ORIGEM DO REINO DA ITÁLIA:
O Reino da Itália começou na Sabáudia ou Savoia, ou ainda Savoie (em francês) e Saboia, localizada no que é hoje a França. Sabáudia estava localizada no centro de um entroncamento daquilo que no futuro seria o encontro das fronteiras de três países: França, Itália e Suíça. O seu primeiro governante foi Humbertus/Hupertus I/Humberto, o Mãos Brancas/Umberto Biancamano (980/1047). Humberto, o Mãos Brancas foi o primeiro Conde da Sabáudia.
O território sobre o qual Sabáudia se assentava abrangia a área do Lago Leman e as zonas alpinas em torno do Monte Branco.
Humberto, o Mãos Brancas, tornou-se Conde da Sabáudia pelas mãos de Conrado II, o Sálico, Imperador do Sacro Império Romano Germânico. Foi um prêmio por Humberto ter lutado contra os inimigos do Imperador, virando conde graças aos bons serviços militares prestados ao Sacro Império Romano Germânico.
Humberto e os condes que o sucederam eram súdidos do Imperador do Sacro Império Romano Germânico.
"Floresceram recorrendo às estratégias medievais do costume: explorando os seus vassalos, combatendo os seus vizinhos, expandindo seus territórios e fazendo bons casamentos."
(página 471)
Os condes da Sabáudia procuraram se expandir a leste, controlando os desfiladeiros alpinos, aproximando-se da área denominada Piemonte (o Pé dos Montes), localizada na atual Itália.
Cidades da Sabáudia: Chambery (sua segunda capital), Annecy, Thonon, Bonneville, Moutiers, Saint-Jean Maurienne (seu primeiro centro político), Cournayeur.
ALGUNS CONDES DA SABÁUDIA:
👉Amadeu III (1103-1148): Morreu em Rodes, durante a segunda cruzada
👉Amadeu IV (1343-1383): Foi vitimado pela peste após uma longa carreira militar
👉Pedro II (1263-1268): Expandiu a Sabáudia, conduzindo seus cavaleiros pelo Grande São Bernardo, derrotando o Conde Zahringen, conquistando o Castelo de Chillon, no Lago Leman, partindo depois para conquistar o País de Vaud (onde hoje se situa a cidade de Lausanne, na Suíça). Nessa época das conquistas de Pedro, o País de Vaud pertencia ao Reino da Borgonha, que por sua vez pertencia ao Sacro Império Romano Germânico.
👉Conde Amadeu VIII (1391-1440): Em 1416, Amadeu ganhou o Imperador do Sacro Império Romano Germânico um novo status: o de Duque. Sua independência formal também foi reconhecida.
Pouco depois disso, Amadou tomou posse de Turim (atual Itália), seu mais rico tesouro. O senhor da Sabáudia era agora também senhor do Estado do Piemonte-Saboia.
"...governando territórios que se estendiam dos arredores de Lyon à nascente do Ródano, perto de Andermatt, e do Lago de Neuchâtel até o Mar Tirreno."
(página 475)
👉Emanuel Filiberto (1553-1580): Fez da cidade de Turim a capítal do Piemonte-Saboia em 1563.
GUERRAS DA ITÁLIA EM MEADOS DO SÉCULO XVI:
Emanuel Filiberto estava numa posição delicada. Serviu como general nas forças do Sacro Império Romano Germânico, mas estava casado com a irmã do Rei da França. O ducado de Emanuel foi ocupado por tropas francesas. Seu território foi devastado. Em 1557, comandando forças espanholas, Emanuel obteve uma vitória em Saint-Quentin, conseguindo a restituição de seus domínios em 1559, passando a governar de forma absoluta. A partir daí, Emanuel Filiberto passou a adotar o nome italiano de Savoia para denominar a sua dinastia (Casa de Savoia).
ALVORECER DO SÉCULO XVII:
Apesar da adoção no nome italiano de Savoia, havia regiões do Piemonte-Savoia que eram pró-França, como por exemplo a cidade de Annecy.
CONFLITOS RELIGIOSOS NO PIEMONTE-SAVOIA:
Havia uma comunidade religiosa denominada Valdense ou Vaudense. Era uma comunidade cristão não católica. Enraizada nos Vales Alpinos, uniu forças com os calvinistas. A contrarreforma queria erradicá-los. O carrasco foi o Duque do Piemonte-Savoia, Carlos Emanuel II (1638-1675) que empreendeu um massacre contra a comunidade Valdense.
"Foi um banho de sangue como a Europa não via desde a noite de São Bartolomeu."
(página 477)
NICE/NIZZA:
Nice atualmente é uma cidade francesa, banhada pelo Mar Mediterrâneo. Nos séculos XVI/XVII, Nice pertencia ao Piemonte-Savoia. Carlos Emanuel II viabilizou uma estrada Transalpina através do desfiladeiro de Tende, através do qual a cidade de Nice se unia ao restante do Piemonte-Savoia. Dessa forma, Savoia, Piemonte e Nice estavam ligados economicamente e politicamente.
TRONO REAL PARA A CASA DE SAVOIA:
Vitor Amadeu II (1675-1730) conseguiu um trono real para a sua dinastia. Vitor Amadeu II se aproveitou da Guerra da Sucessão Espanhola, sendo beneficiado pelo Tratado de Utrecht/Utreque, em 1713, que lhe deu o trono real da Sicília, que pertencia ao reino espanhol. Mas em 1720, pelo Tratado de Haia, após um entendimento com os austríacos, o governante do Piemonte-Savoia trocou a Sicília pela Sardenha. Agora, além de governante da Savoia, do Piemonte e de Nice, o líder da Casa de Savoia também era rei da Sardenha.
A CHAVE PARA A ITÁLIA:
Os territórios governados pela Casa de Savoia eram vistos como a Chave para a Itália. Mesmo não sendo uma potência de primeira linha na Europa, o agora Reino da Sardenha era independente e cortejado por outros países para ser um aliado. No ano de 1750, o Reino da Sardenha (Savoia, Piemonte, Nice e ilha da Sardenha) fazia fronteira com a França (oeste), com a Suíça (norte), com a República de Gênova (sul), com o Mar Mediterrâneo (sul) e com a Lombardia austríaca (leste).
A residência do Reino da Sardenha ficava em Turim, junto ao rio Pó.
Os reis da Sardenha, senhores de desfiladeiros que ligavam a Itália e a França, se aproveitavam dessa vantagem geográfica, para cobrar taxas dos comerciantes que precisavam atravessá-los para a sua atividade comercial.
INVASÃO DE NAPOLEÃO:
Tudo corria bem com o Reino da Sardenha durante o século XVIII até Vítor Amadeu III declarar guerra à França revolucionária. O resultado foi desastroso. Napoleão atravessou os alpes em 1796 . Savoia foi anexada pela França. Piemonte virou uma região militar francesa. Nice também foi tomada pelos franceses. O Rei da Sardenha e seu filho tiveram que fugir, exilando-se na Ilha da Sardenha. Napoleão Bonaparte não tinha apreço pela Igreja Católica. Em sua passagem por Savoia, a abadia de Hautecombe foi saqueada e virou uma fábrica de azulejos.
QUEDA DE NAPOLEÃO E RESTAURAÇÃO DO REINO DA SARDENHA:
Com a derrota de Napoleão e com a realização do Congresso de Viena, o Reino da Sardenha foi restaurado, recuperando seus territórios (Nice, Savoia, Piemonte) e ganhando a República de Gênova. Apesar disso, restaurar o "status quo ante" seria um desafio aos monarcas restaurados, tendo em vista que as ideias da revolução francesa tinham criado raízes por onde passaram. Seria difícil recolocar o gênio da revolução de volta para a garrafa.
"...a Europa pós-Napoleônica era muito diferente da Europa pré-Revolucionária."
(página 483)
Uma das ideias trazidas pela revolução francesa tinha a ver com a Nação - criação de um Estado-Nação inspirado pelo modelo francês. Na Itália, para que um Estado-Nação fosse criado, divisões teriam que ser enfrentados.
- Norte da Itália: Dominado pelo Império Austríaco (Veneza, Lombardia)
- Centro da Itália: Governado por um conjunto de monarcas reacionários, incluindo o Papa em Roma
- Sul da Itália: Localização do Reino das Duas Sicílias pertencente à Dinastia Bourbon.
PIEMONTE E SABOIA:
Piemonte e Saboia pertenciam ao Reino da Sardenha. Apesar disso, esses dois territórios não eram homogêneos.
Piemonte flertava com os nacionalistas italianos, que queriam usar o Reino da Sardenha como plataforma de lançamento de uma Itália unificada, ao mesmo tempo contendo os radicais, encorajando o protagonismo dos moderados e buscando negociar com as potências europeias.
Savoia, por sua vez, flertava com uma separação, saindo do Reino da Sardenha, estabelecendo uma administração francesa. Escritores na Savoia buscavam ligar seus habitantes modernos com uma identidade franco-saboiana, dizendo que os habitantes de Savoia que falavam francês estariam ligados a uma tribo celta, os alóbroges, que tinham habitado a região na época dos romanos.
"Allobroges valentes! Nós vossos campos verdes/Dai-me sempre asilo e segurança; Porque gosto de respirar o ar puro de vossas montanhas. Sou a liberdade! A Liberdade." (Joseph Dessay 1817-1870)
(página 484)
GOVERNANTES APÓS A RESTAURAÇÃO DO REINO DA SARDENHA:
- Vitor Emanuel I (1802-1821)
- Carlos Félix (1821-1831), Il Feroce
- Carlos Alberto (1831-1849) "Introduziu uma administração burocrática e paternalista, à qual chamou Il Buon Governo. " (página 485)
Carlos Alberto, em razão das revoluções de 1848, proclamou uma Constituição liberal, o Statuto Albertino. Essa Constituição, apesar de reservar ao rei todas as decisões executivas, como declarar guerra e paz, garantiu a liberdade de imprensa, a liberdade de reunião, etc.
Apesar dessas concessões liberais, as tensões no reino do Piemonte/Saboia permaneciam. E as tensões eram criadas pelos sentimentos nacionalistas. Na Saboia, havia os francófilos, que desejavam uma aproximação com a França. E no Piemonte havia os italianófilos, que desejavam que o Reino do Piemonte/Saboia fosse uma plataforma de lançamento de uma Itália Unificada.
PATRONO DO RISORGIMENTO - UNIFICAÇÃO ITALIANA - VITOR EMANUEL II:
O patrono do Risorgimento (Unificação Italiana) foi o rei da Sardenha (Piemonte/Saboia) Vitor Emanuel II (1849-1861 e 1861-1878). Seu Ministro de Negócios Estrangeiros era o Conde Cavour, que dizia ter encontrando uma forma para enganar seus colegas diplomatas: "Digo-lhes a verdade e eles não acreditam em mim." (página 487)
QUESTÃO ITALIANA:
Metternich dissera que a Itália era apenas uma expressão geográfica. Mas isso iria mudar a partir de 1861, com a unificação italiana. Foi um processo longo e doloroso, que precisou da participação de vários atores, dentre os quais citamos:
-Napoleão III, Imperador da França.
-Cavour, Camilo Benso, Ministro dos Negócios Estrangeiros do Reino do Piemonte/Saboia e depois Primeiro Ministro.
-Giuseppe Garibaldi, um revolucionário.
-Giuseppe Mazzini, outro revolucionário.
-Vitor Emanuel II, rei da Sardenha (Piemonte/Saboia).
No ano de 1858, em Plombières Les-Bains, nos Vosges, houve um encontro decisivo para a história da Itália, entre Napoleão III e Conde Cavour. Nele ficou acertado que a França ajudaria a expulsar os austríacos do norte da Itália. Em troca, o Reino de Piemonte-Saboia cederia Nice e Saboia para a França.
Cavour "...arriscou a perda de cerca de um terço das possessões do seu soberano na esperança incerta de ganhar algo mais." (página 492)
Esse algo mais que Cavour esperava ganhar era a expansão do Reino da Sardenha em direção da Lombardia e de outros territórios italianos dominados pelos austríacos.
INÍCIO DA GUERRA:
Junho de 1859: Exército francês avança para o norte da Itália. Batalhas sangrentas se seguiram ao avanço francês: Solferino, Magenta e San Martino. O sofrimento causado nesses combates foi tão grande que levou à criação da Cruz Vermelha. O exército francês contou com a colaboração do exército do reino da Sardenha e dos Caçadores da Itália, que eram formados por voluntários reunidos por Giuseppe Garibaldi. Forças da Sardenha entram em Milão, na Lombardia. Austríacos batem em retirada.
Mas houve percalços pelo caminho. Napoleão III fez uma paz em separado com a Áustria, sem consultar o Reino da Sardenha. Parecia que Napoleão III não queria a unificação da Itália, com um Reino da Sardenha expandido. Queria apenas uma Confederação Italiana sobre a proteção francesa.
CAMINHO PARA A UNIFICAÇÃO ITALIANA:
Na segunda metade de 1859, os Duques de Parma e Módena, e o Grão-Duque da Toscânia, depois de perderem a proteção da Áustria, foram derrubados por revoluções locais. No Romanha, localizada na parte norte dos Estados Papais, administradores locais do Papa foram expulsos após uma revolta popular. Esses territórios uniram-se num grupo pró-Reino da Sardenha, denominado Províncias Unidas da Itália Central.
Em 24 de março de 1860 é assinado o Tratado de Turim, no qual fica acertado que França e o Reino da Sardenha iriam fazer Plebiscitos em Nice, na Saboia e nas Províncias Unidas da Itália Central.
Plebiscito = Scitum Plebis ( escolha do povo)
As populações de Nice e Saboia decidiram pela união com a França. Os habitantes das Províncias Unidas da Itália Central decidiram pela união com o Reino da Sardenha.
FIM DE 8 SÉCULOS DE HISTÓRIA:
Quando o povo de Saboia votou pela união com a França, 8 séculos de história, iniciadas por Humberto, o Mãos Brancas, tinham terminado. A Saboia, embrião de um Reino italiano unificado, deixava de pertencer à Casa de Savoia e agora passaria a pertencer à França.
CASA DE SAVOIA:
A Dinastia da Casa de Savoia perdeu sua ancestral Saboia mas ganhou o reino Italiano, que passou a governar, primeiramente a partir de Turim e depois a partir de Roma. A Casa de Savoia sobreviveu à Primeira Guerra Mundial, enquanto outras dinastias morriam: Hohenzollerns na Alemanha, Romanov na Rússia e Habsburgo na Áustria.
FIM DA CASA DE SAVOIA:
A Casa de Savoia não sobreviveu à derrota italiana na Segunda Guerra Mundial. Num Referendo realizado no ano de 1946, a Monarquia Italiana, sob a Casa de Savoia, deixava de existir. A Itália agora seria uma república. Era o fim da história que tinha sido iniciada por Humberto, o Mãos Brancas.
ANOTAÇÕES EXTRAÍDAS DA LEITURA DO LIVRO "REINOS DESAPARECIDOS, HISTÓRIA DE UMA EUROPA QUASE ESQUECIDA", NORMAN DAVIES, EDITORA EDIÇÕES 70, capítulo 8, Sabáudia, páginas 464/511