quinta-feira, 11 de setembro de 2025

O Direito de Portar Armas Origens e liberdade


 

O direito de portar armas sempre foi a indicação de que um homem era livre. Essa convicção que unia o porte de uma arma à condição de um homem ser livre foi expressa na Constituição dos Estados Unidos da América (EUA), mais precisamente instituída na segunda emenda à Constituição daquele país, sendo parte do Bill of Rights, confirmada em dezembro de 1791. Ali foi consagrado o direito do cidadão livre em possuir uma arma de fogo.

"Sendo necessária à segurança de um Estado livre a existência de uma milícia bem organizada, o direito do povo de possuir e usar armas não poderá ser infringido."

Assim era nos EUA do século XVIII e ainda o é nos dias atuais. Os EUA eram e são um Estado livre, no qual há cidadãos e não súditos.

Para compreender melhor essa ideia de unir o direito de portar uma arma ao direito de ser um homem livre, temos que olhar para o século XIX, para a Prússia, embrião do que viria a ser a moderna Alemanha. Na Prússia do século XIX, ao contrário do que acontecia nos EUA, não havia cidadãos. A Prússia não era um Estado livre, de forma que havia apenas súditos. Mesmo assim, também havia na Prússia milícias, chamadas de Landwehr. A Landwehr era uma milícia local, na qual homens serviam por períodos de sete anos. Em 1858, foi proposta uma reforma, na qual essas milícias seriam, basicamente, incorporadas ao exército regular prussiano, que devia obediência ao Estado prussiano. Numa país onde não havia cidadãos livres, mas apenas súditos de um rei, a Landwehr era vista como uma instituição politicamente falsa e fraca, incapaz de fazer frente contra os inimigos externos da Prússia. 

"A Prússia não era um Estado livre. Não tinha cidadãos, apenas súditos." (página 183)

O rei prussiano e o burocrata responsáveis pela reforma não desejavam mudar isso.

"Portanto, Roon (burocrata responsável pela reforma) chamou a landwehr de uma instituição 'politicamente falsa', pois ela dava a seus soldados ideias que ultrapassavam seus postos. Era falsa, num segundo sentido, porque remetia aos 'levantes populares' ocorridos entre 1813 e 1815, os quais haviam, pela primeira vez, alistados unidades voluntárias para lutar ao lado do Exército Real da Prússia." (página 183)

Dessa forma, as milícias deveriam ser absorvidas pelas forças militares regulares. Mais do que uma questão de fortalecimento das defesas da Prússia contra inimigos estrangeiros, o fim das milícias era uma forma de afirmar o poder centralizador do Estado prussiano, que deveria monopolizar todo o poder armado existente no país, o qual deveria estar sob o comando de apenas uma pessoa: o rei da Prússia. A ideia americana, de cidadãos livres, andando armados, formando milícias locais, sem uma subordinação direta ao Estado, foi rechaçada desde o início por essa reforma. O rei prussiano via nesses homens armados um desafio ao seu poder. No passado, durante as revoltas contra o domínio napoleônico, alemães comuns pegaram em armas e formaram milícias. Criou-se, então, a narrativa que foi esse levante popular, e não o rei da Prússia, que conseguiu expulsar Napoleão Bonaparte. Otto Von Bismarck, chanceler da Prússia, a partir da década de 60 do século XIX, fez de tudo para combater "a lenda dos jovens heroicos lutando em uniformes negros em uma guerra pela liberdade" contra o domínio de Napoleão Bonaparte. Ao final da reforma, as milícas de fato foram abolidas, sendo absorvidas pelo exército prússiano, sob o comando do Rei da Prússia. O monopólio da força agora não estava mais disperso em milícias espalhadas pelo país, mas unido sob a direção do rei prussiano. Fazia sentido, pois a Prússia não era um país livre, de forma que não poderia aceitar homens armados e livres andando pelo país, que eventualmente poderiam levantar suas armas em confronto ao poder constituído na figura do rei.

Anotações extraídas da leitura do livro Bismarck, Uma Vida, de Jonathan Steinberg, editora Amarilys.

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