O ROMANCE ENTRE UMA RAINHA E IMPERATRIZ INGLESA E UM PRÍNCIPE ALEMÃO. PRÍNCIPE ALEMÃO DO DUCADO DE SAXE COBURGO GOTHA, UM REINO QUE DEIXOU DE EXISTIR
ORIGEM DO DUCADO DE SAXE COBURGO GOTHA (DAS HERZOGTUM SACHSEN KOBURG UND GOTHA):
Coburgo e Gotha são duas cidades localizadas no coração da atual Alemanha. Estão situadas entre as regiões alemãs conhecidas como Turíngia, a Baviera e a Saxônia. Durante a Idade Média, os Microestados de Coburgo e Gotha faziam parte da massa fervilhante de entidades estatais que compunham o Sacro Império Romano Germânico. Ghota deriva seu nome de Gotaha, "águas dos Godos". No início do século XIX (1826), Coburgo e Gotha uniram-se e passaram a ser governados por um único duque. Nascia então o Ducado de Saxe Coburgo Gotha. Sua sede não ficava nem em Gotha nem em Coburgo, mas no Castelo de Rosenau, perto de Rodenthal. O ducado desmembrou-se depois da Primeira Guerra Mundial. Os cidadãos de Coburgo votaram pela sua anexação pela Baviera. Depois da Segunda Guerra Mundial, entre 1949 e 1990, Coburgo ficou na Alemanha Ocidental e Gotha ficou na Alemanha Oriental (comunista).
O primeiro governante de Saxe Coburgo Gotha foi o duque Ernesto I. Tinha dois filhos, o mais novo deles, Francisco Alberto Carlos Augusto Emanuel (1819-1861), que passou para a história como Alberto, será o personagem da nossa história.
Obs.: A palavra Saxe deriva do nome francês para Saxônia, que em alemão é escrita como Sachsen. Era hábito na aristocracia alemã o uso da língua francesa. O uso da palavra Saxe (Saxônia) derivava do fato de que os governantes do Ducado de Saxe Coburgo Gotha eram provenientes da casa dinástica governante da Saxônia.
ALBERTO (FRANCISCO ALBERTO CARLOS AUGUSTO EMANUEL):
Alberto passou a sua infância no Castelo de Rosenau, cerca de 6 km da cidade de Coburgo. Atualmente, o Castelo de Rosenau e Coburgo estão localizados no estado da Baviera, na Alemanha. Alberto tinha um irmão mais velho, Ernesto. A tia de Alberto, pelo lado de seu pai, era Vitória de Saxe Coburgo Saalfeld, Duquesa de Kent, casada com um dos herdeiros do trono inglês. Vitória tinha dois filhos e uma filha, Vitória de Kent, futura Rainha Vitória e prima e futura esposa de Alberto.
O ENCONTRO ENTRE ALBERTO E VITÓRIA:
Os primos Alberto e Vitória se encontraram pela primeira vez no ano de 1836. O cupido foi o tio de ambos, Leopoldo, rei da Bélgica. Leopoldo era irmão de Ernesto I e de Vitória Saxe Coburgo Saalfeld. Nesse primeiro encontro, Vitória teria se apaixonado perdidamente por Alberto. Em 1836, o rei inglês era Guilherme IV, da casa dinástica hanoveriana, provinda de Hanover, um estado alemão. O pai de Vitória, o Duque de Kent, morreu cedo. Em 1830, Vitória já era a herdeira aparente do trono inglês. Guilherme IV morreu em 1837. Vitória foi coroada rainha da Grã-Bretanha em 1838.
CASAMENTO DE ALBERTO E VITÓRIA:
Depois de ser coroada Rainha da Grã-Bretanha, Vitória convidou Alberto para ir visitá-la em Londres. Chegando em Londres em 1839, Alberto recebeu o pedido de casamento de Vitória. Na ocasião, Vitória escreveu em seu diário:
"Oh! Sentir que era e sou amada por um Anjo como Alberto é um deleite demasiado grande para descrever. Ele é a perfeição em pessoa; a perfeição em todos os aspectos - na beleza - em tudo! Eu disse-lhe que era completamente indigna dele e beijei-lhe a sua querida mão - ele disse que seria muito feliz (...) e foi tão gentil...foi o momento mais radioso e feliz da minha vida e compensou tudo o que sofri e suportei. Oh! Adoro-o e amo-o tanto que nem sei." (Reinos Desaparecidos, história de uma europa quase esquecida, Norman Davies, Edições 70, página 638)
Marcado o casamento, Alberto partiu do Ducado de Saxe Coburgo Gotha, localizado no coração da Alemanha, acompanhado de seu pai e de seu irmão. A viagem foi longa. Fizeram um tour pelo Ducado, onde foram festejado pelos populares. No rio Reno, tiveram que atravessá-lo de barco. Passaram por Colônia, Aix La Chapelle (Aachen), Liege, Bruxelas, Dunquerque e Calais. A travessia do Canal da Mancha foi aflitiva e demorada. O mar estava agitado. Em território inglês, Alberto foi bem recebido. Em fevereiro de 1840, sua comitiva partiu para Londres. O casamento teve lugar na Capela Real do Palácio de St James.
"Conferiu ao noivo o título de Sua Alteza Real dado que a Câmara dos Lordes recusará nomeá-lo Par do Reino; a Câmara dos Comuns atribuíram-lhe apenas uma subvenção reduzida - subvenção anual destinada a cobrir algumas das despesas do soberano." (Reinos Desaparecidos, história de uma Europa quase esquecida, Norman Davies, Edições 70, página 642)
Ao casar-se com Vitória, Alberto deu o nome de Saxe Coburgo Gotha à família real britânica.
A VIDA EM COMUM DE ALBERTO E VITÓRIA:
Em sua vida privada, Alberto e Vitória se comunicavam em alemão. Em 1845, Alberto e Vitória fizeram a sua primeira viagem à Alemanha. Foram para Coburgo e Rosenau. Vitória, em seu diário, transbordava de entusiasmo ao descrever a viagem. Ela conheceu o local de nascimento do homem que amava. O período compreendido entre os anos de 1845 e 1855 foi o caracterizado pela calma e plenitude na vida do casal. Vitória era uma rainha autoconfiante cercada por uma família que crescia. O casamento não era perfeito. Depois do nascimento do nono filho do casal, Beatriz, em 1857, os médicos da rainha disseram que sua vida corria risco se houvesse uma nova gravidez, razão pela qual o casal teve que dormir em quartos separados. Alguns historiadores disseram que Alberto sentia-se infeliz com sua posição de subordinação. Diziam ainda que ele nunca esteve tão loucamente apaixonado como Vitoria estivera por ele.
Alberto morreu cedo, em 1861, vitimado pela febre tifoide. Estava na casa dos 40 anos. Vitória sentiu muito a sua morte. Entrou num luto vitalício. Em 1863, foi revisitar a cena da sua felicidade perdida, na Alemanha. Foi revisitar o Ducado de Saxe Coburgo Gotha, onde passara momentos de alegria com Alberto. Alojou-se em Coburgo, onde foi visitada pelo Imperador da Áustria, Francisco José. Nessa altura, foi aconselhada pelo Primeiro Ministro inglês, Benjamin Disraeli, que ela deveria retornar à Inglaterra, pois "não pode governar o Império (Britânico) a partir de Coburgo." (Reinos Desaparecidos, história de uma Europa quase esquecida, Norman Davies, edições 70, página 647)
Alberto e Vitória tiveram nove filhos. "Em meados do século XIX, o nome de Saxe Coburgo Gotha já tinha assumido proporções continentais. A maioria dos nove filhos de Alberto e Vitória entrou por casamento para as família reinantes mais prestigiadas da Europa. Eles e seus filhos ocupariam o trono, não apenas do Império Britânico, mas também da Alemanha, Rússia, Noruega, Espanha, Romênia e Bulgária." (Reinos Desaparecidos, história de uma Europa quase esquecida, Norman Davies, edições 70, página 648)
O DESTINO TRÁGICO DO DUCADO DE SAXE COBURGO GOTHA:
Duque Ernesto II, irmão de Alberto, faleceu em 1893. Ernesto II não deixou sucessores e isso criou um problema sério, pois o pequeno ducado alemão não atraía o interesse dos descendentes de Vitória e Alberto. Eduardo, o filho mais velho de Vitória e Alberto, renunciou ao seu direito de assumir o ducado. Alfredo, duque de Edimburgo, aceitou a sucessão com alguma relutância. Alfredo então se mudou para o Castelo de Rosenau. Ali, ele recebeu a sua mãe, a Rainha Vitória. Essa útima viagem de Vitória ao ducado de Saxe Coburgo Gotha "...deu origem a um dos maiores encontros da realeza europeia alguma vez vistos. Além de acolher a Rainha Imperatriz Vitória, Alfredo foi anfitrião do Kaiser Guilherme II, do futuro Czar Nicolau II e dos futuros monarcas britânicos Eduardo VII e Jorge V." (Reinos Desaparecidos, história de uma Europa quase esquecida, Norman Davies, edições 70, página 651)
Em 1899, o filho de Alfredo, o príncipe Alfie, que era sifilítico e hemofílico, suicidou-se com um tiro. Alfie estava desesperado com o seu estado de saúde e com as implicações de seu casamento secreto com uma plebeia. Um ano depois, morreu o próprio Alfredo, em Rosenau. Pai e filho mortos. Mais uma vez, surgia o problema sobre quem iria assumir o ducado de Saxe Coburgo Gotha. Mais uma vez, ninguém demonstrava interesse em assumi-lo. Havia dois candidatos: Carlos Eduardo, filho de Leopoldo, Duque de Albany e neto mais jovem de Vitória. O outro era príncipe Artur, filho do Artur, Duque de Connaught. Artur era o terceiro filho de Vitória e Alberto. Na época, correu a história que Artur teria batido em seu primo mais novo, Carlos Eduardo, de forma a obrigá-lo a assumir o ducado de Saxe Coburgo Gotha. Mas a decisão final coube à Rainha Vitória. O trono do ducado foi passado então para Carlos Eduardo, duque de Albany. Mesmo não falando alemão, Carlos Eduardo tornou-se duque de Saxe Coburgo Gotha em 1905.
Os jornais da época, ao noticiarem a ascensão de Carlos Eduardo ao trono, disseram, em tom de galhofa:
"PRÍNCIPE RELUTANTE TORNA-SE DUQUE ALEMÃO."
"NÃO LEVOU NA CABEÇA O primo (fazendo menção a Artur) ao qual o Ducado também foi oferecido, ameaçou sová-lo caso ele (fazendo menção a Carlos Eduardo) recusasse." (Reinos Desaparecidos, história de uma Europa quase esquecida, Norman Davies, Edições 70, páginas 654/655)
Com a eclosão da Primeira Guerra Mundial, Carlos Eduardo viu-se numa situação delicada. Quanto mais a guerra recrudescia, mais o ódio dos britãnicos aumentava sobre tudo aquilo que era alemão. Em julho de 1917, os parentes britânicos de Carlos Eduardo descartaram o nome de família Saxe Coburgo Gotha e adotaram o nome de Windsor (usado até hoje). Carlos Eduardo, como duque de uma entidade política alemã, também seria punido, com a perda de seus títulos de nobreza britânicos. Como nada é tão ruim que não possa piorar, com a derrota da Alemanha, todos os governantes hereditários alemães foram obrigados a abdicar, inclusive Carlos Eduardo. Enquanto a República de Weimar substituia o Império Alemão dos Hohenzollern, o Conselho de Operários e Soldados invadiu o Castelo do ex-duque Carlos Eduardo, em Rosenau, aboliu o ducado e confiscou suas terras.
Carlos Eduardo não ficou na miséria. Recebeu uma indenização do Estado e foi ajudado por alguns de seus familiares (sua irmã Alice e seu marido). Ele morreu em 1954.
ANOTAÇÕES EXTRAÍDAS DA LEITURA DO LIVRO REINOS DESAPARECIDOS, HISTÓRIA DE UMA EUROPA QUASE ESQUECIDA, AUTOR NORMAN DAVIES, EDITORA EDIÇÕES 70
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