MINISTRO-PRESIDENTE DA PRÚSSIA:
Em 26 de setembro de 1862 Otto Von Bismarck finalmente alcança o poder na Prússia, tornando-se Ministro-Presidente.
PRIMEIRO DISCURSO DE BISMARCK COMO MINISTRO-PRESIDENTE DA PRÚSSIA - FERRO E SANGUE:
Em seu primeiro discurso como Ministro-Presidente da Prússia, Bismarck disse que a Prússia precisava fortalecer seu exército para quanto surgisse o momento de vantagem. Assim, era urgente que o Landtag (parlamento prussiano) liberasse dinheiro para a reforma do exército prussiano. Bismarck asseverou que os problemas da Prússia não seriam resolvidos com discursos e decisões majoritárias tomadas no interior do Landtag, "...mas com ferro e sangue." (página 231)
Anteriormente, em 1859, Bismarck, quando ainda era embaixador da Prússia na Rússia, havia dito que que a Prússia só se tornaria forte com Ferro e Fogo (ferro et igni). Em seu discurso de 1862, ele manteve o tom que havia sido adotado em 1859, trocando apenas o fogo pelo sangue.
LACUNAS NA CONSTITUIÇÃO PRUSSIANA:
Na Constituição Prussiana havia lacunas. Essas lacunas deram ensejo à criação de uma teoria, a Teoria das Lacunas na Constituição (luckenteorie). Bismarck se valeria dessa teoria para tocar seu governo, mesmo não tendo maioria no Landtag, o parlamento prussiano.
"...em caso de conflito entre a Coroa e o Parlamento - uma questão na qual a Constituição deixava uma 'lacuna', os poderes residuais continuariam com a Coroa. Assim, a Coroa tinha um direito perfeito de dar continuidade ao governo, coletar impostos e realizar gastos, mesmo se a legislatura se recusasse a aprovar esses atos." (página 44)
BISMARCK FAZ USO DA DEMOCRACIA PARA FAVORECER SEU PLANO DE UNIFICAR A ALEMANHA:
Bismarck era um homem desprovido de princípios. Dessa forma, mesmo sendo no fundo um reacionário, ele manobrou a ideia democrática de um Parlamento escolhido diretamente pelo povo alemão para confrontar os pequenos estados alemães e seus príncipes. Esse mesmo Bismarck que via como favorável ao seu plano o patrocínio de uma Assembleia Nacional Alemã eleita pelo povo germânico, tornava-se simultaneamente aliado do Império Russo no sufocamento de uma revolta polonesa contra o domínio russo, eclodida no ano de 1863. Nesse último caso, a Prússia precisava angariar para si a simpatia ou pelo menos a neutralidade russa quando chegasse a ocasião da Prússia enfrentar a Áustria pelo domínio da Alemanha. Outra prova da falta de princípios de Bismarck foi a sua política de driblar a Constituição para elaborar um decreto que buscava limitar a liberdade de expressão da imprensa prussiana. Enfim, Bismarck era um homem desprovido de princípios, valendo-se de políticas democrática e reacionárias de forma simultânea, desde que elas atendessem ao seu objetivo final, a Unificação da Alemanha sob o comando da Prússia.
Esses pequenos estados alemães e o seu patrono, a Áustria, temiam o sufrágio universal de todos os alemães, pois temiam que essa seria a fórmula para a sua derrocada. A Áustria temia que as várias nacionalidades (húngaros, croatas, eslovacos, tchecos, sérvios, etc) que compunham o seu Império tivesse direito ao sufrágio universal. Já os pequenos estados alemães temiam que os habitantes de seus territórios os derrubassem por meio do voto.
Bismarck então, dessa forma, procurava amedrontar os pequenos estados alemães, cujos príncipes temiam que o sufrágio universal viesse a lhes tirar a legitimidade.
ÁUSTRIA:
Enquanto a Prússia de Bismarck manobrava para obter a unificação alemã sob o seu comando, a Áustria também se movimentava por meio de seu Imperador Francisco José. Francisco José pretendia reformar o Bundestag (Parlamento que reunia representantes de todos os Estados alemães, localizado na cidade de Frankfurt am Main) como um estágio preparatório para a realização da unificação alemã sob o comando austríaco. Para realizar seu plano, Francisco José convocou uma reunião para a qual seriam chamados todos os estados alemães, inclusive a Prússia, cujo rei, Guilherme, nominalmente era vassalo do Imperador Francisco José.
"O rei (Guilherme da Prússia), um vassalo real, havia recebido chamado de seu suserano, o Imperador Francisco José; todos os demais reis germânicos concordaram em participar." (página 251)
Bismarck não queria que o rei Guilherme participasse dessa reunião patrocinada pelo Imperador Francisco José. Bismarck teve que trabalhar para demover o rei Guilherme de participar da reunião. Conseguiu fazê-lo. Com sua vitória, Bismarck mudou a história do mundo. Se o rei prussiano Guilherme fosse à reunião de Francisco José, Bismarck iria renunciar, deixando de ser o Ministro-Presidente da Prússia, "...a história da Alemanha e do mundo teria seguido por um curso diferente." (página 253)
Para frustrar a iniciativa do Imperador Austríaco Francisco José, além de impedir a ida do Rei Guilherme à reunião, enviou uma mensagem ao Bundestag dizendo que a Prússia só participaria do encontro se houvesse um acordo sobre uma verdadeira Assembleia Nacional constituída pelo sufrágio universal dos alemães. Mais uma vez, Bismarck, de forma cínica, jogava a carta democrática do sufrágio universal para amedrontar a Áustria e os pequenos estados alemães. Bismarck sabia de antemão que a Áustria e os pequenos estados alemães não poderiam aceitar a constituição de uma Assembleia alemã eleita por meio do sufrágio universal.
"A ameaça de sufrágio universal para o povo alemão deu fim ao projeto austríaco. Se a nação alemã falasse colocaria fim ao poder dos pequenos estados alemães no Bundestag e, ademais, o sufrágio universal nas terras habsburgas (Áustria) daria poder às nacionalidades, em suas lutas por representação e autonomia [...]. Aqui vemos, mais uma vez, a habilidade tática de Bismarck. Ao colocar os povos contra os príncipes, as nacionalidades contra a monarquia habsburgo, ele coloca a Prússia, isto é, a si mesmo - no perfeito ponto de alavancagem. Se os príncipes cooperassem, o povo os ameaçaria menos; se não, mais. (página 254)
O BISMARCK ALIADO DOS SOCIALISTAS:
Como dissemos acima, Bismarck era um homem sem princípios. Nesse sentido, mesmo sendo um reacionário, ele buscou se aproximar agora dos socialistas alemães. Valia tudo para conseguir seu objetivo de unificar a Alemanha sob a administração prussiana. Assim, Bismarck buscou a aproximação com Ferdinand Lassalle (1825-1864). Bismarck tinha já jogado o povo contra os príncipes dos pequenos estados alemães por meio da proposta do sufrágio universal. Ele agora iria jogar os trabalhadores alemães contra a burguesia liberal, a detentora do capital, que causara tanta dor de cabeça a Bismarck durante votações de propostas de interesse da Coroa no Landtag.
O IMPASSE NO LANDTAG (PARLAMENTO PRUSSIANO) PERSISTIA:
Não obstante todos os esforços despendidos por Bismarck, o impasse persistia entre Coroa e deputados persistia no Landtag. Esse impasse só seria superado graças a eventos externos. A melhor forma de se obter a coesão interna é conseguindo sucesso no exterior. Dessa forma, Bismarck, por meio de uma guerra contra a Dinamarca, pela posse dos Ducados de Holstein e Schleswig, iria vencer a oposição liberal ao ser governo. Nesse conflito a Prússia lutaria ao lado da Áustria.
Em 7 de dezembro de 1863, o Bundestag escolheu agir para forçar a Dinamarca a abandonar a ideia de anexar os ducados de Holstein e Schleswig.
GUERRA DA SUCESSÃO DINAMARQUESA - 1864:
A Guerra da Sucessão Dinamarquesa foi a chance que Bismarck precisava para unir seu país internamente.
Em 12 de janeiro de 1864, o rei dissolveu o Landtag porque este havia rejeitado a proposta encaminhada da coroa que previa o financiamento do exército prussiano na guerra contra a Dinamarca. No final, as forças combinadas da Prússia e da Áustria derrotaram a Dinamarca.
Acordo de Paz de Viena - O rei dinamarquês aceitou renunciar a seus direitos sobre os ducados de Holstein e Schleswig, entregando-os aos reis da Prússia e ao Imperador da Áustria.
"Com efeito, a Prússia havia agora anexado Schleswig e a Áustria tinha um exército de ocupação em Holstein, a centenas de quilômetros de sua fronteira, em um território que lhe era totalmente inútil." (página 288)
Em 1865, Bismarck estabeleceu condições que na prática anexavam os ducados de Schleswig e Holstein à Prússia. O Império Austríaco protestou vigorosamente contra isso, dizendo que a atitude da Prússia era inaceitável. A Prússia tentava transformar Schleswig numa província prussiana. A Áustria, por sua vez, contra-atacava no Bundestag, fazendo passar uma proposta para passar Holstein para o duque de Augustenburg, criando assim um novo estado pequeno alemão, para desgosto de Bismarck.
A ENCRUZILHADA DE BISMARCK:
No segundo semestre de 1865, Bismarck se via diante de dois caminhos:
1) seguir um caminho de confronto com a Áustria como único meio de a Prússia finalmente prosperar. Para isso, Bismarck via a França neutralizada, enfrentando problemas em sua aventura no México. A Grã-Bretanha já tinha atuado para ajudar a Dinamarca diplomaticamente na guerra de 1864 e agora provavelmente não faria nada. A Rússia estava lidando com problemas internos causados pela emancipação dos servos. A Rússia também não iria atuar para a ajudar a Áustria, tendo em vista que está a prejudicou durante a Guerra da Crimeia (1854/1855). Enfim, provavelmente, essa três grandes potências não iriam se meter numa guerra civil alemã entre Prússia e Áustria.
2) outro caminho seria seguir o Sistema de Schonbrum, pelo qual havia um acordo entre Áustria e Prússia para manter o controle solidário e conjunto sobre a Alemanha.
Bismarck escolheu pela guerra, escolheu Ferro e Sangue.
GUERRA ENTRE ÁUSTRIA E PRÚSSIA:
Em abril de 1866 a Prússia levou ao Bundestag a proposta de uma Assembleia alemã eleita pelo voto direto e universal.
"Bismarck tinha evocado o poder da democracia para flanquear os austríacos e os Estados federais alemães no conhecimento de que os Habsburgos, com seus 11 grupos nacionais e a crescente ameaça do nacionalismo, jamais conseguiriam competir nesse sentido." (página 308)
"Em 1866, ele brandiu a democracia nos Habsburgos como se lea fosse uma cruz diante de um vampiro..." (página 308)
Liberais de verdade e esclarecidos, sabiam que Bismarck usava a carta da Democracia contra a Áustria não por ser um genuíno liberal, mas para emparedar seu inimigo e os pequenos estados alemães, cujos príncipes seriam dizimados pelo sufrágio universal.
Um jornal liberal alemão chegou a comparar Bismarck com o demônio:
"Se Mefistóles tivesse subido no púlpito e lido o Evangelho, alguém conseguiria se sentir inspirado pela prece?" (página 308)
Os antigos amigos conservadores de Bismarck também o atacavam. Ernst Ludwig Von Gerlach, um dos responsáveis pela ascensão de Bismarck, criticava a política de confronto de Bismarck contra a Áustria, dizendo que a Alemanha sem a Prússia não é a Alemanha e que a Alemanha sem a Áustria igualmente deixava de ser a Alemanha. Gerlach também criticava o sufrágio universal, dizendo que a adoção desse sistema ocasionaria a falência da política.
Naquele primeiro semestre de 1866, Bismarck usava a carta democrática do Sufrágio Universal e simultaneamente já preparava o exército prussiano para atacar a Áustria.
Em 9 de maio de 1866, por iniciativa da Saxônia, o Bundestag exigia que a Prússia explicasse a razão da mobilização de seu exército, com o aviso que os membros do Bundestag não podiam fazer guerra uns contra os outros, mas deveriam levar seus conflitos à Assembleia Federal em busca de uma solução pacífica.
No fim, tudo seria definido na ponta da baioneta, no ferro e no sangue, como queria Bismarck. Bismarck insistia que somente um ato de violência resolveria a questão germânica de uma vez por todas. Esse ato de violência tomou forma na batalha de Sadowa, em 3 de julho de 1866.
BATALHA DE SADOWA - 3 DE JULHO DE 1866:
O pretexto da guerra - CASUS BELLI:
Antes da eclosão da guerra, Áustria e Prússia participaram de uma convenção em Bad Gastein. Os soberanos Guilherme e Francisco José participaram na condição de co-regentes dos ducados de Holstein e Schleswig. A ideia seria que Áustria e Prússia administrassem conjuntamente os ducados que tinham sido conquistados na guerra contra a Dinamarca, em 1864. O pretexto para a guerra nasceu quando a Áustria, sem o consentimento da Prússia, acionou o Bundestag para interferir nos termos da Convenção de Bad Gastein. Isso feria os interesses da Prússia. Essa violação então seria o Casus Belli usado pela Prússia para justificar sua guerra contra a Áustria.
O exército prussiano derrotou o exército austríaco de forma definitiva na batalha de Sadowa
A batalha desenrolou-se na Vila de Sadowa, a noroeste da cidade boêmia de de Koniggratz, atual Hradec Králove, na atual República Tcheca.
Além de Sadowa, outras batalhas foram travadas: na frente oeste, os prussianos enfrentaram batalhas em Hanover e em Hesse. Na frente leste os embates se deram na Boêmia e na Saxônia. Os príncipes prussianos Frederico Carlos, sobrinho do rei Guilherme, e o Príncipe herdeiro Frederico participaram brilhantemente das batalhas. Os austríacos tinham dois exércitos. O do norte seria derrotado em Sadowa-Koniggratz, era comandado por Ludwig Von Benedek. No sul, um exército austríaco derrotou um exército italiano, que tinha se aliado à Prússia.
Os austríacos haviam sido cercados na frente italiana pela aliança de Bismarck com a Itália. Na Alemanha, a Áustria se via cercada por uma ideia, consubstanciada na promessa de Bismarck de criar uma Assembleia Nacional Alemã eleita pelo sufrágio universal.
A vitória no exterior trouxe consigo a vitória política no interior da Prússia. Agora, o Landtag tinha uma composição mais favorável às políticas de Bismarck.
Em 27 de julho de 1866 Áustria e Prússia assinaram um tratado de Paz, por meio do qual a Áustria se comprometia a se retirar da Alemanha. A Áustria não faria mais parte da associação dos Estados alemães. Foi formada uma Confederação de Estados no norte da Alemanha, sob a liderança da Prússia. O Reino de Hanover perdeu a independência e o rei Jorge, primo da Rainha Vitória da Grã-Bretanha, perdeu o trono. A Prússia ainda anexou o Ducado de Nassau e parte de Hesse-Kassel a norte de Main. A cidade de Frankfurt am Main foi anexada pela Prússia. A Áustria ainda teria que pagar uma indenização à Prússia.
O plano de Bismarck de unir a Alemanha sob o governo da Prússia ainda não tinha terminado. Um novo capítulo estava por vir. Mas essa é outra história.
ANOTAÇÕES EXTRAÍDAS DA LEITURA DO LIVRO "BISRMACK, UMA VIDA", DE JONATHAN STEINBERG, EDITORA AMARILYS.
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