DIREITO COMO INSTRUMENTO DE ADAPTAÇÃO SOCIAL:
O Direito, ao lado da Moral, da Religião, é um Instrumento de Adaptação Social. O ser humano, quando inserido numa sociedade, precisa de um instrumento que possibilite sua adaptação a ela. Um homem que estivesse fora da sociedade, sozinho numa ilha, não iria necessitar do Direito.
A diferença entre os instrumentos de adaptação social está na existência ou não da sanção, que é a coação externa imposta pelo grupo social dentro do qual a pessoa está inserida. A obrigatoriedade do Direito vem essa coação externa. Essa coação externa que existe no Direito não existe na Religião e na Moral. A Religião pode ter no máximo uma coação interna, de ordem psicológica. Na Moral, a coação é também interna, consubstanciada no remorso, no arrependimento, na vergonha de ter agido de determinada forma.
Segundo Pontes de Miranda, a obrigatoriedade do Direito nasce da incidência da norma jurídica.
NORMAS JURÍDICAS:
O Direito é composto por normas jurídicas, que são indispensáveis porque constituem o meio hábil para a obtenção de uma coexistência harmônica entre os homens que habitam uma sociedade.
A Vida é uma sucessão de Fatos. Sucessão permanente de fatos. Fatos podem ser constituídos por condutas e eventos.
Fatos são como substantivos e as normas jurídicas são como adjetivos. Normas jurídicas, portanto, qualificam os fatos.
No Mundo, há fatos que entram no mundo jurídico e há fatos que são estranhos a ele, não o integrando.
Um fato só pode ser chamado de Fato Jurídico se estiver regulado por uma norma jurídica. Esse Fato Jurídico, que é o fato regulado por uma norma jurídica, é o fato gerador de direitos, deveres, pretensões e obrigações.
Uma relação de cortesia, por exemplo, não é um fato regulado por uma norma jurídica, de forma que não pode ser vista como um fato jurídico. Ninguém está obrigado a responder um cumprimento de Bom Dia ou de Boa Noite. Quando o seu vizinho passa por você e lhe diz Boa Noite, nenhuma norma jurídica o obriga a retribuir essa gentileza, de forma que a sua falta de educação não constitui um Fato Jurídico. Trata-se apenas de mais um fato da vida, como tantos outros.
Quando uma norma jurídica incide num Fato da Vida, juridicizando-o, temos então um Fato Jurídico. Esse fato então penetra no Mundo Jurídico, que é uma criação humana. O mundo jurídico difere do mundo das ciências naturais. No mundo jurídico há o plano do dever ser, enquanto que no mundo das ciências naturais vige o príncípio da causalidade.
É preciso distinguir o Mundo do Ser do Mundo do Dever Ser
No mundo do dever ser, as relações são estabelecidade pelo princípio da Imputação. Há uma relação dêontica, isto é, a afirmação de que uma conduta dever ser: Se (SF), Então deve ser (P). Por outro lado, o princípio da causalidade é aplicável nas ciências naturais. Se (A) é, então (B) é : Se a água é fervida a 100 graus Celsius, ela irá mudar de estado, do líquido para o gasoso.
"As afirmações científicas têm a forma de juízos hipotéticos, quer dizer, sustentam que determinada consequência está ligada a certo pressuposto. Ou, em outros termos, se verificada a hipótese, então o consequente também se verifica ou deve ser verificar." (página 74, Para entender Kelsen, Fábio Ulhoa Coelho, editora Saraiva).
Tomemos como exemplo o artigo 2º do Código Civil brasileiro:
O Nascimento com vida não é um mero Fato da Vida. Trata-se de um Fato Jurídico, ao qual se imputa o efeito jurídico consubstanciado na aquisição da Personalidade Civil.
Quando você vê um bebê recém-nascido chorando, você está no mundo do ser.
Quando você estipula que esse nascimento com vida irá fazer com que essa criança adquira Personalidade Civil, isto é, a capacidade de ser sujeito de direitos e deveres na ordem civil, você está no mundo do Dever Ser
Atente-se para o fato que a incidência da norma jurídica do artigo 2º do Código Civil não altera a natureza do fato, que é o nascimento de um bebê, que está no berço chorando. Por outro lado, a eventual mudança na situação de fato pode ocasionar a mudança na situação jurídica.
Fenômeno Jurídico
O Fenômeno Jurídico é constituído por:
1) definição normativa hipotética do fato jurídico
2) concreção dessa hipótese no mundo dos fatos
3) incidência
4) validade
5) eficácia
A norma é algo abstrato. Trata-se de um comando emanado de um órgão legislador. O legislador, por meio de uma descrição, faz referência a algo concreto.
Essa norma é uma Previsão de uma hipótese. Pegue como exemplo o artigo 2º do Código Civil. Ali consta uma hipótese: o nascimento com vida de um ser humano. Caso esse nascimento realmente venha a se concretizar, a esse ser humano recém-nascido será atribuído a Personalidade Civil.
Essa mesma norma jurídica deve ser vista como uma Proposição. O Artigo 2ª do Código Civil vai propor o seguinte: Se ocorrer determinado fato (o nascimento com vida de um ser humano), a ele deve ser atribuído determinada consequência jurídica (aquisição da personalidade civil).
O Nascimento com Vida, que vem descrito no artigo 2º do Código Civil, é chamado de Suporte Fáctico. Fato Jurídico é o resultado da incidência de uma norma jurídica (artigo 2º do Código Civil) sobre um suporte fáctico concretizado no mundo dos fatos (o efetivo nascimento com vida de um ser humano).
A NORMA JURÍDICA DESCREVE ABSTRATAMENTE UM FATO. É UM FATO PREVISTO PELO LEGISLADOR. TEMOS AÍ UM SUPORTE FÁCTÍCO HIPOTÉTICO (NASCIMENTO COM VIDA). NA SEQUÊNCIA, ESSE FATO EFETIVAMENTE ACONTECE NO MUNDO CONCRETO. VEMOS O NASCIMENTO DE UM BEBÊ. A NORMA IMEDIATAMENTE INCIDE SOBRE ESSE NASCIMENTO, TRANSFORMANDO-O NUM FATO JURÍDICO, SUBORDINANDO-O ÁS SUAS DETERMINAÇÕES, NO CASO DO ARTIGO 2º DO CÓDIGO CIVIL, AO SE VERIFICAR O NASCIMENTO COM VIDA, A NORMA DETERMINARÁ QUE AQUELE SER RECÉM NASCIDO ADQUIRIRÁ PERSONALIDADE CIVIL.
SE SUPORTE FÁCTICO nascimento com vida ENTÃO DEVE SER --------PRECEITO pessoa para fins de direito
Preceito vem de preceituar, ordenar.
Suporte Fáctico é elemento da estrutura de uma norma jurídica. Ele também é chamado de antecedente da proposição normativa, Tatbestand, hipótese fáctica, condicionante da existência da norma jurídica. O suporte fáctico é algo/fato, constituindo um evento ou conduta. O legislador PREVÊ, por meio de uma norma jurídica, uma hipótese condicionante da existência de um fato jurídico. Esse suporte fáctico, previsto na norma jurídica, pode ou não vir a acontecer no mundo dos fatos, no mundo concreto. Se o suporte fáctico vier a acontecer no mundo concreto, a norma incidirá sobre ele, juridicizando-o, transformando-o num fato jurídico.
Temos, portanto, dois suportes fácticos:
a) suporte fáctico concreto - aquele que efetivamente se verifica no mundo concreto: um bebê recém nascido, chorando
b) suporte fáctico hipotético ou abstrato - aquilo que ainda não aconteceu, que está apenas previsto no artigo 2º do Código Civil brasileiro.
SE (SF) ENTÃO DEVE SER (P)
Como foi dito acima, um ser humano vivendo sozinho, numa ilha, não precisa de normas jurídicas. Já as normas jurídicas, para terem relevância, precisam de fatos. A norma jurídica, sozinha, não produz coisa alguma. Mas, se surgir um fato, cujo suporte fáctico esteja previsto na sua descrição, ela, a norma, incidirá nele, juridicizando-o, isto é, fazendo desse fato um fato jurídico.
HANS KELSEN EXPLICANDO O FENÔMENO JURÍDICO:
SE (SUPORTE FÁCTICO), ENTÃO DEVE SER (PRECEITO)
SE NÃO (SUPORTE FÁCTICO), ENTÃO DEVE SER (S) SANÇÃO
Se (SF), então deve ser (P)
Se não (SF), então deve ser (S)
EXEMPLO: ARTIGO 389 do Código Civil: Não cumprida a obrigação, o devedor responde por perdas e danos.
De acordo com o esquema de Hans Kelsen, o artigo 389 do Código Civil deve ser lido dessa forma:
Se (SF - Havendo uma Dívida), então deve ser (P - a dívida deve ser paga da forma como foi pactuada pelas partes) - Norma Secundária
Se não (SF - A Dívida não foi paga), então deve ser (S, sanção, o devedor responderá por perdas e danos). Norma Primária
A Redação de uma lei é feita de forma elíptica, não se referindo expressamente à conduta desejada ou à conduta proibida. Omite-se a conduta desejada. Mas mesmo assim ela faz parte da norma. Por exemplo: Artigo 155 do Código Penal: Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel. O artigo 155 do Código Penal deve ser lido assim: É PROIBIDO FURTAR, PARA SI OU PARA OUTREM, COISA ALHEIA MÓVEL. Essa é a conduta desejada, que não vem expressa na norma jurídica.
Artigo 121 do Código Penal: Matar Alguém. Pena ...
Omite-se a conduta desejada. A redação da norma é feita de forma a não expressar a conduta proibida ou a imposição da conduta desejada. O artigo 121 deveria, portanto, ser lido assim: "É proibido matar alguém".
ANOTAÇÕES EXTRAÍDAS DOS LIVROS:
TEORIA DO FATO JURÍDICO PLANO DA EXISTÊNCIA MARCOS BERNARDES DE MELLO, EDITORA SARAIVA
PARA ENTENDER KELSEN, FÁBIO ULHOA COELHO, EDITORA SARAIVA