terras planas do que é agora o sul do Iraque, indo da Assíria até o Golfo Pérsico, uma região de esplêndidas cidades, desde o alvorecer dos tempos."
(página 44)

O sul do Iraque foi conquistado por Ciro, sem maiores percalços. 
Ciro morreu no ano de 529 a.C..

"Nenhuma Império jamais for erguido em tais bases. Nenhum conquistador jamais praticara tanto e em tal extensão a clemência. Foi essa a genialidade de Ciro."
(página 46)

SUCESSÃO DE CIRO:

Ciro morreu. Quem iria sucedê-lo? Isso era um problema. Ele tinha 3 filhas e dois filhos. As filhas não eram o problema. Os filhos eram o problema: Cambises e Bardiya
Em vida, Ciro fez de Cambises um príncipe e de Bardiya governador da Báctria. Após a morte de Ciro, seus filhos acertaram um pacto entre si. Bardiya ficaria com a província de Báctria, enquanto Cambises seria o rei, sucedendo a seu pai. 
Com tudo acertado entre os irmãos, Cambises deu início à sua série de conquistas. A primeiras delas foi o Egito. Cambises tornou-se Faraó do Egito. Ele procurava mostrar respeito pela religião e pelos costumes egípcios. Com Cambises no Egito, a área central do Império Persa, no atual Irã, ficou acéfala. E quem dominasse a área central da Pérsia, dominaria o Império. Assim, na ausência de Cambises, nobres persas começaram a conspirar contra ele. Queriam fazer de Bardiya o novo Imperador. Esses nobres estavam cansados do jeito de governar de Cambises, que segundo eles era autoritário. Bardiya então deu início ao plano para derrubar o seu irmão (522 a.C.).

MORTE DE CAMBISES. ASCENSÃO DE DARIO:

Ao saber das tramas armadas contra ele, Cambises preparou um exército e deu início à sua marcha para o centro do seu Império, no atual Irã. Mas no caminho Cambises sofreu um acidente e morreu. Com a morte de Cambises, Bardiya tornou-se Imperador do Império Persa por direito e de fato. Mas seu reinado duraria pouco. Bardiya, para arrecadar dinheiro para o Tesouro Persa, confiscou os bens dos nobres que acompanhavam Cambises em sua marcha do Egito para o Irã. Entre os nobres expropriados em seus bens estava um sujeito que atendia pelo nome de DARIO. Dario teve o mérito de reunir em torno de si outros nobres que também tinham sido expropriados por Bardiya. 

"Dario era um primo distante do rei, (...), tinha apenas 28 anos."
(página 52)

"Dario era o carregador de lança de Cambises."
(página 52 )

"Assim, o título do jovem Dario, longe de implicar uma condição servil, era uma honra esplêndida e prestigiosa. O status na corte persa era conferido exclusivamente pela proximidade em relação à pessoa real."
(página 52)

Dario também era do clã Aquemênida, a mesma de Ciro. 
Enfim, Dario assumiria o comando do Regicídio (novembro de 522 a.C.) que acabaria por matar Bardiya e que o colocaria no trono persa.
No período de 1 anos, os dois filhos de Ciro estavam mortos.
Os Regicidas esconderam-se atrás da história dizendo que o verdadeiro Bardiya já estaria morto há muito tempo. Teria sido morto pelo próprio Cambises. O homem que agora estava no trono da Pérsia era um impostor, se fazendo passar pela figura de Bardiya, por meio da magia. Ninguém na Pérsia ousou contraditar essa história, com medo de sofrer represálias.
Com essa história, os conspiradores não seriam vistos como regicidas, mas como aqueles que livraram o trono da Pérsia de um impostor.
E isso não era pouca coisa, pois manter um impostor no Trono da Pérsia colocaria em perigo a própria existência do cosmos, do Universo.

ZOROASTRISMO E A ASCENSÃO DE DARIO AO TRONO PERSA:

Os persas acreditavam que o Deus Ahura Mazda, ao criar o Universo, tinha criado ARTA, a verdade, e Drauga, a mentira. Verdade e Mentira estavam em constante conflito. A Verdade era quem garantia a ordem no funcionamento do Universo, que por sua vez garantia a existência da vida. Já Drauga, representante da Mentira, era o caos, a desordem. 
Os conspiradores então tinham tirado um mentiroso do trono persa, um mago que se fazia passar por Bardiya. Com isso, Dario e seus amigos tinham restaurado a verdade e, por tabela, a ordem no Universo.
Por fim, Dario, como líder da conspiração e na ausência de um outro nome, assumiu o trono persa.

ZOROASTRO:

Zoroastro era o profeta do povo ariano (medos, persas, etc). Via o mundo como um palco no qual as forças do mal e do bem estavam em constante luta. A verdade (bem) e a mentira (mal) estavam em constante luta. 
Essa luta alcançaria um momento final com a vitória da verdade sobre toda a falsidade, sob o olhar do Deus Ahura Mazda, estabelecendo na Terra um reino de Paz. Ainda segundo os ensinamentos de Zoroastro, a VERDADE era representada pelas chamas do fogo, que se fazia acompanhar pela fumaça negra, que representava a mentira (drauga), representando assim a eterna briga entre a verdade e a mentira. 
Dario, buscando unir seu poder à religião (Zoroastrismo), construiu templos consagrados ao fogo. Dario, de fato, sendo um regicida e um golpista, buscou legitimar seu poder com o auxílio da religião. Dario não era filho de Ciro, por isso usava a religião para forçar a ideia de que seria pelo menos o representante na terra do Deus Ahura Mazda. 

ANOTAÇÕES EXTRAÍDAS DO LIVRO "FOGO PERSA", O primeiro Império Mundial e a Batalha pelo Ocidente. Tom Holland, Editora Record, páginas 13/63)


quarta-feira, 18 de março de 2020

A Peste no Século VI d.C. Persas versus Constantinopla Séculos VI e VII Persas e Constantinopla versus Islã



A PESTE BUBÔNICA (SÉCULO VI d.C.):

A desordem precedeu a ascensão do islã. A peste bubônica criou um tumulto na esteira da qual mortes e mais mortes se abateram sobre a região que era então o centro do mundo (Constantinopla, Pérsia, China e Egito). Isso aconteceu no século VI d.C..

"...as portas das casas haviam sido deixadas abertas, sem ninguém para guardar o ouro, a prata e objetos de valor dentro deles." O CORAÇÃO DO MUNDO, Uma nova história universal a partir da Rota da Seda: O encontro do oriente com o ocidente, de Peter Frankopan, Editora Crítica, página 85

"...com 10 mil pessoas sendo mortas por dia em Constantinopla, a certa altura de meados da década 540 d.C."O CORAÇÃO DO MUNDO, Uma nova história universal a partir da Rota da Seda: O encontro do oriente com o ocidente, de Peter Frankopan, Editora Crítica, página 85

A peste impactou negativamente a economia, resultando em menos mão de obra, menos consumidores. A peste também impactou negativamente o Império Bizantino, que durante o século VI ia retomando territórios no norte da África e na Itália. O tesouro bizantino já ia mal (gastos com guerras; comprando boas relações com vizinhos irascíveis, etc) e piorou com a superveniência da peste bubônica. 

RIVALIDADE ENTRE O IMPÉRIO PERSA E CONSTANTINOPLA (SÉCULOS VI E VII d.C.):

Para tumultuar ainda mais o ambiente na Ásia, Constantinopla e Pérsia retomaram as hostilidades entre si durante o século VI d.C.. Com o início do século VII as hostilidades entre Pérsia e Constantinopla não cessam. No ano de 609 os Persas capturaram a cidade de Edessa (atual Turquia). Antioquia (610) e Damasco, na atual Síria, no ano de 613, são outras aquisições Persas. 

PERDA DE JERUSALÉM PARA OS PERSAS E O CERCO DE CONSTANTINOPLA:

No ano de 614 d.C., Constantinopla perde a cidade de Jerusalém para os Persas. A expansão Persa é imparável. No ano de 619, Alexandria, no Egito, é conquistada. No ano de 626, os exércitos do Império Persa podiam avistar de seus acampamentos os Muros que guarneciam a cidade de Constantinopla. 

"O fim estava próximo e parecia absolutamente inevitável."
(página 91)

Nessa altura dos acontecimentos, o Imperador Bizantino era Heráclio. E a sorte sorriu para ele e para seus súditos, pois os Persas e seus aliados avaros ( nômades das estepes, que avançavam do norte, penetrando pelos Balcãs) começaram a perder o ímpeto. A expansão dos Persas tinha exigido recursos demais do Império e por essa razão tiveram que recuar. Constantinopla se salvou.

CONTRA-ATAQUE ROMANO:

Constantinopla contra-atacou. Heráclio usou a religião para estimular seus soldados na reconquista dos territórios perdidos. Em 627, Constantinopla derrotou os Persas em Nínive, no atual norte do Iraque. Em 630 Jerusalém foi reconquistada. Os cristãos orientais residentes em Jerusalém tiveram que jurar fidelidade ao cristianismo ortodoxo de Constantinopla, tendo que abandonar os ensinamentos do cristianismo oriental, que tinham como centro propagador clérigos que viviam na Pérsia. A vitória de Constantinopla no campo de batalha deveria ser a prova irrefutável de que o Cristianismo Ortodoxo era o único avalizado por Deus. Heráclio, tomado pela euforia, sonhava levar o Cristianismo Ortodoxo de Constantinopla para o resto da Ásia. Mas nesse exato momento de glória para Constantinopla, um novo ator surgia, vindo da Península Arábica: o Islã!

O ISLÃ PEDIA PASSAGEM: 

O sudoeste da Península Arábica era um caldeirão onde fermentavam as disputas protagonizadas por Pérsia e Constantinopla. Bizantinos e Persas procuravam cultivar clientes entre as tribos que habitavam a Península Arábica. Bizantinos e Persas tinham se aproveitado da desunião dessas tribos, manipulando-as, jogando-as umas contra as outras, fazendo-as de aliadas contra seu inimigo. Mas com a ascensão de Maomé, a desunião virou união, a fraqueza virou força e os árabes, de joguetes nas mãos de Persas e Bizantinos, passaram a ser eles mesmos os senhores de seu destino.

SÓ HÁ UM DEUS E MAOMÉ TINHA SIDO ESCOLHIDO COMO SEU MENSAGEIRO:

Os povos que habitavam a Península Arábica eram politeístas. Cada tribo árabe tinha seus próprios deuses. Com o tempo o Politeísmo perdeu terreno para o Monoteísmo. Só havia um Deus em torno do qual os árabes, desunidos no passado, se uniram. E o profeta desse único Deus era Maomé. A ideia de que havia um só Deus levou à união daqueles que no passado viviam brigando entre si. A união fez a força dos árabes. E essa força levou à expansão do islamismo, da Espanha aos confins da Ásia. 

MAOMÉ:

Maomé foi o escolhido como o mensageiro de Deus. Maomé recitava as mensagens de Deus, que ficariam registradas no Corão. Maomé surgiu numa época caracterizada por uma depressão econômica, causada pela guerra entre Constantinopla e Pérsia. Essa guerra prejudicou o comércio que era feito na Península Arábica. Os árabes foram prejudicados.

"O confronto e a efetiva militarização de Roma e Pérsia tiveram importante impacto sobre o comércio que se originava no Hijaz ou passava por ele. Com gastos do governo canalizados para o exército e a crônica pressão na economia doméstica para apoiar o esforço de guerra, a demanda por bem de luxo caíra consideravelmente."
(página 95)

Naquele cenário de retração econômica, as palavras de Maomé encontraram um terreno fértil. Maomé prometia o paraíso para quem o seguisse. Naquele mundo conturbado e áspero, deixar-se levar por uma pregação que prometia um outro mundo, muito melhor do que aquele no qual viviam, era tentador, era sedutor. 

"A salvação espiritual traria recompensas econômicas."
(página 96)

"Os árabes estavam sendo apresentados à sua própria religião, que criava uma nova identidade."
(página 97)


EXPANSÃO ISLÂMICA:

A união entre interesses econômicos e religiosos foi a força por trás da qual a expansão islâmica se concretizou. A palavra de Deus era difundida simultaneamente com os saques e as pilhagens. Os infiéis eram expropriados de seus bens, que iam para os fiéis islâmicos. A palavra de Deus era difundida e os guerreiros eram recompensados com os bens conseguidos por meio de saques. Foi inclusive criado um escritório (diwan) para a organização da repartição daquilo que era saqueado dos infiéis.

"Uma fração de 20% era dada ao líder dos fiéis, o Califa, mas a maior parte era distribuída entre seus apoiadores e aqueles que haviam participado dos ataques bem-sucedidos." 
(página 99)

Jerusalém foi conquistada pelos muçulmanos em meados da década de 630. Constantinopla e o Império Persa sofriam derrotas nas mãos dos muçulmanos. A capital Persa, Ctesifonte (atual Iraque), foi tomada pelos árabes, que saquearam seu tesouro. 

CONCÓRDIA ENTRE ISLÃ, CRISTÃOS E JUDEUS:

O Islã se via como um herdeiro da tradição monoteísta inaugurada por judeus e pelos cristãos. Havia apenas um Deus, que de tempos em tempos fazia conhecer as suas palavras. Para tanto, ele se valeu de Moisés, de Jesus e de Maomé. 

"Em outras palavras, os profetas do judaísmo e do cristianismo eram os mesmos do islã"
(página 106)

Os muçulmanos falavam sobre a Umma, uma comunidade de fiéis que deveria unir toda a comunidade. Eventualmente havia dissensões nessa comunidade (Umma), resultando no aparecimento de judeus e cristãos. Mas a ideia do Corão era no sentido de que "não descriminemos nenhum deles." (página 106)

"Na realidade, o islã parecia tão próximo que alguns eruditos cristãos achavam que seus ensinamentos eram não tanto os de uma nova fé como uma interpretação divergente do cristianismo. Para João de Damasco, um dos principais cronistas da época, o islã era uma heresia cristã, mais do que uma religião á parte. Maomé, escreveu ele, tinha surgido com ideias baseadas em sua leitura do Antigo e Novo Testamentos - e com uma conversa com um monge cristão itinerante."
(página 112)

As conquistas árabes não foram brutais. A população cristã continuava com suas igrejas na Síria e na Palestina. A mudança era de senhorio. Agora o imposto deveria ser pago ao Califa e não mais ao Imperador de Constantinopla. 

"A coabitação dessas diferentes formas de fé (cristianismo, zoroastrismo, judaísmo e islamismo) foi uma marca dos primórdios da expansão islâmica - e parte importante de seu sucesso."
(página 109)

A expansão árabe agora seguia para o Egito e para o restante da Pérsia, derrubando a dinastia Sassânida. Na esteira da expansão muçulmana, muitas cidades foram criadas, como Fustat no Egito e Kufa no Eufrates (atual Iraque). Na Europa, a expansão islâmica foi detida por Carlos Martel, entre Poitiers e Tours (320 km de Paris), no ano de 732. A Europa Ocidental poderia ter se tornado muçulmana. O autor deixa subentendido que os muçulmanos não insistiram na conquista da Europa porque ela não era economicamente atraente. Havia troféus mais valiosos na Ásia. Mas de toda forma, a Europa sofreu com a ascensão do Islã. Atenas e Corinto, na atual Grécia, diminuíram de tamanho. O comércio no mediterrâneo contraiu-se drasticamente. O comércio na Europa tornou-se apenas local.

BRIGAS DENTRO DO ISLÃ:

Quem iria suceder Maomé? Qual era com exatidão a mensagem recebida por Maomé? Tudo seria compilado no Corão, no final do século VII. Essa desavenças internas de quem seria o guardião da palavra de Deus respingou naqueles que não eram muçulmanos. Novas regras endureceram a vida dos infiéis. E mais: depois de vencerem no campo de batalha, agora os muçulmanos queriam converter a população local ao islã.

EXPANSÃO DO ISLÃ PARA A ÁSIA CENTRAL:

As cidades iam sendo conquistadas: Samarcanda (atual Usbequistão), Panjikent (atual Tadjiquistão), Balkh (atual Afeganistão). Em 751 um exército árabe derrotou um exército chinês, no rio Talas, na Ásia Central. Com essa derrota, os chineses recuaram para o seu território, abandonando a Ásia Central. Aproveitando-se disso, o povo uigure passou a construir cidades no que hoje é o Quirguistão. 

DIVISÕES DENTRO DO ISLÃ:

No início do século X, havia 3 centros de poder:

a)Córdoba, na atual Espanha
b)Egito
c)Bagdá

BAGDÁ:

"Bagdá iria se tornar a mais rica e populosa do mundo."
(página 115)

O apetite de Bagdá por produtos luxosos era insaciável. Importavam, por exemplo, seda e peças de cerâmica da China; doces do Egito; figos sírios; pistache de Nishapur. No século VIII o papel chegou da China. Havia um tráfego intenso de navios no Golfo Pérsico. Riquezas eram construídas. Bagdá era o centro do mundo (séculos VIII, IX e X). Em Bagdá a cultura era patrocinada por mecenas locais. O estudo era valorizado, buscando-se conhecimento, onde quer que ele se encontrasse (Índia, Constantinopla, etc). 

Havia ainda uma outra divisão, entre Xiitas e Sunitas. Xiitas diziam que apenas os descendentes de Ali (primo e genro de Maomé) podiam ser califas. Já os sunitas defendiam uma interpretação mais ampla, menos radical. 

"Portanto, embora houvesse em tese uma unidade religiosa abrangente que ligava o Indocuche (Indo-Kush - Afeganistão) aos Pireneus (Espanha), passando pela Mesopotâmia (Iraque) e pelo norte da África, encontrar um consenso era outra questão."
(página 122)

RESUMO:

Enquanto os dois grandes impérios dos séculos VI e VII, Persa e Constantinopla, brigavam entre si, 
das profundezas da Península Arábica, a partir do Hejaz (Meca e Medina), uma força se preparava para criar um dos maiores impérios da História, sob a religião islâmica.

Anotações extraídas da leitura do Livro O CORAÇÃO DO MUNDO, Uma nova história universal a partir da Rota da Seda: O encontro do oriente com o ocidente, de Peter Frankopan, Editora Crítica.


A Rota das Peles Vikings Rus Pais da Rússia



RIQUEZA MUÇULMANA. CRIAÇÃO DE NOVAS ROTAS COMERCIAIS:

A riqueza do mundo muçulmano impulsionou a criação de novas rotas comerciais. Havia demanda por novos produtos e havia dinheiro para comprá-los. As novas rotas estavam no norte, nas estepes, habitadas por tribos nômades (pechenegues, ghuzz, etc). Essa tribos possuíam grandes rebanhos, por esse motivo estavam sempre em movimento, estavam sempre em deslocamento, montando e desmontando acampamentos, sempre em busca de melhores pastos para seus animais (cavalos, cabras, etc)
O Império Islâmico adquiria esses novos produtos como o mel, a cera, o âmbar, etc. Mas o principal produto que vinha dessa nova rota comercial do norte era a Pele. Peles de animais (zibelina, vison, raposa, esquilo cinza, etc). Surgiu uma Rota de Peles, ligando as estepes do Norte ao rico mundo muçulmano no sul.
Tínhamos então nômades do norte (norte do Mar Negro, margens do Rio Volga e além) comerciavam produtos diversos com os ricos muçulmanos sedentários do sul.
Cidades mais próximas das estepes se aproveitaram desse comércio e enriqueceram. Exemplos: Merv (Ásia Central), Balkh (Afeganistão). 
Fora do mundo muçulmano acontecia o mesmo. Tribos mais bem localizadas, perto da riqueza do Mundo Muçulmano, enriqueciam. Isso acabou aumentando a rivalidade entre as tribos das estepes, que já competiam normalmente pelos melhores pastos, melhores fontes de água, etc.

"Isso estava fadado a produzir uma de duas reações: ou as tensões ficavam maiores, resultando em uma violenta fragmentação, ou haveria uma consolidação no interior e entre as tribos. A opção era lutar ou cooperar."
(página 131)

A riqueza do mundo muçulmano despertou a cobiça dos povos das estepes. No futuro essa cobiça iria se transformar em invasões, sob Gengis Khan e seus descendentes. A riqueza do mundo muçulmano (Pérsia, Mesopotâmia, Afeganistão, Egito, etc) estimulava a economia além de suas fronteiras, fazendo com que empreendedores fossem, por exemplo, atrás de peles no norte da Eurasia, criando assim novas rotas comerciais, criando riquezas, criando cidades espetaculares, fortalecendo as tribos das estepes mais empreendedoras. O problema é que essa mesma riqueza acabaria atraindo contra si a cobiça dessas mesmos tribos nômades, que com o passar do tempo não iriam se contentar em sua posição de meros intermediários, meros comerciantes de peles ou cavalos para os povos sedentários do mundo muçulmano.

"O surgimento de uma rota de peles nas estepes e nas faixas de florestas ao norte foi resultado direto de um surto de riqueza disponível nos séculos que se seguiram às grandes conquistas islâmicas nos séculos VII e VIII."
(página 130)

DE NÔMADES A SEDENTÁRIOS: OS CAZARES:

De momento, as estepes se acomodaram nessa condição de intermediários. Um exemplo disso era o grupo túrquico chamado Cazares (norte do Mar Negro e do Mar Cáspio). Os Cazares conseguiram unir em torno de si outras tripos, criando assim alguma estabilidade nas estepes.
Os cazares se tornaram importantes porque conseguiram obstar o avanço muçulmano. Esse feito serviu até para atrair a atenção de Constantinopla, que passou a ver nos Cazares uma opção de aliança contra os muçulmanos. Até casamentos foram celebrados entre a elite da casa governante de Cazaria com membros da família imperial bizantina. O crescimento dos Cazares levou a sua estratificação, com a criação de elites e ainda ajudou na atração de outras tribos, que viraram vassalas desse novo poder, pagando tributos à Casa governante de Cazaria. O líder Cazan, o Khagan, tinha 25 esposas, escolhidas cada uma delas de 25 tribos distintas, de forma a criar uma aliança dessas tribos com o Khagan. Antes nômades, os cazares e seus clientes, em razão da estabilidade conquistada e do comércio que exerciam, acabaram se tornando sedentários. Cidades foram construídas, uma delas às margens do Rio Volga, Atil. No início do século X o próprio líder Khagan se estabeleceu em Atil. 
Na sociedade dos Cazares havia muçulmanos, cristãos, pagãos (Deus Tengri) e judeus. Cristãos, judeus e muçulmanos desejavam atrair o povo Cazar para a sua fé. Constantinopla chegou a mandar uma delegação para tentar converter os Cazares para o seu Cristianismo, chefiada por Cirilo, que iria ficar conhecido por ser o criador do alfabeto eponimo (cirílico) para os eslavos.
No final, o líder dos Cazares escolheu o judaísmo para o seu povo.

OS ESCANDINAVOS (RUS) 

Não foi só as peles que vieram do norte. Do norte também vieram os Escandinavos, que eram chamados de "rus", em razão de serem remadores ou por causa da cor de seu cabelo). Os escandinavos ligaram o Mar Báltico, no norte, aos mares Negro e Cáspio, descendo pelos rios Volga, Dnieper, Oder, Neva, etc.

"Eles foram os país da Rússia."
(página 137)

Foi a riqueza muçulmana que atraiu os Vikings. Cidades foram criadas por eles, como por exemplo Novgorod. 

"Foi a atração pelo comércio e riquezas do mundo islâmico que estimulou de início (século IX) os vikings a partirem para a jornada rumo ao sul."
(página 137)

"Os Vikings estavam envolvidos no comércio de cera, âmbar e mel, assim como no de espadas refinadas, muito admiradas no mundo islâmico."
(página 138)

Mas a mais importante mercadoria despachada para o sul era formada por escravos. Para o norte, em forma de pagamento, iam tecidos e moedas de prata.

OBSERVAÇÃO:

As peles eram usadas como moeda de troca nas estepes. Elas eram trocadas por dinheiro ou por algum outro produto. 
"Peles de esquilo de dezoito anos valiam uma moeda de prata, enquanto uma pele inteira tinha o preço de um grande filão de magnífico pão, suficiente para sustentar um homem grande."
(página 130)

"ter um meio de troca era importante para sociedades que interagiam entre si mas não possuíam um tesouro central capaz de supervisionar a cunhagem de moedas em larga escala."
(página 130)

Anotações extraídas da leitura do Livro O CORAÇÃO DO MUNDO, Uma nova história universal a partir da Rota da Seda: O encontro do oriente com o ocidente, de Peter Frankopan, Editora Crítica.

A Rápida Expansão do Islamismo no Século VII d.C. Colaboração de Judeus e Cristãos



FATORES QUE EXPLICAM O RÁPIDO AVANÇO DO ISLÃ:

- Colapso do Império Persa, que estava exaurido pelas guerras contra Constantinopla
- Maomé tinha o apoio das elites de Meca
- A expansão do Islã combinava o ganho material (butim, pilhagens) com o proselitismo religioso
- Num primeiro momento, aceitação por parte dos cristãos e dos judeus que viviam nas áreas conquistadas pelos islãmicos
- Proselitismo: Em Bucara (Buckara), no atual Usbequistão, durante o século VIII, o governante local, objetivando trazer pessoas para o islã, anunciou que todos aqueles que comparecessem à oração de Sexta-Feira receberiam uma soma em dinheiro. Era um incentivo que atraia as pessoas para uma nova religião, o Islã.

O Islã, no início de sua expansão, tinha relações pacíficas com judeus e com cristãos. Nada parecido com o que acontece atualmente. Os islâmicos buscavam estabelecer uma relação de concórdia com os cristãos.

"Os esforços para uma concórdia com os cristãos eram complementados por uma política de proteção e respeito pelos Povos do Livro - ou seja, judeus e cristãos. O Corão deixa claro que os primeiros muçulmanos viam a si mesmos não como rivais daquelas duas fés, mas como herdeiros da mesma tradição: as revelações de Maomé haviam sido previamente reveladas a Abraão e Ismael, a Isaac e Jacó e às tribos. Deus também havia confiado as mesmas mensagens a Moisés e Jesus. 'Não discriminamos nenhum deles', diz o Corão. Em outras palavras, os profetas do judaísmo e do cristianismo eram os mesmos do islã."
("O CORAÇÃO DO MUNDO", Uma Nova História Universal a partir da Rota da Seda: O Encontro do Oriente com o Ocidente, Peter Frankopan, Editora Crítica, página 106)

Os Judeus viam nos árabes muçulmanos uma chance para obter a liberdade do domínio romano (Constantinopla). 

"Na verdade, o relacionamento entre o islã e o judaísmo era ainda mais notável por sua mútua compatibilidade. O apoio dos Judeus no Oriente Médio foi vital para a propagação e a difusão da palavra de Maomé."
("O CORAÇÃO DO MUNDO", Uma Nova História Universal a partir da Rota da Seda: O Encontro do Oriente com o Ocidente, Peter Frankopan, Editora Crítica, página 101)

"Quando Maomé foi encurralado em Yathrib, no sul da Árabia na década de 620, solicitar a ajuda dos judeus foi uma de suas principais estratégias. Era uma cidade - e uma região - impregnada de judaísmo e de história judaica. Apenas um século antes, um judeu fanático, governante de Himyar, havia comandado uma sistemática perseguição à minoria cristã, o que cristalizou um amplo padrão de alianças que ainda resistia firmemente: a Pérsia passara a apoiar os habitantes da cidade contra a aliança de Roma e Etiópia. Maomé estava ansioso pela conciliação com os judeus do sul da Árabia - e começou pelos mais velhos de Yathrib. Judeus importantes da cidade, mais tarde nomeada Medina, comprometeram-se a apoiar Maomé em troca de garantias de defesa mútua. Estas foram registradas num documento formal que declarava que sua fé e suas posses seriam respeitadas agora e no futuro pelos muçulmanos."
("O CORAÇÃO DO MUNDO", Uma Nova História Universal a partir da Rota da Seda: O Encontro do Oriente com o Ocidente, Peter Frankopan, Editora Crítica, página 102)


Os cristãos, por sua vez, sentiam-se incomodados com o Imperador de Constantinopla, Heráclio, que queria impor o cristianismo de Constantinopla a eles. Os cristãos não eram um todo unido. Havia muitas discussões doutrinárias que criavam tipos diferentes de cristianismo. O Cristianismo de Constantinopla era um. O Cristianismo oriental (Palestina, Síria, Pérsia, etc) era outro. Como exemplo podemos citar a celeuma a natureza de Jesus Cristo. Jesus Cristo era somente humano ou era humano e divino? O Islã teve a sorte de pegar uma comunidade cristã desunida.


Anotações extraídas da leitura do Livro "O CORAÇÃO DO MUNDO", Uma Nova História Universal a partir da Rota da Seda: O Encontro do Oriente com o Ocidente, Peter Frankopan, Editora Crítica, páginas 101/123)

segunda-feira, 16 de março de 2020

História da Alemanha (1) Panorama da Época Ulf Dirlmeier Idade Média Arcaica Reino Franco Merovíngios Carolíngios



IDADE MÉDIA ARCAICA (SÉCULOS VI A IX):

"A divisão da história europeia em três épocas - a Antiguidade, a Idade Média e a Idade Moderna - tem a sua origem em Christoph Cellarius (1638-1707)..."
(página 19)

Quando começou a Idade Média? Com a desagregação do Império Romano? Não há entendimento pacificado nessa área. Há a teoria da catástrofe que bate na tecla das invasões dos povos germânicos do século III e na migração dos povos nos séculos IV a VI. Há a teoria da continuidade que defende a existência de uma continuidade da história cultural e econômica. Segundo essa última teoria, parte-se "do ponto de partida da existência de uma evolução ininterrupta desde a Antiguidade que só teria sofrido uma cisão decisiva no século VIII, devido à invasão do Islão, no mundo mediterrâneo."
(página 19)
O autor do livro reconhece que há uma época de transição na Europa que abrange os séculos VI e VIII. O que se seguiu a ela, não de forma abrupta mas numa passagem progressiva, chamamos de Idade Média. Para o autor, a cisão não foi a ascensão do Islão, mas a ascensão do Império Carolíngio.
Em meados do século IX, o Império Carolíngio começou a entrar em decadência, cuja agonia durou um século. No seu lugar começaram a surgir "grandes unidades suprarregionais, que se transformariam , por seu turno, em regna autônomos, num processo que se prolongou por várias gerações, até cerca de meados do século XI."
(página 20)
A Europa de hoje tem suas raízes na Alta Idade Média, que sucedeu à Idade Média Arcaica (séculos VI a IX)
Do desmoronamento do Império Carolíngio surgiu, por exemplo, a Francônia Oriental (regnum), o embrião do Sacro Império Romano Germânico e depois da atual Alemanha. A Francônia Oriental apresentava uma disputa entre "as grandes ligas de fidalgos" (página 20) que buscavam contrabalançar o poder das Dinastias reinantes (otoniana, saliana e staufer/hohenstaufer) por meio de eleições. Esse direito de eleger o rei duraria até o fim do Sacro Império Romano Germânico, no século XIX.

Cronologia da Idade Média Arcaica Alemã (séculos VI a IX):

Anos 482-511: Clóvis I (rei dos Francos)
Ano 511: Divisão do reino entre os filhos de Clóvis
Anos 558-561: Clotário I, soberano de todos os Francos
Anos 679-714: Pepino de Herstal, mordomo do Palácio de Austrásia, reina a partir de 687 sobre too o reino Franco.
Anos 714-741: Carlos Martel, mordomo do Palácio do Reino dos Francos.
Ano 732: Carlos Martel derrota os árabes muçulmanos (Poitiers/Tours).
Anos 741-768: Pepino, o Breve, mordomo do palácio da Nêustria, da Borgonha e da Provença
Anos 768/814: Carlos Magno, soberano a partir de 771
Ano 800: Carlos Magno coroado Imperador
Anos 813-840: Luís, o Piedoso, co-Imperador a partir de 813 e imperador a partir de 814
Ano 817: Plano de Divisão do Império - Ordinatio Imperii

O IMPÉRIO MEROVÍNGIO E O IMPÉRIO CAROLÍNGIO:

Menos gente significava menos desenvolvimento econômico. Comércio, circulação monetária e ofícios quebrados. 
Cerca de 90% da população na Idade Média vivia no campo. Para haver uma transição para atividades não agrícolas, era necessário a produção de excedente de alimentos. Para tanto, foi necessário aumentar a superfície de cultivo para outras áreas.

"O Regime Senhorial Franco, partindo do centro dos territórios francos, situado entre o Reno e o Loire, com o seu sistema de servidão, tornou-se a forma de organização predominante nos séculos VII e VIII. O trabalho forçado dos servos, indispensável para a exploração das terras dos senhores (pars dominica), está estreitamente associado ao desenvolvimento social característico da época carolíngia: as relações de dependência e os vínculos pessoais aumentaram, as medidas legislativas que visavam contrariar esta propagação da privação de liberdade revelaram-se todas ineficazes, quando chegavam, sequer, a ser adotadas com uma intenção séria. A forma de dependência especificamente medieval agora em estruturação - a servidão - representava uma perda de estaturo para pessoas que antes eram livres. Pelo contrário, para os servi e mancipia, que haviam trabalhado antes como trabalhadores forçados, numa posição semelhante à dos escravos, esta nova forma significava uma ascensão à situação de semiliberdade."
(página 24)"

A massa de servos era dominada pelos poucos  Nobres existentes. Como era constituída essa nobreza?
- você tinha aquela nobreza imperial inicial dos Francos (século VI)
- a ela somaram-se, nos séculos VII e VIII, os seguidores dos carolíngios, tornando-se cavaleiros por meio do serviço militar

"Esta classe nobre do Império Franco deu origem a uma pequena elite, na transição entre a Idade Média Arcaica e a Alta Idade Média, da qual surgiriam, mais tarde, as dinastias alemãs e francesas."
(página 24)

Na Idade Média Arcaica havia produção de bens artesanais (em mosteiros e nos senhorios). Mas também havia alguma produção destinada ao mercado. Exemplo: vidro, joias e cerâmica na região dos Rios Reno e Mosela (século VI). 
De toda forma, é inegável que o comércio diminuiu dramaticamente durante a Idade Média Arcaica, principalmente no Mediterrâneo. 
O sistema monetário estava prejudicado. A situação só melhorou no século VIII, com a utilização da moeda de prata no Império Carolíngio. 

O REINO FRANCO E SEU DESENVOLVIMENTO POLÍTICO:

"Os Francos, quando comparados com todos os outros povos germânicos, foram extraordinariamente bem-sucedidos na constituição do Império a partir da Gália do norte."
(página 26)

Clóvis tomou o poder em 486, numa vitória sobre Siágrio, o último governador romano designado na Gália. A conversão de Clóvis ao cristianismo (498?) permitiu a fusão das elites galo-romanas e franca. Essa conversão trouxe estabilidade ao domínio exercido por Clóvis.
O Império Franco ganhou novos territórios com os filhos de Clóvis: a Turíngia (atual Alemanha) e a Borgonha no sul.
Em 558, Clotário I torna-se o rei de todos os Francos. "Clotário I conseguiu até reunir todo o reino merovíngio num reinado único, entre 558 e 561, contudo, o princípio da partilha da herança revelou-se mais forte."
(página 26)
Conflitos durante a era Merovíngia acarretaram na divisão do Império, com as constituição das seguintes partes: Austrásia, Nêustria e Borgonha. Essa divisão de poder acabou acarretando o surgimento de novas figuras, que conseguiram superar o poder do rei, denominadas Mordomo do Palácio - MAIOR DOMUS. 
O mais conhecido desses mordomos foi Carlos Martel, "filho ilegítimo de Pepino, de Herstal, que conseguiu se impor, a partir de 716, como mordomo do palácio de todo o reino, vencendo uma resistência persistente. Concedia terras (na maior partes das vezes, propriedades da Igreja) aos seus seguidores como recompensa pelos serviços militares dos cavaleiros. Esta prática constituiu o requisito, a longo prazo, para o sistema feudal medieval e permitiu-lhe, a curto prazo, a vitória sobre os árabes, na batalha de Poitiers (732). Carlos Martel não salvou o Ocidente, como se afirma frequentemente, de forma simplista; mas com esta vitória conseguiu prestígio para a sua família, entre outras coisas fazendo-a ascender a um lugar de poder a nível europeu."
(página 28)

O filho de Carlos Martel, Pepino, o Breve, num ato formal, foi ungido Rei dos Francos, em 751. Tal solenidade só foi possível graças à associação de Pepino com a Igreja Romana. Para a Igreja Romana, também era vantajosa essa associação. Sobre isso, disse o Papa Zacarias:
"será melhor designar como rei aquele que detém realmente o poder."
(página 28)
O papado se valia dessa associação com os Francos para conseguir proteção contra os Lombardos, na Itália. 

"Estes acordos significavam muito mais do que uma confirmação da passagem da dinastia dos merovíngios para os carolíngios; elas criaram as condições para a estreita coordenação existente entre o Império e a Igreja Católica na Alta Idade Média."
(página 28)

Em 800, Carlos Magno foi coroado Imperador em Roma, recebendo sua Coroa das mãos do próprio Papa.
A maior extensão do Império Carolíngio era a seguinte: estendia-se do rio Elba (atual Alemanha) até ao Atlântico, a oeste. Da costa do Mar do Norte até os Pireneus. Ainda tinha uma parte da Península Italiana, no sul.
Luís, o Piedoso, era filho de Carlos Magno. Ele se deparou com um problema: manter o Império intacto ou, após a sua morte, dividir o Império, segundo o direito de sangue, entre seus filhos.
O Império ainda tinha outros problemas:
-invasões de sarracenos e normandos (meados do século IX)
-influência crescente da Igreja em detrimento do poder do Imperador
-poder central não conseguia se fazer presente. a insegurança aumentava no reino
-vínculos estabelecidos por meio do feudalismo não eram suficientes para compensar a falta de um poder central, que era ausente, não possuindo uma administração eficiente

Todos esses problemas resultaram na repartição do Império, consubstanciado no Tratado de Verdun (843).


ANOTAÇÕES EXTRAÍDAS (PÁGINAS 19/29) DA LEITURA DO LIVRO "HISTÓRIA ALEMÃ, DO SÉCULO VI AOS NOSSOS DIAS, EDIÇÕES 70, VÁRIOS AUTORES.

domingo, 8 de março de 2020

Mudanças Climáticas Hunos Queda do Império Romano do Ocidente Concílios de Niceia e Calcedônia



MUDANÇAS CLIMÁTICAS NO SÉCULO IV d.C.; SURGIMENTO DOS HUNOS; ONDAS MIGRATÓRIAS BATIAM ÀS PORTAS DO IMPÉRIO ROMANO E DO IMPÉRIO PERSA:

Mudanças climáticas já aconteciam no passado. No século IV d.C. mudanças climáticas acarretaram problemas no território chinês e no território sogdiano (atual Usbequistão). Fomes generalizadas pela quebra de safras agrícolas resultam em saques nas cidades. Os lucros auferidos pela Rota da Seda caem. A vida nas estepes ficou ainda mais difícil. O que já era ruim, piorou. 
Mas houve uma tribo que vivia nas estepes que soube se aproveitar dos problemas causados por essas mudanças climáticas, conseguindo consolidar seu poder sobre as outras tribos existentes na Mongólia. Essa tribo era conhecida no ocidente como os HUNOS. Na Ásia eram chamados de Xiongnu.
O fortalecimento e a decorrente expansão dos Hunos resultou na expulsão de outras comunidades para o oeste, que fugiam deles. Estamos falando de um período compreendido entre 350 e 360 d.C..
Essas migrações não eram causadas apenas pela violência dos Hunos, como também pelas mudanças climáticas. 
O impacto dessas migrações ( vindas do norte, das margens do Mar Negro e das estepes asiáticas) foi sentida do norte do atual Afeganistão (Báctria) à fronteira romana no rio Danúbio. Essa ondas migratórias, formadas por pessoas que fugiam dos Hunos ou das mudanças climáticas, forçavam a entrada no Império Romano. 
Na Trácia, no ano de 378 d.C., uma dessas ondas migratórias derrotou um exército romano.
E não era só o Império Romano que sofria com esse repentino deslocamento populacional. O Império Persa também via suas fronteiras sendo forçadas por essas ondas migratórias. Hordas de bárbaros, vindos do atual Turcomenistão, ameaçavam a cidade Persa de Merv. A situação era tão amedrontadora que o Império Persa construiu um muro no Cáucaso para tentar conter o avanço dos bárbaros que vinham do norte . 

ALIANÇA ENTRE O IMPÉRIO ROMANO E O IMPÉRIO PERSA PARA CONTER AS ONDAS MIGRATÓRIAS:

A situação desse deslocamento populacional era tão urgente que forçou a uma aliança inédita entre os Impérios Romano e Persa. Assim, Roma chegou a contribuir financeiramente para a construção do Muro no Cáucaso.

"Mas era tarde demais no que se refere a Roma."
(Rota da Seda, O Coração do Mundo, autor Peter Frankopan, Editora Crítica, 1º Edição, página 69)

ALARICO, LÍDER DOS VISIGODOS, INVADE ROMA E A SAQUEOU:

Era tarde demais para Roma. Em 410 d.C., Alarico, o líder dos Visigodos, invadiu Roma e a saqueou. Os Visigodos fugiam do avanço dos Hunos. O Império Romano desmoronava-se. Alanos, vindos de uma área compreendida entre o norte do Mar Negro e o Mar Cáspio, invadiam a província romana da Espanha. Os Vândalo chegaram ao norte da África romana. 

CHEGADA DOS HUNOS:

Os Hunos, que vinham atrás desse deslocamento populacional, empurrando-o para o oeste, finalmente chegaram ao Império Romano. Os Hunos viviam montados em seus cavalos. Os cavalos lhes davam asas. Os cavalos eram suas casas. Os Hunos não eram agricultores. Os Hunos só tinham um interesse: Saquear/Pilhar. Eram comandados por Átila, o flagelo de Deus (século V d.C.).
Os Hunos só seriam detidos no ano de 451, na Batalha dos Campos Cataláunicos (atualmente é o centro da França). 

RESULTADO DAS DEVASTAÇÕES DO SÉCULO V d.C.:

As invasões do Século V d.C. fizeram a economia da Europa Ocidental retroceder. 

"os níveis de alfabetização despencaram; as construções em pedra praticamente cessaram."
(Rota da Seda, O Coração do Mundo, autor Peter Frankopan, Editora Crítica, 1º Edição, página 71)

Os mercados de longa distância foram substituídos pelos mercados locais (bens de pequeno valor). 

"Por que Deus nos permite ser mais fracos e miseráveis do que todos esses povos tribais, lamentava-se Salviano, escritor cristão do século V."
(Rota da Seda, O Coração do Mundo, autor Peter Frankopan, Editora Crítica, 1º Edição, página 72)

Os cristão eram levados a acreditar que toda aquela tragédia acontecia porque Deus os punia pelos seus pecados. Os romanos pecaram e Deus os punia.

QUEDA DO IMPÉRIO ROMANO OCIDENTAL, COM SEDE EM ROMA. CONSEQUÊNCIAS NO IMPÉRIO PERSA E PARA OS CRISTÃOS QUE ALI MORAVAM:

Com a queda de Roma, os Persas não viam mais o cristianismo como uma ameaça ao seu império. Agora quem a ameaçava eram as tribos vindas das estepes asiáticas (século V d.C.). Por esse motivo, o Império Persa deixou de perseguir os cristãos e passou a tolerá-lo como uma ameaça menor. 

UNIFORMIZAÇÃO DA DOUTRINA E PRÁTICA CRISTÃS:

Colocar todos os cristãos pensando da mesma forma sobre a doutrina e prática cristãs seria um trabalho árduo (e impossível de concretizá-lo). Mas foi tentado. Reuniões foram feitas com esse objetivo.
Exemplo:
Concílio de Niceia (325 d.C.) 
O Império Romano do Ocidente ainda existia. Constantino era o seu Imperador. Esse concílio foi convocado por Constantino com o objetivo de uniformizar o entendimento sobre várias questões sobre doutrina e prática cristãs. Uma das discussões girava em torno das relações existentes entre o Deus Pai e o Deus Filho. Qual era a natureza de Jesus Cristo? Jesus Cristo era somente humano, um homem como nós, como entendiam os Arianos, seguidores de Ário de Alexandria (um clérigo egípcio) ou ele era simultaneamente Humano e Divino? Concluiu-se que Jesus Cristo era simultaneamente humano e divino: Jesus Cristo é Um em Substância com Deus (seu pai). Dessa reunião em Niceia nasceu o Credo de Niceia, que é usada ainda hoje, quando se diz em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo (santíssima trindade). 
Mas as divisões persistiam. A divisão agora se dava entre:
Cirilo, Patriarca de Alexandria (Egito)
Nestório (Patriarca de Constantinopla).
Tanto Cirilo e Nestório concordavam que Jesus Cristo possuía duas naturezas, a humana e a divina. O problema era dizer como é que essas naturezas se relacionavam, se posicionavam na figura de Jesus Cristo.
Para Nestório, as naturezas divina e humana em Jesus Cristo deviam ser vistas separadas. Separadas e distintas. Para visualizar isso, imagine um copo com água e óleo. Água e óleo estão separados, mas estão dentro de um mesmo recipiente. Com Jesus Cristo seria a mesma coisa
Já para Cirilo, as naturezas divina e humana de Jesus Cristo não deviam ser entendidas como se estivessem separadas. Elas deviam ser entendidas como estando misturadas, coexistindo sem nenhuma separação. Para melhor visualizar essa ideia, imagine um copo onde são colocados água e vinho. Água e vinho se combinam perfeitamente, misturam-se de forma a não deixar nenhuma separação visível.

Havia ainda outras discussões que mantinham os cristão separados:

1) Status da Virgem Maria. Havia a distinção entre Maria Theotokos (Maria deu á Luz Deus) e Maria Christotokos (Maria deu à Luz Jesus, trazendo ao mundo apenas um humano, não um ser divino)
2) Jesus seria a criação de Deus e portanto subordinado e este ou era a manifestação de Deus sem qualquer relação de subordinação, sendo portanto coigual e coeterno?

CONCÍLIO DA CALCEDÔNIA (451 d.C.) MAIS UMA TENTATIVA DE PACIFICAR OS ENTENDIMENTO DE DOUTRINA E PRÁTICA CRISTÃS:

A Igreja do Oriente não concordou com as conclusões tiradas do Concílio da Calcedônia e reagiu com fúria. Seria impossível uniformizar a doutrina e a prática cristãs. A Igreja do Oriente defendia que as naturezas divina e humana de Jesus Cristo estavam separadas, como naquele exemplo de um copo com água e óleo. 
O Imperador Romano reagiu a essa rebeldia fechando a escola de Edessa (atual Turquia) de onde surgiam os escritos doutrinários da Igreja do Oriente. Estudiosos da Igreja do Oriente foram expulsos do Império Romano e foram buscar refúgio na Pérsia. 


SÉCULOS V E VI: O IMPÉRIO PERSA VIVENCIA UM PERÍODO DE PROSPERIDADE:

Os Persas viviam no apogeu. O Império Persa mantinha ligações comerciais com a Índia, com a China e com o Mediterrâneo Oriental. As estepes estavam tranquilas. O Império Bizantino estava concentrado em recuperar províncias romanas no ocidente. Prosperidade e paz trazem consigo tolerância religiosa. Os cristãos que viviam no Império Persa se beneficiaram dessa tolerância religiosa.

IGREJA CRISTÃ DO ORIENTE E A EVANGELIZAÇÃO DA ÁSIA:

A Igreja Cristão do Oriente se beneficiou do período de prosperidade experimentado pelo Império Persa nos séculos V e VI. Com a prosperidade veio a tolerância religiosa.
Aproveitando esse momento, a Igreja Cristã do Oriente buscou se expandir pelo leste. Em meados do século VII era fácil prever o futuro do cristianismo, que marchava pelo leste, competindo com outras religiões como o budismo, o zoroastrismo e o judaísmo.
O então Rei do Iêmen se tornou cristão. Tribos das estepes foram alcançados pelo cristianismo. O cristianismo chegou à China. Basra, Tikrit e Mosul, hoje no atual Iraque, tinham populações cristãs. 
Samarcanda, Bucara (Bukhara), no atual Usbequistão, tinham populações formadas por cristãos.

"Em 635 d.C., missionários cristãos  na China foram capazes de convencer o Imperador a retirar a oposição à fé cristã e reconhecê-la como uma religião legítima..."
(Rota da Seda, O Coração do Mundo, autor Peter Frankopan, Editora Crítica, 1º Edição, página 83)

"A sua expansão deve muito à tolerância e à habilidade dos governantes sassânidas da Pérsia, capazes de favorecer políticas inclusivas nas épocas em que a aristocracia e os sacerdotes do Zoroastrismo estavam pacificados."
(Rota da Seda, O Coração do Mundo, autor Peter Frankopan, Editora Crítica, 1º Edição, página 77)

"Cidades como Merv (Ásia Central), Gundeshapur e até Kashgar, a cidade-oásis na porta de entrada da China, tiveram Arcebispados bem antes de Canterbury."
(Rota da Seda, O Coração do Mundo, autor Peter Frankopan, Editora Crítica, 1º Edição, página 77)

Mas nem tudo eram flores. Na sua expansão para o Leste, a Igreja Cristã do Oriente teve que enfrentar o judaísmo, o budismo e o zoroastrismo.

EURASIA, O CENTRO DO MUNDO E PALCO DE DISPUTA ENTRE RELIGIÕES PELAS MENTES E CORAÇÕES DAS PESSOAS:

A Eurasia era o centro do mundo. Tudo fluía pelas rotas comerciais e pela Rota da Seda: mercadorias, ideias, tecnologias, etc. Religiões disputavam fiéis. Mas essas mesmas religiões também trocavam informações entre si. Uma religião poderia compartilhar ideias usadas por ela com outras religiões. Um exemplo disso é o símbolo do HALO, que ilustra a ligação com o divino, sinal de luminosidade que foi adotada por várias religiões.
Mas esse encontro de religiões também gerava conflitos. Elas competiam entre si para ver qual iria se sobressair sobre as outras, qual delas iria converter um determinado Soberano, qual delas iria atrair mais fiéis.
Os cristãos temiam perder fiéis para o judaísmo, cujos cultos, em suas sinagogas, eram mais atraentes.
Os judeus, por sua vez, desdenhavam os cristãos que se convertiam aos judaísmo.

"Não acredite num prosélito, até que tenham se passado 24 gerações, porque o mal inerente ainda estará com ele." (Hiyya, o Grande Rabino)
(Rota da Seda, O Coração do Mundo, autor Peter Frankopan, Editora Crítica, 1º Edição, página 80)

Mas havia judeus que também temiam que o cristianismo ocupasse o lugar do judaísmo. Por esse motivo, os judeus buscavam fazer pouco caso do cristianismo, faziam joça das crenças dos cristãos:

"O nascimento a partir de uma virgem, por exemplo, é alvo de sátiras e zombarias..."
(Rota da Seda, O Coração do Mundo, autor Peter Frankopan, Editora Crítica, 1º Edição, página 80)

No reino de Himyar, no sudoeste da Península Arábica, judeus perseguiam cristãos. Ali, nos séculos IV e V, instalou-se um reino que fez do judaísmo a religião oficial de seu Estado.

"cristãos eram regularmente martirizados em razão de suas crenças,... depois de condenados por um conselho de rabinos."
(Rota da Seda, O Coração do Mundo, autor Peter Frankopan, Editora Crítica, 1º Edição, página 81)


ANOTAÇÕES EXTRAÍDAS DA LEITURA DO LIVRO Rota da Seda, O Coração do Mundo, autor Peter Frankopan, Editora Crítica, 1º Edição