segunda-feira, 20 de abril de 2020

Rota para o Céu Cruzadas Cidades Estados italianas Comércio e Religião Saladino Chifres de Hattin 1187



ROTA PARA O CÉU:
↪ Conquista de Jerusalém:

Como resultado da Primeira Cruzada, Jerusalém caiu nas mãos dos cruzados cristãos, em 15 de julho de 1099. Essa conquista foi feita com grande derramamento de sangue. Os cristãos não foram misericordiosos.

"Nem as mulheres ou as crianças foram poupadas"
(página 161)

A conquista de Jerusalém inundou a Europa ocidental de otimismo e autoconfiança. Poderia a Europa ocidental vir a dominar o mundo? O Oriente próximo, agora com cidades governadas pelos cristãos, como Antioquia, Jerusalém, Tiro, Trípoli, seria o trampolim de uma expansão europeia ainda maior? Mas os sonhos europeus de dominar o mundo não se concretizaram. O que houve foi um esforço apenas para manter o que foi conquistado. O trabalho dos cruzados foi facilitado pelo fato do mundo muçulmano estar dividido entre Fatímidas (Cairo) e Abássidas (Bagdá). Ambos, Fatímidas e Abássidas, ficaram inertes. Naquele momento, era menos ruim ver cristãos dominando Jerusalém do que ver muçulmanos rivais mandando ali.

CONSTANTINOPLA TRAÍDA PELOS CRUZADOS CRISTÃOS:

Ao passarem por Constantinopla, a caminho da Terra Santa, os Cruzados prometeram que as cidades reconquistadas aos muçulmanos seriam entregues ao Império Bizantino. Mas no decorrer da expedição, os cruzados mudaram de ideia. Boemundo, um normando e um dos heróis da primeira cruzada, não queria devolver a cidade de Antioquia (atual Turquia) para o Imperador Bizantino Aleixo I. Antioquia, originalmente, pertencia à Constantinopla, tendo sido conquistada pelos islâmicos. Mas ninguém convenceria Boemundo do contrário. Boemundo ficou com Antioquia.

"Juramos sobre a cruz do Senhor, sobre a coroa de espinhos e muitas outras relíquias sagradas de que não ficaríamos sem o consentimento do Imperador com nenhuma cidade ou castelo de seus domínios." - Juramento de Raimundo de Toulouse, um dos nobres líderes da Primeira Cruzada.
(página 164)

Boemundo ficou com os domínios do Imperador bizantino pois via neles uma plataforma, a partir da qual poderia alçar voos mais altos, conquistando mais riquezas no leste asiático. O comportamento de Boemundo mostra que as Cruzadas eram um caldeirão no qual eram colocados sentimentos religiosos, desejos por riqueza e poder político.

"A Cruzada talvez seja mais lembrada como uma guerra de religião, mas foi também um trampolim para a aquisição de grande riqueza e poder."
(página 164)

NOBRES EUROPEUS QUE NÃO SE ENTUSIASMAVAM COM AS CRUZADAS:

Havia nobres europeus que não se entusiasmavam com as cruzadas. Um deles era Rogério da Sicília que, ao ouvir sobre as cruzadas, levantou sua perna e soltou um peido, demonstrando seu desprezo pela empreitada. Rogério temia que as Cruzadas causassem um declínio do comércio.

DOMÍNIO DO MEDITERRÂNEO - MUÇULMANOS E CIDADES-ESTADOS ITALIANAS:

Nos séculos X e XI, o Mar Mediterrâneo era dominado pelos muçulmanos. Com as Cruzadas, os muçulmanos ganharam rivais cristãos vindos das Cidades-Estados italianas de Veneza, Gênova, Pisa e Amalfi. Veneza já se aventurava pelo comércio antes de 1090, com pontos de apoio na Dalmácia (atual Croácia), fazendo seu comércio de escravos e outras commodities. Ao contrário do nobre Rogério da Sicília, as Cidades-Estados da Itália viam nas Cruzadas uma oportunidade para ganhar dinheiro. Essas Cidades-Estados italianas eram motivadas por religião e cobiça. Em troca de ajudar os Cruzados, ganhavam vantagens materiais. Venezianos ajudaram na conquista da cidade de Acre (1100), enquanto Gênova ajudou os Cruzados no cerco a Cesareia (1101). Em 1104, Balduíno, Rei de Jerusalém, premiou Gênova com isenções de impostos, receitas, etc. Em troca disso, os genoveses tinham que dar suporte militar nas campanhas realizadas pelos cruzados.
As Cidades-Estados italianas disputavam entre si a posição de maior poder. Em 1099, frotas venezianas afundaram vinte e oito navios de Pisa.


FUSÃO DO ESPIRITUAL COM O MATERIAL:

Os séculos das cruzadas (séculos XI-XII-XIII) foram marcados por uma profunda religiosidade.

"Mas a religião tinha que abrir caminho pela real politik e pelas preocupações financeiras."
(página 169)

Exemplo de união entre o Material e o Espiritual: Quando Edessa (atual Turquia) foi tomada pelos muçulmanos em 1144, a Europa buscou recrutar cristãos para retomar a cidade. Além da promessa do perdão dos pecados e da salvação eterna, foi oferecida a oportunidade de negócios comerciais.

"Para aqueles entre vocês que são mercadores, homens rápidos para achar uma barganha, permitam´me enfatizar as vantagens dessa grande oportunidade. Não deixem de aproveitá-la." (Bernardo de Clairvaux - Carta aberta para recrutar Cruzados)
(página 169)

Apesar do discurso religioso, as Cruzadas tinham um objetivo comercial bem acentuado. Subjacente ao apelo religioso, havia interesses materiais, no sentido de conectar a Europa Ocidental ao mercado asiático. Na Quarta Cruzada, aquela que redundaria na conquista de Constantinopla, o primeiro alvo a ser atingido era o Egito, que era famoso por sua riqueza. Jerusalém só viria depois. E não foi a primeira vez que tentaram deixar Jerusalém em segundo plano. Nas Cruzadas de 1189/1192, que foi um fiasco, um de seus líderes, Ricardo I da Inglaterra (Coração de Leão), em dado momento da campanha, quis desviá-la de seu destino original, Jerusalém, para o rico e milionário Egito. E nessa mesma Cruzada, a atenção dos cavaleiros voltou-se para a cidade de Saint Jean d' Acre (Acre), "principal empório do Levante, sem qualquer valor do ponto de vista bíblico ou religioso." (página 179)

SÉCULO XII NA ITÁLIA:

A Itália experimentava um período de prosperidade, tudo causado pelo comércio desempenhado pelas Cidades-Estados de Gênova, Pisa e Veneza. Mercados se expandiam, classes médias se formavam. Valiam-se das posições privilegiadas conquistadas nos Estados Cruzados (na Terra Santa) e em Constantinopla.
O comércio com o leste fez a Europa prosperar no século XII. Havia comércio com os muçulmanos, no interior mesmo dos Estados Cruzados, na Terra Santa. 

"A demanda por seda, algodão, linho e tecidos produzidos no Mediterrâneo oriental, no meio da Ásia ou na China, era enorme..."
(página 172)

"As especiárias também começaram a fluir do Oriente para a Europa em volumes cada vez maiores."
(página 173)

CERTO GRAU DE ESTABILIDADE ENTRE CRISTÃOS E MUÇULMANOS:

A prosperidade comercial era possível graças à existência de um certo grau de estabilidade que existiam entre muçulmanos e cristãos, apesar das Cruzadas. O que política e religião desuniam, o comércio unia.

"É impressionante ver, escreveu Ibn J., que o fogo da discórdia arde entre cristãos e muçulmanos quando se trata de política e luta, mas, quando se trata de comércio, os viajantes podem ir e vir sem interferências." (Ibn J., visitante muçulmano da Espanha)
(página 176)

"Mercadores podiam contar com segurança onde quer que fossem, não importava sua fé ou se eram tempos de guerra ou de paz."
(página 176)

Mas essa prosperidade acabou causando uma disputa ainda mais acirrada entre as Cidades-Estado italianas pelo controle do comércio no Mediterrâneo, no final do século XII. Essas cidades brigavam entre si e contra Constantinopla. Era a cobiça pela riqueza que falava mais alto, causando uma divisão entre os cristãos, que seria utilizada por Saladino, em sua campanha para a reconquista da Terra Santa para os muçulmanos.

SALADINO E A DIVISÃO ENTRE OS CRISTÃOS:

Saladino, líder dos muçulmanos, se aproveitou da disputa dos cristãos pelo comércio. Ele soube explorar essa divisão entre os cristãos. Ele ainda procurou criar mais animosidade entre Constantinopla e o ocidente. Era dividir para conquistar. Ao final da década de 1180, o Imperador Bizantino Isaac II trocou cartas com Saladino, então Sultão no Egito. O sentimento antiocidental crescia em Constantinopla, em meados do século XII. Bizantino viam nos cristãos ocidentais apenas cobiça. A análise negativa dos habitantes de Constantinopla sobre os cristãos ocidentais estava correta. Em 1204, quando uma cruzada devastou e saqueou Constantinopla, os piores pesadelos dos bizantinos se materializaram. Os venezianos, que participaram da Cruzada de 1204, viam na conquista de Constantinopla uma oportunidade de ouro, uma porta escancarada para o comércio com o oriente. Escadas, aríetes e catapultas foram usadas pelos cristãos do ocidente para transporem os muros que guarneciam a cidade de Constantinopla. Dentro de Constantinopla, os cristãos saquearam, mataram, pilharam e profanaram as igrejas. Os clérigos cristãos colocavam mais lenha na fogueira, de forma a colocarem os cruzados contra os bizantinos, dizendo que estes faziam pouco caso das leis emanadas de Roma. "Os bizantinos, segundo os cruzados haviam sido informados, eram piores que os judeus; eles são os inimigos de Deus." (página 180)

"Para uma testemunha ocular bizantina, os cruzados nada mais eram do que os precursores do anticristo."
(página 180)

"Era uma visão que encontrava eco na própria Terra Santa, onde os cavaleiros agiam com tamanha violência e irresponsabilidade que era quase como se tivessem um desejo de morte."
(página 175)

Aos poucos Saladino ia cercando os cristãos na Terra Santa. Reinaldo de Châtillon tentou reverter esse cerco com um ataque a Aqaba, no Mar Vermelho. Esse ataque de Reinaldo acirrou ainda mais os muçulmanos, pois eles começaram a temer um ataque cristão a Meca e a Medina, o que os mobilizou ainda mais em torno de Saladino, que naquele momento incorporava a figura principal dos muçulmanos na luta contra os cristãos.

CHIFRES DE HATTIN - JULHO DE 1187:

Cristãos e Muçulmanos entram em combate. Os muçulmanos, tendo Saladino no comando, vencem os cristãos. Reinaldo de Châtillon foi decapitado. Dois meses depois, Jerusalém rendeu-se pacificamente. O Papa da época, Urbano II, caiu morto ao saber da queda de Jerusalém nas mãos dos infiéis. Na sequências, esforços (1189/1192) foram despendidos para recuperar Jerusalém. Todos eles sem sucesso.


ANOTAÇÕES EXTRAÍDAS DA LEITURA DO LIVRO "O CORAÇÃO DO MUNDO, UMA NOVA HISTÓRIA UNIVERSAL A PARTIR DA ROTA DA SEDA: O ENCONTRO DO ORIENTE COM O OCIDENTE, PETER FRANKOPAN, EDITORA CRÍTICA, capítulo 8, A Rota para o Céu, páginas 161/183.


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